Autora:
Gisele Leite
Resumo:
Ao
contrário que afirmam alguns doutrinadores, o ativismo judicial[1] é presente no mundo
jurídico contemporâneo, olvidando-se que a jurisdição se notabiliza por ser
poder inerte, sendo instado a pronunciar-se sobre demandas que em geral envolve
o descumprimento dos deveres do Estado para seus cidadãos. O texto destaca também
a atuação do Judiciário em face da pandemia de Covid-19.
Palavras-Chave:
Judicialismo. Ativismo judicial. Jurisdição. Políticas Públicas. Teoria Geral
do Direito.
Abstract:
Contrary
to what some indoctrinators claim, judicial activism is present in the
contemporary legal world, forgetting that the jurisdiction is notable for being
an inert power, being urged to pronounce itself on demands that generally
involve the failure of the State to fulfill its duties. citizens.
Keywords:
Judicialism. Judicial activism. Jurisdiction. Public policy. General Theory of
Law.
Vige
uma encardida poluição semântica sobre o termo “ativismo”, por vezes, se
referindo a distintos fenômenos e, outras vezes, para legitimar decisões
judiciais somente em razão de seu resultado.
Não se
trata de inadequada invasão apenas na esfera legislativa, mas também, do
executivo, notadamente na Administração Pública[2]. Há quem encare o ativismo
como insidiosa incursão sobre o núcleo essencial de funções constitucionalmente
atribuídas aos outros Poderes.
Por
ativismo judicial deve-se entender o exercício da função jurisdicional para
além dos limites impostos pelo ordenamento jurídico que incumbe,
institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer atuar, resolvendo o litígio de
caráter subjetivas (conflito de interesses) e controvérsias jurídicas de
natureza objetiva[3]
(conflitos normativos).
Robert
Alexy[4] ensina oportunamente que
os princípios têm como característica fundamental o fato de que estes são
normas que ordenam que algo seja feito em sua máxima possibilidade dentro das
possíveis situações jurídicas e fáticas existentes, sendo mandamentos de
otimização, ou seja, a satisfação proveniente dos princípios não depende apenas
de possibilidades fáticas, mas também de possibilidades jurídicas.
Há
evidente sinalização negativa no tocante às práticas ativistas, por importarem
na desnaturação da atividade típica do Poder Judiciário, em detrimento demais
Poderes.
A
premência vivenciada por toda sociedade nos últimos meses em face da pandemia
de Covid-19, evidenciou ainda mais a inefetividade do Poder Legislativo em
razão da morosidade do processo legislativo e o papel figurativo do Poder
Executivo. A falta de protagonismo e de efetividade dos poderes políticos causa
a expansão expressiva da atividade jurisdicional que vem atuar numa conduta
ativista e garantidora de direitos e de garantias sobre as políticas públicas
brasileiras.
Infelizmente,
a crise extrapola o âmbito sanitário e, reverbera nas áreas da economia,
educação, liberdades e garantias individuais, entre outras, requerendo uma
alteração comportamental de todos os envolvidos.
Portanto,
se faz necessário mudanças relativos aos hábitos de higiene, festividades e
turismo e, também, ao comportamento de autoridades públicas que devem atuar com
transparência e publicidade em face dos administrados. Principalmente no
sentido de “dar o exemplo” na conduta e no respeito às medidas sanitárias indispensáveis
para evitar a transmissão do Covid-19.
Lembremos
que é impossível caracterizar uma decisão judicial que utiliza efeito aditivo
que implementa política pública, ou ainda, que anula atos administrativos como
mero ativismo judicial.
Christopher
Wolfe[5] afirma que o ativismo
judicial é uma questão de tensão entre judicial review e self
retraint. Assim, na medida em que se incrementava o campo da incidência da judicial
self restraint, recrudescia o ativismo judicial.
Constantemente
constata-se que o ativismo judicial está nos debates contemporâneos. Porém, não
aquele ativismo clássico existente do tempo do Chief of Justice
Earl Warren[6]
que presidiu a Suprema Corte dos EUA. Pois, naquele tempo, Warren defendera a
atuação da Suprema Corte em defesa e na implantação das diretrizes
constitucionais traçadas em emendas e que não eram devidamente observadas pelos
Estados-membros.
Afinal,
o ativismo clássico não objetivava acrescer na ordem jurídica, mas acrescentar
na política pública (welfare policies) as obrigações visando a dar
incremento ao programa constitucionalmente confiado ao Poder do Estado.
O caso
mais famoso é Brown versus Board of Education, no qual a Corte Warren
deliberou que alunos negros e brancos tinham igual direito de acesso à
educação, sem qualquer distinção em razão da cor da pele. Warren não enfrentou,
em verdade, o argumento que negros e brancos eram iguais, porque havia certa
hostilidade quanto à eliminação da escravidão em alguns Estados-membros. A
análise situava sobre a perspectiva do direito à isonomia de condições no
ensino público.
Outra
fase da Suprema Corte dos EUA remonta ao período que fora presidida por Oliver
Wendell Homes Jr., que é considerado precursor da escola do pragmatismo[7], observando-se em seus
relatórios e votos a forte preocupação com previsibilidade que o cidadão espera
e busca no sistema legal e de justiça.
Num
caso concreto famoso correspondente ao julgamento de Lochner versus New York
198 US[8].,
Holmes votou dissidente, considerando em seu voto a consequência econômica que
a decisão da Suprema Corte produziria no sistema empresarial, dirimindo a
impossibilidade de se alterar o ordenamento jurídico por meio da decisão
jurisdicional. Talvez, este seja o primeiro exemplo de autocontenção judicial
ou judicial self-restraint.
A
decisão da Suprema Corte em Lochner versus Nova York foi criticada por
juristas. O professor de Direito Bernard Siegan o descreveu como "um dos
casos mais condenados da história dos Estados Unidos". E. segundo o Center
for American Progress, tanque ideológico de esquerda, os professores de
Direito costumam usar Lochner, juntamente com Plessy versus Ferguson e
Korematsu versus United States, como exemplos de "como os
juízes não devem se comportar".
Lochner
é, às vezes, usado como uma abreviatura para a teoria constitucional de extrema
direita. No entanto, tem sofrido duras
críticas de juristas conservadores e libertários também desde que Lochner
adotou o devido processo legal substantivo, uma doutrina que estava
possivelmente em conflito com o entendimento original da Constituição.
Por
exemplo, o conservador acadêmico jurídico Robert Bork[9] chamou a decisão de
"abominação" e "quintessência da usurpação judicial do
poder". Da mesma forma, o ex-procurador-geral Edwin Meese[10] disse que a Suprema Corte
"ignorou as limitações da Constituição e usurpou descaradamente a
autoridade legislativa".
Bernard
Siegan[11], um autodenominado
libertário, descreveu-o como "um símbolo de abandono judicial e
abuso". No entanto, a decisão
também atraiu defensores de libertários: o Cato Institute e os
estudiosos Richard Epstein[12] e Randy Barnett[13], que argumentam que ela
protegeu corretamente a liberdade econômica.
Em
nosso país, há um conjunto de decisões ativistas que incutiram a crença de que
cabe ao Poder Judiciário colmatar o ordenamento jurídico quando seja omisso ou
falho quanto à regulamentação do exercício de direitos. O grande embaraço é que
representa um caminho sem retorno, pois aos poucos, o Judiciário assume o poder
político concentrado no Legislativo e, passa, não a buscar a concretização das
determinações constitucionais, mas sim, a inovar no ordenamento jurídico.
A
principal questão que é imposta refere-se à reciprocidade das decisões
judiciais, e sua repercussão, eis que são tomadas com base no voto de juízes
singulares, colegiados de três ou cinco membros, ou ainda, no caso da plenária
do Supremo Tribunal Federal, composta por onze ministros[14].
Ressalte-se
que a representatividade é nula, pois os ministros da Suprema Corte não foram
eleitos, e suas decisões não possibilitam a discussão consensual das
repercussões de votos e do caminho que é adotado, os seus reflexos econômicos
e, ainda, o ensejo democrático.(In: QUINAIA, Cristiano A. Judicial
self-restraint: relacionamento do judiciário com políticas públicas.
Disponível em: https://www.megajuridico.com/judicial-self-restraint/ Acesso em 11.1.2021).
Exemplificando,
há o julgamento do Recurso Extraordinário 363889, sob a relatoria do Ministro
Dias Toffoli, decidiu-se que, após vinte anos do trânsito em julgado de decisão
que negou o reconhecimento da paternidade, era possível reabrir o caso, para a
realização do moderno no exame de DNA.
Nesse
caso, foram vencidos o Ministro Marco Aurélio e o Ministro César Peluso. Ambos
fizeram autocontenção, ao sustentarem que o efeito prático da decisão seria
nenhum, porque não poderia o Judiciário coagir o suposto pai ao exame de DNA.
Também afirmou que não poderia o Judiciário mitigar a coisa julgada que é
garantia soberana de segurança.
Enfim,
para estabelecer a justiça no caso, o STF afastou a coisa julgada, ou seja,
renunciou a garantia soberana da coisa julgada e seu efeito pacificador em prol
da segurança jurídica.
Convém
relembrar que o artigo 139, IV CPC/2015 outorgou aos juízes o poder de
determinar medidas executivas atípicas para implementação de suas decisões.
Trata-se de cláusula aberta[15] que instiga à imaginação
de decisões capazes de causar prejuízo irreversível aos jurisdicionados, como é
o caso da suspensão de carteira de habilitação, de alvará de funcionamento e
até bloqueio de CNPJ.
Em
2018, o Congresso Nacional aprovou reforma da LINDB (Lei de Introdução às
Normas de Direito Brasileiro) para dispor sobre barreiras à atividade
jurisdicional, bem como, impondo que ao decidir os magistrados igualmente
fundamentem a consequência de sua decisão, ou seja, quem e o quê são atingidos
por esta (vide o artigo 20 na redação dada pela Lei 13.655/2018).
Não se
trata de cercear ou coibir a atividade jurisdicional, mas afixar o pragmatismo
como ferramenta de autocontenção e de autoanálise do próprio Judiciário,
seguindo a doutrina inaugurada por Oliver Wendell Holmes Jr.
Na
dicção de Mark Tusner[16] o próprio controle de
constitucionalidade gera um problema para o constitucionalismo porque para
impor limites ao poder governamental, o controle é feito em detrimento do
autogoverno do povo sobre seus atos.
Identifica-se
três grandes fases do desenvolvimento da judicial review. A primeira
decorre do advento da Constituição até o surgimento efetivo da judicial
review, por meio do Marbury versus Madison[17].
A
segunda fase tem caráter nitidamente mais restritivo sendo marcada por declínio
da judicial review e por uma constante utilização do original controle
de constitucionalidade.
A
terceira fase consolida-se principalmente a partir da segunda metade do século
XX com maior atuação da Suprema Corte na proteção dos direitos assegurando,
inclusive, aqueles que não teriam previsão constitucional expressa. Tal fase
também é marcada por decisões que apregoavam a isonomia com o fito de eliminar
discriminações raciais e sexistas.
Cabe
examinar a evolução do ativismo em face do common law, investigando a relação
do ativismo com a judicial review, e institutos afins, tais como o legislative
override /norwithstanding clause do Canadá.
A
Seção 33 da Carta Canadense de Direitos e Liberdades faz parte da Constituição
do Canadá. É comumente conhecida como a cláusula independente ou la clausula
nonobstant (em francês) ou com poder de anulação que permite que o
Parlamento ou legislaturas provinciais anule temporariamente certas partes da
carta constitucional.
O
Parlamento do Canadá, a legislatura provincial ou legislatura territorial pode
declarar que uma de suas leis ou parte desta, se aplica temporiamente (não
obstante) seções de contra-ordenação da Carta, anulando assim qualquer revisão
judicial ao anular as proteções da Carte por um período ilimitado período de
tempo.
No
entanto, os direitos a serem anulados devem ser um direito fundamental
garantido na Seção 2 (tais como a liberdade de expressão, religião e
igualdade). Outros direitos, como a Seção 6 prevê como os direitos de
mobilidade, direitos democráticos e direitos de linguagem são invioláveis.
Tal
declaração caduca após cinco anos ou menos especificado na cláusula, embora o
legislador possa reeditar a cláusula qualquer número de vezes. A justificativa
por trás de uma data de expiração de cinco anos é que também é o período máximo
de tempo que o Parlamento ou a legislatura podem se reunir antes de uma eleição
ser convocada.
Portanto,
se o povo deseja que a lei seja revogada, ele tem o "direito" de
eleger representantes que irão realizar a vontade do eleitorado. (As disposições da Carta que tratam das
eleições e da representação democrática (§§3–5) não estão entre as que podem
ser anuladas pela cláusula não obstante (§§2,7–15).)[18]
A
cláusula de não obstante reflete o caráter híbrido das instituições políticas
canadenses. Na verdade, ele protege a tradição britânica de supremacia
parlamentar sob o sistema americano de direitos constitucionais escritos e
tribunais fortes introduzidos em 1982.
O ex-
primeiro-ministro Jean Chrétien[19] também o descreveu como
uma ferramenta que poderia proteger contra uma decisão da Suprema Corte
legalizar o discurso de ódio e a pornografia infantil como liberdade de
expressão.
Legislative
override ou Nortwithstanding clause constitui as
designações doutrinárias para descrever o dispositivo na Seção 33, da Canadian
Charter of Rights and Freedoms. Desta forma, por meio da legislative
override, o Parlamento possui a possibilidade de imunizar a lei em relação
a uma decisão de inconstitucionalidade pelo prazo renovável de cinco anos. Já a
Nortwithstanding clause tem sido raramente utilizada, em sua força pleno
pelo Parlamento Canadense.
Contudo,
sua presença criou um diferenciado sistema de judicial review (weak
judicial review – fraca revisão judicial), em que o Parlamento dialoga com
maior frequência com o Judiciário para se definir o alcance e a
inconstitucionalidade de determinadas leis.
O
jurista norte-americano é favorável a uma modalidade moderada de judicial
activism, mediante a qual a judicial review seria utilizada para
proteger direitos individuais, resguardar minorias, impulsionar reformas
sociais, e liminar discriminações ilegais, bem como fulminar as leis
inconstitucionais.
Há,
portanto, o ativismo na dimensão macroestrutural e na micro (decisória). Nessa
última dimensão, o ativismo consiste na suspensão da legalidade (CF+ lei) como
critério decisório por um voluntarista que pode ser puramente ideológico,
econômico, religioso, moral e, etc.
Por
outro viés, na dimensão macro ou estrutural, o ativismo traz a caracterização
do fenômeno da juristocracia ou a própria supremacia judicial.
Portanto,
a dimensão macro do ativismo (doravante, ativismo judicial material), refere-se
à provimentos judiciais de natureza final envolvendo a concretização de
direitos materiais invocados em juízo, um fenômeno contemporâneo que pode ser
verificado em pronunciamentos de qualquer Tribunal do Poder Judiciário,
especialmente os de cúpula, como é o caso do Supremo Tribunal Federal
brasileiro. Além disso, segundo a doutrina, o ativismo judicial material é
fruto de uma postura puramente ideológica do julgador.
Já a
dimensão micro do ativismo judicial, ou seja, ativismo judicial no ritualismo
processual, refere-se aos pronunciamentos judiciais (despachos de mero
expediente e decisões interlocutórias) que resolve matérias envolvendo a marcha
processual. Tal fenômeno da experiência brasileira pode ser verificado, especialmente,
nos pronunciamentos dos juízes de primeira instância, tanto titulares quanto
substitutos.
Desta
forma, sua principal diferença com o ativismo material está em suas causas,
pois o ativismo no ritualismo processual, embora se relacione com o neoprocessualismo[20], é resultado da presença
de resquícios funcionais do CPC de 1973 (Lei nº 5.689, de 11 de janeiro de
1973, revogada pela Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, que entrou "em
vigor após decorrido 1 (um) ano da data de sua publicação oficial",
conforme art. 1.045) e de duas das inovações trazidas pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004 (EC 45/2004), uma de fato e outra de direito,
quais sejam:1º) a positivação do direito fundamental à celeridade processual;
2º) e a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)[21].
Conforme,
esclarece Paulo Sérgio Souza Andrade (2014) in litteris:
"...
a EC 45/2004 promoveu um redesenho institucional do Poder Judiciário
brasileiro, ao instituir uma política de incentivos negativos, consubstanciada
em punições cominadas à magistratura em razão da baixa produtividade. O CNJ,
além do controle externo, também fomenta o controle social, visto que recebe e
apura reclamações e denúncias contra magistrados da sociedade civil. Com efeito,
a relação jurídica havida entre o Estado e juiz não pode mais ser concebida
como uma relação de presentação, como tradicionalmente se concebe, mas sim como
uma relação de mandato. Vale dizer, o magistrado não pode ser mais tido apenas
como a personificação do Estado, mas, acima de tudo, como um representante do
Estado, em nome de quem age. Destarte, de acordo com a visão tradicional, o
juiz seria um órgão investido de parcela do poder jurisdicional do Estado, a
fim de promover a pacificação social. Hoje, todavia, resta mais claro que o
juiz é um agente público como os demais, com a particularidade de funcionar em
nome do Estado, praticando atos e
administrando interesses da justiça, o que justificaria os poderes e as
prerrogativas adquiridos em função do cargo que titulariza e do encargo
recebido." In: ANDRADE, Paulo Sérgio Souza. Ativismo
Judicial no ritualismo processual. Direito Público. v.10, n.57, p. 09-26.
Acesso em 10.1.2021.
Assim,
ocorre o gigantismo do Judiciário em face dos demais poderes instituídos.
Obviamente sempre o STF realiza o controle de constitucionalidade e, ipso
facto, julga inconstitucional a lei por meio de ADIn, listando a interferir
diretamente na esfera do legislativo.
Todavia,
essa interferência pertence a nossa engenharia constitucional. E, o referido
controle além de ter sido previsto pelo Poder Constituinte Originário, sendo
regulamentado pela lei nos termos da Constituição vigente.
Conclui-se,
portanto, que a interferência do Judiciário especialmente o STF em face do Legislativo
e do Executivo, sem autorização constitucional, configuram a invasão de
competência e a violação à separação de poderes, concretizando in casu, a
faceta ou dimensão macro do ativismo.
São
paradigmáticas as decisões do STF que determinaram, ainda em sede liminar, sobre
o Presidente da Câmara e do Senado.
O STF
vem modificando seu entendimento hermenêutico na direção de decisões mais
criativas, valorativas e inovadoras de direitos e de posições jurídicas
fundamentais, o que demonstra ser uma inserção transformativa no papel do
Direito e no papel da Corte dentro da nova ordem política e democrática que
emergiu com a Constituição brasileira de 1988.
Essa
progressista postura hermenêutica somada ainda aos seus novos poderes de
decisão, principalmente, à ampla eficácia vinculante de suas decisões, tem sido
decisiva para o crescimento do ativismo judicial, na tarefa de guardião da
Constituição e dos direitos fundamentais. In: CAMPOS, Carlis Alexandre de
Azevedo. Dimensões do ativismo judicial no Supremo Tribunal Federal 2012.376.f
Tese de Doutorado Curso de Pós-graduação em Direito. Faculdade de Direito.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, 2012).
Em
2019. o STF protagonizou importantes decisões seja na esfera penal, social e
econômica. O primeiro dos julgamentos que começou em fevereiro e terminou em
junho, quando o STF equiparou a homofobia e a transfobia ao crime de racismo. A
decisão gerou mal-estar com o presidente atual e também com o Legislativo, que
acusou a Corte de usurpar sua competência ao criar um tipo penal. E, os membros
do referido tribunal, entretanto, defenderam que houve omissão do Congresso e
que a decisão fora resultante de mera interpretação da Constituição.
Merece
destaque ainda, que o STF passou a entender como delito de apropriação indébita
tributária quando a empresa deixa de quitar débitos de ICMS, mesmo se da dívida
for declarada, e não houver acusação de fraude. E, os críticos à decisão
acusaram de ser a criação de tipo penal e que abriu precedentes: prisão por
dívida que é proibida pela Constituição vigente.
Novamente
na esfera penal, o STF teve atritos com o Ministério Público. Na primeira
derrota que impôs à Operação lava-jato, o plenário decidiu que a Justiça
Eleitoral é quem devem julgar crimes comuns conexos com os eleitorais. Mais
tarde, decidiu que, em ações em que existam corréus delatatores e delatados, os
delatados devem falar por último. O mais julgamento, no entanto, terminou em
novembro de 2019, quando o STF decidiu que a execução da pena só deve ser feita
após o trânsito em julgado, derrubando a prisão depois da segunda instância e,
colocando em liberdade o ex-presidente Lula.
Noutra
feita, o STF decidiu que a venda do controle acionário de subsidiárias de
estatais não exige lei específica e nem de licitação tradicional. Na ocasião, a
Corte ainda ressaltou que a venda do controle acionário de estatais precisa
seguir a dois critérios, a saber: aval do Congresso Nacional e processo
licitatório.
Tal
decisão da Suprema Corte foi considerada um verdadeiro marco para o bilionário
plano do governo de privatizações, que deve obter maior ênfase após a reforma
da Previdência Social e, atende ao que atual governo esperava, uma vez que
permite assim modelo mais flexível para as subsidiárias que são o principal
foco da equipe econômica. O entendimento também deve ser adotado por Estados e Municípios.
Os
ministros discutiram as ADIs 5624, 5846, 5924 e 6029, que questionam
dispositivos da Lei 13.303/2016, a chamada Lei das Estatais. A lei trata do
estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias, no âmbito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos
municípios.
O STF
invalidou pela primeira vez uma mudança trazida pela reforma trabalhista de
Michel Temer, a Lei 13.467/2017. Por dez votos a um, o plenário decidiu pela
inconstitucionalidade de dispositivo que permite que grávidas trabalhem em
atividades insalubres.
Os
ministros entenderam que o artigo 394-A da Lei 13.467/2017 viola a proteção
constitucional à criança e à maternidade e a igualdade de gênero. Com isso, na
prática, voltou a valer o afastamento imediato em qualquer grau de
insalubridade. A decisão foi tomada na ADI 5.938, ajuizada pela Confederação
Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. O ministro Marco Aurélio foi o único a
votar em sentido contrário.
Nos votos,
alguns ministros deram sinais do que pensam sobre a reforma trabalhista, que é
questionada em dezenas de ações no STF ainda pendentes de julgamento. Este foi
o segundo tema da reforma julgado pelo Plenário – no ano passado, no entanto, a
Corte decidiu favoravelmente a ela: é constitucional o fim da contribuição
sindical obrigatória.
O
atual Presidente da República sofreu sua primeira derrota no STF, que suspendeu
liminarmente parte de Medida Provisória que extinguia dezenas de conselhos
populares. O plenário decidiu que o presidente não pode dissolver, por meio de
decreto, conselhos e colegiados da administração pública federal que foram
criados por lei.
Com a
decisão, o Presidente da República só poderá extinguir os conselhos criados por
decretos, portarias, atos de outros colegiados ou qualquer outra norma
infralegal. A extinção dos conselhos constava da MP 870.
Em
maio, o plenário do STF decidiu que juízes não podem obrigar o poder público a
fornecer medicamentos experimentais ou sem registro na Anvisa, mas fixou
critérios de excepcionalidades que poderão ser analisadas pelo Judiciário. O
caso começou a ser julgado em 2016. O Supremo Tribunal Federal entendeu ainda
que ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa
deverão ser necessariamente propostas em face da União, já que se trata de um
órgão federal.
Ficou
estabelecido que é possível excepcionalmente a concessão judicial de
medicamentos sem registro sanitário em caso de mora irrazoável da Anvisa em
apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei 13.411 de 2016) quando
preenchidos três requisitos, a saber: 1) a existência de pedido de registro do
medicamento no Brasil, salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras
e ultrarraras; 2) a existência de registro do medicamento em renomadas agências
de regulação no exterior; 3) inexistência de substituto terapêutico com
registro no Brasil.
Em
outubro, o STF finalizou um julgamento antigo que preocupava Estados,
municípios, União e credores de precatórios, e que afetou mais de 170(cento e
setenta) mil processos no país.
Na
ocasião, o plenário decidiu por maioria que o IPCA-E deve ser utilizado como
índice de correção monetária nos débitos judiciais da Fazenda Pública, mesmo no
período da dívida anterior à expedição do precatório, entre 2009 e 2015. Foram
6 votos a 4, pelo índice de correção mais favorável ao credor para correção de
débitos contra a Fazenda Pública que ainda estão sub judice.
A
maioria dos ministros rejeitou a modulação de efeitos que estados e União pediam
para que a Taxa Referencial (TR) fosse aplicada no período de 2009 a 2015 — e
somente depois disso, o IPCA-E. Os embargos começaram a ser julgados em
dezembro de 2018 e foram interrompidos duas vezes por pedidos de vista.
Em
março, já havia sido formada maioria de seis votos contra a modulação, mantendo
o IPCA-E entre 2009 e 2015 nos processos que tramitavam, antes mesmo da emissão
do precatório, mas o ministro Gilmar Mendes pediu vista.
A
corrente vencedora foi inaugurada pelo Ministro Alexandre de Moraes que era o
relator, Ministro Luiz Fux votou pela aplicação da TR no período. Para o
Ministro Moraes, aplicar a TR seria contra a segurança jurídica e o interesse
social, e geraria uma sensação de “ganhou mais não levou” para os credores. Em
sua visão, a TR não repõe a perda de valor da moeda.
Um
tema que, ao contrário de muitos que passam pelo tribunal, foi decidido de
forma unânime, foi a constitucionalidade do sacrifício de animais em cultos
religiosos. Os ministros julgaram improcedente um recurso que questionava lei
estadual do Rio Grande do Sul que permite a sacralização de animais em rituais
religiosos, destacando as religiões de matriz africana.
A
sessão de 28 de março foi marcada por discursos em defesa da liberdade
religiosa e acompanhada de perto por representantes de religiões de
matriz-africana que, com vestes típicas, ocupavam a maior parte das cadeiras no
plenário. No fim do julgamento, os presentes aplaudiram de pé a decisão.
O
julgamento teve início ainda em 2018, mas foi interrompido por pedido de vista
do ministro Luís Roberto Barroso. Por fim, a seguinte tese foi promulgada: “É
constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade
religiosa, permite o sacrifício de animais em religiões de matriz africana”.
O ano
de 2020 foi um ano atípico e fora assim mesmo para o Supremo Tribunal Federal.
Antes, existiam as sessões presenciais que passaram a se realizarem por meio
videoconferência, o plenário virtual aumentou a quantidade de julgamentos e, a
Corte Suprema passou a ter central atuação na pandemia da Covid-19, onde ações
e omissões relacionadas com a pandemia foram avaliadas.
O
Tribunal Supremo deu aval para Estados e Municípios agirem, proibiu campanhas
pedindo o fim do distanciamento social, determinou ações para proteger
indígenas, restringiu operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro,
garantiu a divulgação diária dos dados epidemiológicos, revogou normas que
limitavam o acesso à informação e, ainda, validou acordos de redução salaria mesmo
sem a participação sindicato.
Mereceram
destaque dois inquéritos. Um destes investiga o atual Presidente da República
por suposta tentativa de ter interferido politicamente na Polícia Federal. O
segundo inquérito investiga as ameaças e notícias falsas (Fake News) contra a
Corte e seus ministros. A referida investigação acabou atingindo aliados do
governo e foi validade plenamente pelo Plenário do STF, por maioria expressiva.
Logo
no início de 2020, o governo se encontrava no segundo ano de seu mandato e,
também correspondeu aos primeiros momentos da crise da pandemia do coronavírus
no Brasil, o atual Presidente da República passou a ser investigado, é o
inquérito 4.831 que foi aberto depois que uma das pessoas que tanto o ajudou a
eleger, o ex-juiz Sérgio Moro, deu declarações explícitas à imprensa de que o
Presidente da República teria tentado interferir na Polícia Federal em prol de
objetivos pessoais.
No
final de abril de 2020 estremeceram as relações existentes entre a Presidência
da República e o STF. Com o fim de
anunciar e justificar sua saída do governo federal, Moro chamou coletiva de
imprensa em 24 de abril e, nessa ocasião, afirmou que o presidente tentara ter
alguém de seu contato pessoal na Polícia Federal, para poder ligar e colher os
relatórios de inteligência e que demonstrou preocupação com os inquéritos que
tramitam no STF.
Pouco
tempo depois da referida coletiva, o Procurador-Geral da República, Dr. Augusto
Aras solicitou a abertura de inquérito, em 27 de abril, o então decano da
Corte, Ministro Celso de Mello determinou a abertura da investigação da suposta
ocorrência dos crimes de falsidade ideológica, coação no curso do processo,
advocacia administrativa, prevaricação, obstrução de Justiça, corrupção passiva
privilegiada e, por parte de Moro, denunciação caluniosa e crime contra a
honra.
Em
menos de trinta dias mais tarde, o Ministro Celso de Mello liberou o vídeo da
reunião ocorrida entre o Presidente da República e seus ministros em 22 abril,
ocasião onde foram falados mais de quarenta palavrões entre outras injúrias de
mau gosto. O encontro fora citado por Moro em depoimento à Polícia Federal como
sendo o momento crucial que explicitou as interferências do presidente na
instituição em benefício próprio e da sua família.
Já em
5 de maio de 2020, o decano determinou a oitiva de três nomes do primeiro
escalão do governo atual, a saber: os ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria
de Governo); Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional da
Presidência); Braga Netto (Casa Civil). E, ainda determinou que o planalto
entregasse a cópia do material.
Somente
em 8 de maio o governo entregou o vídeo ao ministro relator, que decretou
sigilo temporário do material. A defesa de Moro solicitou a divulgação integral
do vídeo. A AGU preferia que o ministro Celso divulgasse apenas alguns trechos
específicos. E, Aras opinou que a liberação do vídeo seria dar palanque precoce
às eleições de 2022.
Em 22
de maio, finalmente, a reunião foi integralmente divulgada. E, o inquérito
segue em tramitação na Suprema Corte, que ainda precisa decidir quando o
presidente deverá prestar depoimento pessoal.
Em 15
de abril de 2020, o STF referendou em liminar do Ministro Marco Aurélio Mello
que decidiu que Estados e Município possuem competência para tomar medidas com objetivo
de conter a pandemia de Covid-19. O STF definiu, nessa ocasião, que tais entes
da federação podem determinar quarentenas, isolamento, restrição de atividades,
sem que a União possa interferir no assunto.
A
decisão fora proferida na ADI 6.341, ajuizada pelo PDT, na qual o partido pedia
a suspensão da Medida Provisória 925/2020 a respeito de procedimentos para
aquisição de bens, serviços e insumos. O PDT pedia a declaração de
inconstitucionalidade da MP 926 editada pelo Presidente em 20 de março por entender
que a norma desrespeita o preceito constitucional da autonomia dos entes
federativos e foi editada com a finalidade política de atingir os governadores.
Em 6
de dezembro de 2020, o STF julgou inconstitucional a possibilidade de reeleição
dos presidentes da Câmara e do Senado. E, tal resultado impede que Rodrigo Maia
(DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) venham disputar a reeleição para os
comandos da Câmara e do Senado, respectivamente.
O
julgamento foi um dos mais relevantes na seara política neste ano, já que
impacta diretamente na sucessão do comando do Congresso de 2021 a 2022. As
Casas Legislativas esperavam aval para decidir a questão internamente, mas não
obtiveram sucesso. Votaram contra a possibilidade de reeleição os Ministros
Marco Aurélio, as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e os ministros Luís
Roberto Barroso, Luiz Fux e Edson Fachin.
Ficaram
vencidos os Ministros Gilmar Mendes, que relatou o processo, Dias Toffoli,
Ricardo Lewandowski, Nunes Marques e Alexandre de Moraes. A Ação Direta de
Inconstitucionalidade 6.524 foi movida pelo PTB contra possíveis interpretações
dos regimentos internos da Câmara que permitissem a reeleição de Maia e
Alcolumbre.
Em
duas ocasiões, o STF atuou para limitar as operações policiais nas comunidades
do Rio de Janeiro durante a pandemia da Covid-19. Inicialmente, o ministro
Edson Fachin concedeu uma liminar em 5 de junho, para proibir o estado, sob
pena de responsabilização civil e criminal, de seguir com operações policiais
nas comunidades do Rio de Janeiro enquanto durar a pandemia do coronavírus,
“salvo em hipóteses absolutamente excepcionais, que devem ser devidamente
justificadas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata
ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro”.
Em 5 de
agosto, no plenário virtual, o STF referendou a decisão. Já no dia 18 de
agosto, o plenário do STF determinou, por 7 votos a 3, algumas mudanças nas
operações policiais em favelas do Rio de Janeiro. A Corte fixou a restrição do
uso de helicópteros em operações policiais, o respeito a certas regras para
operações em localidades próximas a escolas, creches, hospitais ou postos de
saúde e que os agentes de segurança preservem todos os vestígios de crimes
cometidos em operações policiais. Também foi fixado que, sempre que houver
suspeita de envolvimento de agentes dos órgãos de segurança pública na prática
de infração penal, a investigação será atribuição do Ministério Público
competente, e não da corregedoria da própria polícia.
Em
duas ocasiões, o STF atuou para limitar as operações policiais nas comunidades
do Rio de Janeiro durante a pandemia da Covid-19. Inicialmente, o ministro
Edson Fachin concedeu uma liminar em 5 de junho, para proibir o estado, sob
pena de responsabilização civil e criminal, de seguir com operações policiais
nas comunidades do Rio de Janeiro enquanto durar a pandemia do coronavírus,
“salvo em hipóteses absolutamente excepcionais, que devem ser devidamente
justificadas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata
ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro”.
Em 5
de agosto, no plenário virtual, o STF referendou a decisão. Já no dia 18 de
agosto, o plenário do STF determinou, por 7 (sete) votos a 3 (três), algumas
mudanças nas operações policiais em favelas do Rio de Janeiro.
A
Corte fixou a restrição do uso de helicópteros em operações policiais, o
respeito a certas regras para operações em localidades próximas a escolas,
creches, hospitais ou postos de saúde e que os agentes de segurança preservem
todos os vestígios de crimes cometidos em operações policiais. Também foi
fixado que, sempre que houver suspeita de envolvimento de agentes dos órgãos de
segurança pública na prática de infração penal, a investigação será atribuição
do Ministério Público competente, e não da corregedoria da própria polícia.
Em 8
de junho, o Ministro Alexandre de Moraes determinou que o Ministério da Saúde
mantivesse, de forma integral, a divulgação diária dos dados epidemiológicos
relativos à Covid-19 no site oficial, como fazia até o dia 04 de junho,
inclusive com “os números acumulados de ocorrências”.
O
governo havia decidido mudar o critério de divulgação de casos e mortes. Além
disso, o site do Ministério da Saúde chegou a ficar fora do ar por um dia inteiro.
A pasta também deixou de fazer coletivas de imprensa diárias para divulgar os
dados, que começaram a sair cada dia mais tarde. Diante de um possível “apagão
de dados”, o PSOL, PCdoB e Rede ajuizaram a ADPF 690 no STF.
O Ministro
Alexandre de Moraes acolheu o pedido dos partidos para determinar a divulgação
como era realizada anteriormente. Na decisão, Moraes disse que a gravidade da
emergência causada pela pandemia da Covid-19, “exige das autoridades
brasileiras, em todos os níveis de governo, a efetivação concreta da proteção à
saúde pública, com a adoção de todas as medidas possíveis para o apoio e
manutenção das atividades do Sistema Único de Saúde”. Em sessão virtual
realizada de 13 a 21 de novembro, o plenário referendou a liminar de Moraes, por
unanimidade.
Durante
as primeiras semanas da pandemia no Brasil, o governo federal publicou no
Diário Oficial da União várias medidas provisórias relacionadas ao combate à
disseminação da Covid-19. Muitas foram questionadas no STF, como foi o caso da
MP 926 e também da MP 966. Esta última, publicada em 15 de maio, isentava
agentes públicos de responsabilização por erros que viessem a cometer ao lidar
com a crise sanitária e econômica em decorrência da pandemia.
De
acordo com o texto da MP, os agentes públicos somente poderiam ser
responsabilizados nas esferas civil e administrativa “se agirem ou se omitirem
com dolo ou erro grosseiro” pela prática de atos relacionados, direta ou
indiretamente, com as ações de enfrentamento do coronavírus.
Dias
mais tarde, no entanto, o STF restringiu a abrangência do texto, definindo que
a expressão “erro grosseiro” deve ser lida como não a não observância dos
critérios científicos e adotados por organizações reconhecidas nacional e
internacionalmente, especialmente a Organização Mundial de Saúde (OMS). O
julgamento, que se deu em 21 de maio, incluiu, ainda, na tese a atenção aos
princípios constitucionais da precaução e da prevenção, sob pena de os agentes
públicos que ignorarem tais critérios se tornarem corresponsáveis por eventuais
violações de direitos.
A MP
966 gerou reação da sociedade civil e de setores de oposição ao governo. Em
poucos dias, seis ações foram apresentadas à Corte: ADI 6.421, ADI 6.422, ADI
6,424, ADI 6.425, ADI 6.427 e ADI 6.428 dos partidos Rede Sustentabilidade,
Cidadania, PSL, PCdoB, PDT, e da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que
apontavam que a medida do governo federal seria, para além de um relaxamento da
responsabilização, um salvo conduto à administração pública. Os termos usados,
inclusive nas sustentações orais, apontam para uma anistia, uma blindagem a
toda e qualquer atuação estatal no âmbito das medidas contra o coronavírus.
Em 8
de julho, o Ministro Luís Roberto Barroso determinou que o governo federal
adotasse uma série de medidas para conter o contágio e a mortalidade por
Covid-19 entre a população indígena. Em 5 de agosto, o plenário do STF
referendou a decisão.
Entre
as medidas estão: elaboração de um planejamento com a participação das
comunidades, ações para contenção de invasores em reservas e criação de
barreiras sanitárias no caso de indígenas em isolamento (aqueles que por
escolha própria decidiram não ter contato com a sociedade) ou de contato
recente (aqueles que têm baixa compreensão do idioma e costumes), acesso de
todos os indígenas ao Subsistema Indígena de Saúde e elaboração de plano para
enfrentamento e monitoramento da Covid-19.
A
decisão foi proferida na ADPF 709, ajuizada pela Articulação dos Povos
Indígenas do Brasil (APIB) e seis partidos políticos (PSB, PSOL, PCdoB, Rede,
PT, PDT), em que se apontou omissão do governo federal no combate à Covid-19
entre os indígenas. Na decisão, Ministro Barroso disse que “tem-se verificado
grande resistência no governo quanto à concretização dos direitos dos povos
indígenas”, citou falas do Presidente da República contra políticas a indígenas
e chamou a atenção para a gravidade de desmatamento e garimpo ilegal em terras
indígenas.
Por 9
(nove) votos a 1 (um), o plenário do STF suspendeu todo e qualquer ato do
Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) que autorize ou produza
relatórios sobre a vida pessoal e escolhas políticas de cidadãos que estejam
dentro da lei. Em julho, a imprensa revelou a existência de um documento
sigiloso sobre 579 (quinhentos e setenta e nove) servidores que se intitulavam
antifascistas e que se opunham ao governo do Presidente da República. Em 20 de
agosto, os dossiês produzidos pela pasta foram proibidos.
O
julgamento foi marcado por duras manifestações dos ministros contra o governo,
destacando que usar o sistema de inteligência para mapear opositores e posições
políticas de cidadãos configura desvio de finalidade. Ministros disseram que a
prática de listar inimigos do regime é prática de governos autoritários, e que
isso é vedado pela Constituição. Outros ainda destacaram a má qualidade do
relatório, que se baseou em postagens em redes sociais.
A
existência do documento, produzido pela Secretaria de Operações Integradas
(Siopi), do Ministério da Justiça, não foi negada pelo governo. O ministro
André Mendonça, entretanto, disse que não tinha ciência dele, e afirmou que só
soube do dossiê pela matéria jornalística. Segundo o ministro, a elaboração se
deu por “atuação proativa da própria diretoria”.
Foi a
Rede Sustentabilidade ajuizou no STF a arguição de descumprimento de preceito
fundamental (ADPF) 722, relatada pela Ministra Cármen Lúcia. O dossiê foi produzido em junho e trazia
informações sobre servidores federais e estaduais, principalmente policiais,
mas também sobre professores universitários. Mendonça assumiu a pasta em abril,
após a saída de Moro. Ele trocou 9 dos 14 nomes em cargos de chefia na Seopi,
incluindo a diretoria e a coordenação da área de Inteligência.
Por
meio da análise de uma consulta eleitoral feita pela deputada federal Benedita
da Silva (PT-RJ), com suporte da Associação Educafro (Educação e Cidadania de
Afrodescendentes e Carentes), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou,
em 25 de agosto, que a distribuição de recursos do fundo eleitoral e do tempo
gratuito de rádio e TV fosse proporcional ao total de candidatos negros que o
partido tiver.
Aí
estão incluídos os recursos públicos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de
Financiamento de Campanha (FEFC) e o tempo de rádio e TV para propaganda
eleitoral gratuita.
A
consulta tratava das cotas de gênero, mas o TSE deu uma resposta mais ampla, no
sentido de que vale tanto para mulheres quanto para homens o requisito. A
alteração, pelo entendimento firmado pelo TSE, teria validade a partir das
eleições gerais de 2022, para que houvesse tempo hábil para que a Corte
eleitoral regulamentasse o tema por meio de uma resolução.
O
caso, no entanto, foi levado ao STF, com pedido de aplicação imediata. Líderes
e presidentes partidários se preocuparam com a proximidade do pleito e tempo
mais curto de campanha pela alteração de datas em decorrência da pandemia.
Se no
TSE os ministros do Supremo que compõem a Corte foram os vencidos para que a
mudança tivesse validade já para 2020, no STF eles formaram maioria. Em 2 de
outubro, o plenário aplicou a reserva de recursos financeiros e de tempo de
propaganda em rádio e TV já para as eleições municipais.
Em 1
de outubro, o plenário do STF negou pedido do Congresso Nacional para suspender
a criação e alienação de subsidiárias da Petrobras, em um dos julgamentos
econômicos mais importantes do ano para o governo. Por 6 (seis) votos a 4
(quatro), o plenário entendeu que não havia indícios de que a Petrobras estaria
atuando com desvio de finalidade na transformação de refinarias em subsidiárias.
O
Congresso Nacional alegava que a estatal estaria transformando as refinarias em
“subsidiárias artificiais”, e deste modo estaria “fatiando” a empresa-mãe e a
privatizando sem passar pelo Congresso Nacional. A maioria do plenário,
entretanto, entendeu deu aval para o plano de privatização de subsidiárias da
estatal.
A
investigação sobre ameaças e fake news contra o STF foi referendada pelo
plenário da Corte em 18 de junho. O Inquérito 4.781 foi instaurado pelo então
presidente do STF Ministro Dias Toffoli em março de 2019. Mas, em maio deste
mesmo ano, chegou ao chamado gabinete do ódio, do clã presidencial, quando o
relator, ministro Alexandre de Moraes, determinou operação de busca e apreensão
em endereços de blogueiros, empresários e parlamentares ligados ao Presidente
da República.
Com
votos longos e enfáticos na defesa do tribunal, no sentido de diferenciar a
liberdade de expressão de ataques e ameaças, 10 dos 11 ministros votaram por
negar a ação que questionava a portaria que instaurou o inquérito.
Desta
forma, o tribunal endossou a medida e as investigações tiveram o aval para
prosseguir, sem haver questionamentos formais relevantes quanto à legitimidade
e legalidade. O inquérito pode continuar a ser fonte de desgaste entre
Judiciário e Executivo.
O
julgamento durou quatro sessões plenárias. Apenas o Ministro Marco Aurélio
divergiu do entendimento majoritário. Para ele, “o inquérito foi instaurado
logo pela vítima”, o que fere o sistema penal acusatório instituído pela
Constituição. A maioria, no entanto, defendeu a necessidade de se preservar a
integridade das instituições e de o STF agir diante da inércia dos órgãos
usuais de apuração.
Em 20
de maio, o STF homologou o acordo entre União e Estados sobre a compensação por
perdas de ICMS geradas pela Lei Kandir, acabando com um conflito federativo que
já durava mais de 20 anos. Segundo os termos firmados, a União deverá repassar
aos estados um valor total de R$ 65,6 bilhões. Desse montante, R$ 58 bilhões
devem ser transferidos entre 2020 e 2037. Em troca, os Estados se comprometeram
a retirar as ações judiciais contra a União sobre o tema.
Ficou
acordado que a União deveria apresentar ao Congresso Nacional, em até 60 dias,
um projeto de lei complementar com os termos do acordo – o que foi feito – e, a
partir daí, a discussão passou ao Congresso. Em 14 de dezembro, a Câmara
aprovou o PLP 133/2020; e texto foi para a sanção.
A Lei
Kandir está em vigor desde 1996 e isenta do pagamento de ICMS as exportações de
produtos e serviços, com a devida compensação feita pelo governo federal a estados
e municípios.
O
Congresso deveria regulamentar uma fórmula para essa compensação – mas isso
nunca foi feito. Por isso, o estado do Pará ajuizou uma ação no STF alegando a
omissão da Casa Legislativa, e após reuniões no STF mediadas por Gilmar Mendes,
os entes chegaram a um acordo.
No
mesmo dia em que o atual Presidente da República e um grupo de empresários
cruzaram a Praça dos Três Poderes a pé, numa atitude heterodoxa, para cogitar
sobre a retomada da atividade econômica com o presidente do Supremo, o governo
sofreu uma derrota na Corte, que suspendeu, na íntegra, a eficácia da MP
954/2020.
O
julgamento de 7 de maio desobrigou as empresas de telefonia, fixa e móvel, de
enviar dados pessoais dos clientes ao Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatísticas (IBGE).
Para
os ministros, a MP (Medida Provisória) não fornecia mecanismo técnico ou
administrativo para proteger os dados pessoais de acessos não autorizados,
vazamentos acidentais ou utilização indevida. Logo, não era proporcional nem
razoável.
O
colegiado referendou a liminar dada anteriormente, em 24 de abril, pela
relatora do caso, ministra Rosa Weber. Como aconteceu com outras MPs, várias
ADIs foram apresentadas à Corte contra o texto.
A MP
permitia que o IBGE tivesse acesso aos nomes, números de telefone e endereços
dos clientes de empresas de telefonia. A justificativa era possibilitar que o
órgão fizesse a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua),
que mede o desemprego no país, durante a situação de emergência de saúde pública.
Uma
importante vitória do governo na Corte também foi em uma MP. O STF negou, em 17
de abril, liminar para suspender a possibilidade dos acordos individuais para
redução de jornada e de salário e a suspensão temporária de contratos de
trabalho. As mudanças estavam previstas na Medida Provisória 936/2020.
Com 7
(sete) votos contrários, os ministros não referendaram a liminar do relator do
caso, ministro Ricardo Lewandowski, que determinava que as empresas
comunicassem os sindicatos no prazo de até 10 (dez) dias para que estes
deflagrassem uma negociação coletiva se assim o entendessem necessário.
Os
ministros entenderam que o texto da MP não viola direitos dos trabalhadores e
não fere o princípio da proporcionalidade. Isso porque se trata de uma medida
emergencial e provisória e que pretendia justamente evitar que houvesse
demissões em massa, e manter as empresas sustentáveis.
A MP
936/2020 instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e
foi transformada em norma em 6 de julho. A Lei 14.020 foi sancionada com vetos,
proibindo-se a prorrogação até 2021 da desoneração da folha de pagamento de
empresas de 17 setores da economia.
Em
outubro do ano passado, o atual Presidente da República assinou decreto que
estende até o fim de dezembro as medidas possibilitadas pela MP 936. Dessa
forma, o programa vai totalizar oito meses de vigência.
Logo
no início da pandemia da Covid-19, o governo acionou o STF pedindo autorização
para descumprir, temporariamente, regras da Lei de Diretrizes Orçamentárias
(LDO) e da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), para que não tivesse
necessidade de apontar uma fonte de recursos extras para compensar gastos não
previstos na LDO com medidas de combate ao coronavírus. Em março de 2020, o Ministro
Alexandre de Moraes atendeu ao pedido do governo, suspendendo obrigações da LRF
também para estados e municípios.
Em 13
de maio de 2020, o plenário referendou a decisão por unanimidade, mas declarou
extinta a ação apresentada pela Advocacia-Geral da União (AGU), diante da aprovação
do Orçamento da Guerra. Para os ministros, a ação direta de
inconstitucionalidade (ADI) 6357 perdeu o objeto, já que a Emenda
Constitucional 106, promulgada em 7 de maio, já abrangeria os pedidos da União
à Corte Suprema.
Ainda
assim, os ministros avaliaram que, em nome da segurança jurídica, devia-se
assentar o referendo da liminar do relator do caso para que ficasse claro que a
flexibilização tem validade para todos os entes da federação.
Dentre
as últimas sessões do ano, um dos destaques é o julgamento que definiu que o
Estado deve oferecer, sempre que possível, alternativas de datas para pessoas
que não possam prestar concursos públicos ou atividades de serviço público em
determinados dias por motivos religiosos. O julgamento levou três sessões plenárias
e motivou debates entre os ministros quanto à solução firmada.
O
colegiado concluiu que, em respeito à liberdade religiosa, a Administração Pública
deve buscar alternativas para aqueles que professam fé que imponha
particularidades, quando for razoável. Ou seja, os ministros se preocuparam em
assentar que não é em todo e qualquer caso que a administração pública deverá
se adequar às idiossincrasias religiosas.
O caso
foi discutido em dois processos: em um destes um homem adventista passou na
prova objetiva para o cargo de técnico judiciário no Acre, mas a prova de
aptidão física foi marcada para um sábado. Como a religião adventista não
permite que os fiéis trabalhem ou se esforcem do pôr-do-sol de sexta-feira ao
de sábado, o candidato, então, acionou a Justiça.
No
outro, uma professora adventista se insurgiu contra a reprovação no estágio
probatório por ela ter se recusado a ministrar aulas às sextas-feiras após o
pôr-do-sol, faltando 90 (noventa) vezes injustificadamente em razão de suas
convicções religiosas.
Em 11
de março, o plenário do STF julgou um dos casos mais importantes sobre saúde
que tramitam na Corte, e definiu que o Estado, via de regra, não é obrigado a
fornecer medicamentos de alto custo não disponíveis na listagem do Sistema
Único de Saúde (SUS). Mas, para os ministros, há casos excepcionais em que o
fornecimento é devido. Os casos excepcionais ainda serão estabelecidos por meio
da tese do julgamento, que ainda não foi fixada data.
Na
ocasião, entretanto, os ministros já manifestaram pontos de entendimento
convergente sobre os critérios excepcionais, como quando paciente nem família
têm condições financeiras e não há tratamento equivalente pelo SUS. Havia mais
de 42 mil processos no país aguardando este julgamento do STF.
O Presidente
da República editou, em 23 de março do corrente ano, a Medida Provisória (MP)
928/2020, na qual suspendeu os prazos para resposta da Lei de Acesso à
Informação (LAI) durante a pandemia da Covid-19. Quase instantaneamente, a
norma foi questionada no STF[22], por meio das três ações
diretas de inconstitucionalidade, que foram distribuídas ao Ministro Alexandre
de Moraes. Em 26 de março, o ministro suspendeu a MP.
Para o
Ministro Alexandre de Moraes, a medida “transforma a regra constitucional de
publicidade e transparência em exceção, invertendo a finalidade da proteção
constitucional ao livre acesso de informações a toda sociedade”. O ministro
destacou que “a publicidade e transparência são absolutamente necessárias para
fiscalização dos órgãos governamentais. O acesso à informação é verdadeira
garantia instrumental do pleno exercício democrático”.
Em 30
de abril, em mais uma derrota para o governo atual, o plenário confirmou a
liminar, deixando claro que a pandemia não é motivo para desobedecer a
preceitos constitucionais, como a transparência da administração pública.
Não é
possível reconhecer que uma pessoa tenha duas uniões estáveis concomitantes
para dividir a pensão por morte entre os companheiros. Esta foi uma das últimas
decisões do STF tomadas no ano. A conclusão ocorreu em 14 de dezembro no
plenário virtual.
No
caso concreto, depois da morte de um homem, uma mulher acionou a Justiça
pleiteando o reconhecimento de uma união estável e da consequente pensão e, mais
tarde, um homem fez o mesmo pedido. Tanto ministros que ficaram vencidos quanto
os vencedores enfatizaram que o debate não se deu em torno do fato de uma das
relações ser homoafetiva.
Na
sessão que deu início ao julgamento, em 2019, o relator, ministro Alexandre de
Moraes, enfatizou que o Supremo não poderia reconhecer a bigamia. Ele foi
acompanhado por Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Mas outros cinco ministros
votaram pelo reconhecimento de duas relações concomitantes desde que provado
que não houve má-fé dos envolvidos. Neste caso, deveria ser concedida proteção
jurídica para os efeitos previdenciários decorrentes. Na ocasião, Dias Toffoli
pediu vista e o caso foi devolvido ao plenário em sessão virtual. Tanto Toffoli
como os autores dos dois votos restantes, Luiz Fux e Nunes Marques,
acompanharam o relator.
Em 17
de dezembro, o plenário do STF decidiu que tanto a União, quanto os estados e
municípios podem determinar a vacinação compulsória. Os ministros destacaram
que a vacinação não pode ser forçada, mas o poder público pode adotar medidas
restritivas para incentivar a imunização.
Foi
definida a seguinte tese: “A vacinação compulsória não significa vacinação
forçada, porquanto facultada sempre a recusa do usuário, podendo, contudo, ser
implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre
outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de
determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e (i)
tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes,
(ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e
contraindicações dos imunizantes, (iii) respeitem a dignidade humana e os
direitos fundamentais das pessoas, (iv) atendam aos critérios de razoabilidade
e proporcionalidade e (v) sejam as vacinas distribuídas universal e
gratuitamente”.
Ainda
segundo a tese adotada pelo Supremo, “tais medidas, com as limitações acima
expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito
Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência”.
Em
relação à vacinação contra a Covid-19, foi decidido que as vacinas devem ter
registro em órgão de vigilância sanitária, mas não necessariamente na Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A depender do caso,
excepcionalmente, os entes podem importar materiais, medicamentos, equipamentos
ou vacinas registrados em agências de vigilância sanitária dos Estados Unidos,
Reino Unido, Japão, Europa ou China. (IN: POMPEU, Ana; FREITAS, Hyndara. Os 20
julgamentos mais importantes do STF em 2020. Disponível em: https://www.jota.info/stf/do-supremo/os-19-julgamento-mais-importantes-do-stf-em-2020-28122020 .
Acesso em 12.1.2021[23].).
Para
facilitar a compreensão desse impacto nos reportamos a 5.5.2016 quando o STF
referendou a decisão do Ministro Teori Zavascki, proferida na Ação Cautelar
4070 que suspendeu Eduardo Cunha do exercício do mandato de deputado federal e,
por consequência, da função de presidente da Câmara dos Deputados.
Por
unanimidade, os ministros acompanharam o posicionamento do ministro relator,
que deferiu a medida requerida pelo Procurador-Geral da República que apontou
uma série de evidências de que Eduardo Cunha teria agido com desvio de
finalidade para atender aos seus próprios interesses.
A
denúncia do Inquérito 3983 contra o parlamentar citado, foi recebida por
unanimidade pelo Plenário do STF. Por esse motivo, o relator invocou o artigo
282 do CPPP segundo o qual é possível a interposição de medidas cautelares em
processo penal para assegurar a aplicação da lei, resguardar a conveniência das
investigações e da instrução penal e evitar a prática de infrações penais.
O
Ministro relator sustentou também que a posição de presidente da Câmara de
Deputados não imuniza o parlamentar de medidas sociais de caráter cautelar. A
decisão ainda ressalta a iminência da instauração, pelo Senado Federal, do processo
de impeachment contra a presidente da República, e, Eduardo Campos, como
presidente da Câmara de Deputados, encontrava-se na linha sucessória para o
cargo.
De
acordo com o STF, um parlamentar que é réu em ação penal não tem condições de
exercer responsabilidades do cargo, e, portanto, não pode estar na linha
sucessória para a presidência da República. Foi ajuizada perante o STF, a ADPF
402 que discutia a possibilidade de réus em processo penal ocuparem cargo cujas
atribuições constitucionais incluem a substituição do Presidente da República
tem-se como automática a suspensão das funções exercidas.
Por
maioria de votos, o STF entendeu que réus em processo-crime no STF não podem
ocupar cargos cujas atribuições incluam a substituição do Presidente da República,
sob o fundamento de que recebida a denúncia contra o Presidente da República
tem-se a suspensão automática das funções exercidas.
A
referida decisão foi proferida em 03.11.2016. No dia 01.12.2016, o STF, por
maioria dos votos, recebeu denúncia oferecida pela PGR contra o presidente do
Senado, Renan Calheiros, no Inquérito 2593, tornando o réu o senador em
processo criminal.
Por
esse motivo, foi realizado em pedido cautelar na ADPF 402, requerendo o
afastamento do senador da linha sucessória da presidência da república, sob os
mesmos fundamentos que se baseara a decisão original da arguição de
descumprimento de preceito fundamental.
O
Ministro Marco Aurélio, relator da medida deferiu o pedido liminar para afastar
não do exercício do mandato de senador, outorgado pelo povo alagoano, mas do
cargo de Presidente do Senado. O plenário do STF não confirmou a decisão do
relator.
Por
maioria, o STF negou o afastamento de Renan Calheiros da Presidência do Senado,
mas após uma ginástica hermenêutica, afirmou que o Senador, por ser réu não
poderia assumir a Presidência da República na ausência do Presidente. Comenta a
doutrina que houve uma invasão direta do Judiciária dentro da esfera do
Legislativo, sem haver específica autorização constitucional para tanto.
Nem é
necessário destacar os adjetivos dos parlamentares em questão, pois pretende-se
apontar somente a proibição do réu em ação penal, não poder ocupar o cargo na
linha sucessória presidencial, o que não possui respaldo constitucional.
Segundo
Pierpaolo Cruz Bottini relatou que o STF entende que os réus em processos
penais não podem ocupar o cargo de Presidente da República.
Cabe
realizar um breve histórico: no dia 3 de novembro, o STF iniciou o julgamento
da mencionada ação, de autoria da Rede Sustentabilidade, que tem o escopo de
impedir que réus em ações penais em trâmite no STF possam ocupar cargos que
estejam na linha sucessória ou substitutiva do presidente da República.
Em
outras palavras, aqueles que respondem a processos criminais na Suprema Corte
não poderiam estar à frente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do
Supremo Tribunal Federal, pois todos eles podem, eventualmente, ocupar o cargo
de Chefe do Poder Executivo Federal.
A
Constituição Federal vigente em seu artigo 86, parágrafo primeiro, prevê que o
Presidente da República será suspenso de suas funções, se o STF recebe contra
ele denúncia ou queixa-crime pela prática de crime comum. Isto é, caso seja
instaurada a ação penal contra o Presidente, este não poderá exercer suas
atribuições e, ficará afastado do cargo. Portanto, a função de Presidente da
República é incompatível com a condição de réu.
A
previsão legal está correta, mas apenas
daqueles atos relacionados ao exercício de suas funções, ou seja, aqueles
praticados durante o mandato, nos quais o agente usa do cargo de Presidente da
República para a empreitada criminosa (por exemplo, corrupção passiva, quando o
ato prometido está dentre as funções de Chefe do Executivo).
E se o
presidente for acusado da prática de um delito sem relação com o exercício de
suas funções, como, por exemplo, um crime financeiro, contra a ordem
tributária, ou mesmo um ato de corrupção anterior à posse, quando ocupava outro
posto? Pelo artigo 86 parágrafo 4º da Constituição Federal, ele não poderá ser
responsabilizado por esses atos estranhos às suas atribuições, na vigência de
seu mandato. Assim, por exemplo, se o presidente era processado antes da posse
por qualquer infração, tal procedimento será suspenso até que ele deixe o
cargo.
Já
pontuou o ministro Celso de Mello, ocorrerá "a cláusula de exclusão
inscrita nesse preceito da Carta Federal (CF, artigo 86, §4º), ao inibir a
atividade do Poder Público, em sede judicial, alcança as infrações penais
comuns praticadas em momento anterior ao da investidura no cargo de Chefe do
Poder Executivo da União, bem assim aquela praticadas na vigência do Mandato,
desde que estranhas ao ofício presidencial" (Inquérito 672-6/DF).
Por
isso, o posto de presidente da República pode ser ocupado por réu em ação
penal. O que a Constituição não admite é o exercício do cargo por alguém
processado por crime relacionado ao exercício das funções de chefe do
Executivo. Não há impedimento para que um réu processado por outro delito
exerça — ou pretenda exercer — o cargo. (In: BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Réus
podem integrar linha sucessória da Presidência da República. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2016-nov-08/pierpaolo-bottini-nem-todo-reu-afastado-linha-sucessoria Acesso em 12.1.2021).
O
fundamento do afastamento e a determinação do afastamento são frutos da
criatividade do STF e não possuem dispositivos constitucionais que as autorize.
Evidencia-se
o agigantamento do Judiciário. O fato é que a CF/1988 não autoriza o STF
determine o afastamento de parlamentar regulamento eleito. Conclui-se que é
ativista na perspectiva macro porquanto, por meio de distorções interpretativas
de princípios que, possuem alto teor de abstração, o STF forjou óbice que a
própria CF/1988 não estabeleceu.
O que
permitiu a direta ingerência do Judiciário no Legislativo, ocasionando o
afastamento dos Chefes das Casas Legislativas, ressaltando que o Presidente do
Senado é o Chefe do próprio Poder Legislativo.
Alguns
segmentos doutrinários preferem identificar o bom e o mau ativismo judicial. O
bom ativismo proporciona benefícios ao jurisdicionado como criar direitos,
assegurar direitos, não previstos expressamente em nenhum diploma legal, ampliar
as garantias processuais para proteção dos direitos; assinala o Congresso Nacional a necessidade
de reforma legislativa em determinada matéria; controlar os excessos do poder
em geral, flexibiliza certas decisões legislativas restritivas de direitos; implementar
mecanismos para superar a inconstitucionalidade por omissão.
Nelson
Nery Jr. e George Abboud afirmam que o ativismo é perigoso ao Estado
Democrático de Direito, não cabendo diferenciar o bem ou mal ativismo. Tanto
que caracterizam o ativismo como afastamento da legalidade vigente.
Aqui
em nosso país, o termo “ativismo” tem sido usado para justificar inúmeras
decisões judiciais que, facialmente seriam consideradas inconstitucionais ou
ilegais. As decisões dos Ministros
Gilmar Mendes e Eros Grau na Reclamação 4335 que pretenderam criar uma
pseudomutação constitucional à brasileira.
Diferente
do ativismo, é a judicialização das políticas públicas que consagra novos
direitos, fundamentais tendo limites intransponíveis para o Poder Público e
para os particulares.
Essa
judicialização de novos direitos e conflitos, bem como uma nova cadeia
normativo-constitucional a reger a atuação do Poder Público em todas as suas
esferas, juntamente com a consolidação do controle de constitucionalidade,
atribuindo, nova dimensão ao Poder Judiciário, tornando-o um locus privilegiado
na resolução de questões político-constitucionais mais relevantes.
Estudos oriundos da ciências jurídica que dão conta da expansão do judge made
law no continente europeu, e mais recentemente, pelos países periféricos
(emergentes) como é o Brasil.
As
transformações operadas pelo constitucionalismo, do segundo pós-guerra e, o
papel efetivo desempenhado pelo Tribunal Constitucional Federal alemão para
efetividade da Lei Fundamental de Bonn de 1949, passam por essa atual
tendência, de expansão do poder judicial.
No
Estado Democrático de Direito o Judiciário tem o dever de demonstrar os
fundamentos jurídicos que o fizeram decidir dessa ou daquela maneira. Desse
modo, ainda que o juiz considere injustas as figuras, por exemplo, da revelia,
da usucapião, a prescrição, apenas para ficarmos nesse exemplo, deverá
aplica-las quando for o caso, porque contempladas na legislação vigente que,
por sua vez, vincula a atividade decisória.
Da
mesma forma que aplica o cabimento de prescrição porque estabelecida na lei e,
assim a justificam também em questão de mérito deve valer da Constituição e da
lei e, não de sua própria moralidade. Não há prescrição moralizadora, nem
moralizável.
Analisando
alguns julgados do STJ para mensurar a dimensão do ativismo decisório. No
julgamento da QO no REsp 1063343[24], o STJ negou à parte a
possibilidade de desistir do recurso, com fundamento em interesse público,
tendo em vista seu recurso ter sido selecionado como paradigma pra fins de
aplicação do CPC/1973 (artigo 543-C).
Noutra
ocasião, no julgamento do REsp 1308830[25], o interesse público foi
invocado no fundamento normativo para impedir a parte de desistir de seu
recurso, uma vez que o julgamento da lide individual seria de interesse de toda
a coletividade.
Entretanto,
o CPC/1073 em seu artigo 501 admitia expressamente à possibilidade de o
litigante renunciar a qualquer tempo seu recurso, inclusive, sem necessidade de
o recorrido ou o litisconsorte anuírem a essa decisão.
Já
salientamos que a desistência recursal é um negócio jurídico unilateral não
receptício, segundo o qual a parte que já interpôs recurso contra decisão
judicial declara sua vontade em não prosseguir o procedimento recursal que, em
consequência, tem de ser existido. Inclusive, opera-se, independentemente, da
concordância do recorrido, produzindo efeitos desde que é efetuada tem
necessidade de homologação.
Percebe-se
que o STJ julgou de forma contrária ao que estabelecia o CPC de 1973. Ou seja,
desaplicou o referido dispositivo legal, no caso concreto, apenas pelo
desconforto de eleger, outro recurso como paradigma da repetição.
Sobre
a possibilidade de o recorrente poder desistir de seu recurso especial ou extraordinário.
Isto porque o caso que será julgado pelo STF e/ou STJ como recurso repetitivo
tem, com matéria de fundo, lide individual que encerra discussão sobre o
direito subjetivo.
Eventual
má-fé do recorrente, com a quebra do dever de lealdade processual e o agir de
má-fé objetivo ou subjetivo, desde que reconhecida pelo tribunal, pode ensejar
a pena de improbus litigator prevista no CPC de 1973[26].
O que
não pode ocorrer é, sob alegação de que o recorrente teria desistido do Resp
por má-fé, ignorar-se o ato unilateral não receptício da desistência, a
despeito de inexistir pressuposto de admissibilidade desse, Resp pelo só fato
da desistência, conhecer-se do recurso.
O que
de fato merece exame sobre as mencionadas decisões do STJ é indagar-se em quais
circunstâncias essa medida se coaduna com o Estado Democrático de Direito, ao
afastar a legalidade vigente em função do interesse público. Seria possível
desse modo, aumentar ou diminuir o prazo prescricional em razão do interesse
público? Ou ainda, modificar-se o regime de nulidade em virtude do interesse
público?
Evidente
que tais respostas a esses questionamentos devem ser negativas. A legalidade
não está à disposição dos Tribunais. Não existe opção constitucionalmente
válida que permita ao Judiciário, sponte sua, optar em aplicar ou não a lei,
sob o argumento de preservar o interesse público.
Não é
lícito ao STJ admitir que seja constitucional e vigente o CPC/1973 e negar a
sua aplicação ao caso concreto. A todo Judiciário não é lícito recusar-se a
aplicar a lei.
Comentando
essa decisão do STJ, Lenio Streck ressalta, que nas palavras do STJ, restou
claro que o Recurso Especial não pertence mais às partes, mas apenas ao
interesse público, que seria, na verdade uma “anemia significativa”, nela
cabendo qualquer coisa que o interesse ao Judiciário e do Poder Público para
fins pragmáticos.
Prossegue
Streck, o Estado não pode agir tal como Midas ao seu toque de impor o selo de
“público” aos casos que lhe aprouver em detrimento dos direitos fundamentais e
garantias dos particulares.
Ademais,
a desistência do recurso nos termos do CPC de 1973, constituiu ato unilateral
que na dicção do CPC independe de anuência da parte para que valha e produza
efeitos. Se a parte desistir, não há recurso.
No
sentido em que é criticada a utilização do interesse público, há interessante
trabalho de George Abboud intitulado “O mito da supremacia do interesse público
sobre o privado - A dimensão constitucional dos direitos fundamentais e os
requisitos necessários para autorizar restrição a direitos fundamentais[27]”.
A fora
isso, se fosse realmente o caso de aplicar o CPC/1973 (CPC/2015 arts. 1.036,
1.041), bastava somente o STJ pinçar outro recurso dentre os múltiplos
existentes e solucionar a questão jurídica subjacente. Do mesmo modo, o STJ
teria diversas outras oportunidades para manifestar-se sobre a mesma questão
posta no recurso do qual se desistiria.
Há um déficit
qualitativo na fundamentação de pronunciamentos judiciais, porque, de certa
forma, os juízes, em diversas hipóteses, admitem o afastamento da legalidade
com o fundamento em convicções pessoais.
Note-se
que tais modalidade de decisões são absolutamente discricionárias, na medida em
que com fundamento em convencimento pessoal, sob o pretexto de interesse
público, admitem que seja afastada a legalidade vigente. Como não existe
discricionariedade judicial, a expressão, nesse caso quer significar que
decisão discricionária é decisão inconstitucional e/ou ilegal.
No
fundo, esse tipo de decisão suspende a legalidade vigente, a fim de fazer
prevalecer o ponto de vista do julgador. Por meio dessas decisões é criado um
estado de exceção em que a necessidade do julgador o faz abrir mão da
legislação vigente. Nessa perspectiva, a lei formalmente continua vigente e
válida; todavia, sua aplicação é excepcionada (negada) em relação ao caso
concreto, em razão de interesse público.
Tais
decisões, ora analisadas, devem ser consideradas apenas como paradigmas,
demonstram que existe verdadeiro déficit qualitativo na fundação das decisões
judiciais, que não pode ser corrigido pelo simples recrudescimento do efeito
vinculante.
O STJ
cujo mister constitucional mais nobre é, pelo recurso especial, preservar o
respeito e autoridade da lei federal no Brasil e uniformizar o seu entendimento
negou vigência (em duas oportunidades) ao CPC de 1973, por considera-lo em
desacordo com o interesse público e defasado em relação à nossa realidade
social.
Ao STJ
cabe garantir o respeito à lei federal e à uniformização do entendimento da lei
federal brasileira, com as decisões ora analisadas negou vigência ao CPC/1973
(artigo 501). Não existe no ordenamento vigente brasileiro a previsão
constitucional que autorize o STJ a julgar a tese jurídica subjacente quando
aquele que recorreu por meio do recurso especial desiste do recurso.
O
referido tema foi novamente analisado pelos STJ e durante o julgamento do Resp
1370698, a Terceira Turma, acertadamente e com ressalva da posição da Ministra
relatora Nancy Andrighi, modificou posição manifestada, anteriormente na questão
de ordem (QO) no Resp 106343-RS, para dizer que é direito da parte a
desistência de recurso, ainda que afetado ao regime jurídico de recursos
repetitivos.
Dentro
do Estado Constitucional ao Judiciário somente é lícito afastar a aplicação da
lei em relação ao caso concreto quando reconhece, incidenter tantum, a
inconstitucionalidade dessa lei, tarefa que faz mediante controle difuso de
constitucionalidade. A possibilidade de declarar inconstitucional a Lei Federal
em abstrato é atribuição exclusiva do Supremo Tribunal Federal (STF) vide
artigo 102, I a da CF/1988.
As
analisadas decisões do STJ são claros sintomas de insegurança jurídica que
infelizmente tem ocorrido em nosso país. E, contemporaneamente, tem
recrudescido em sede doutrinária e legislativa, a tendência em incrementar-se o
efeito vinculante dos pronunciamentos dos Tribunais Superiores.
Importante
frisar que o efeito vinculante não pode desvirtuar a força normativa da
legislação vigente. Conclui-se que não é poque nosso sistema existem a súmula
vinculante e as decisões judiciais dotadas de efeito vinculante que a lei não
possui o efeito vinculante.
Em
outros termos, a lei vincula o Poder Judiciário, motivo por que deve
interpretá-la e aplicá-la no caso concreto. Não há aplicação de texto
normativo, sem a mediação da atividade interpretativa. Ao juiz não é dado
aplica-la quando considerar adequada ou quando estiver em consonância com suas
convicções pessoais.
Realmente,
a insegurança jurídica no sistema jurídico brasileiro, trazida pela
jurisprudência lotérica, não se deve à inexistência de efeito vinculante em
todas as decisões do STF e STJ.
Pensar,
nesse sentido, sugere que a lei não seria também dotada de efeito vinculante.
De modo que o Judiciário poderia descumprir a lei, mas não a súmula vinculante.
Lembremos que aos juízes e tribunais, é defeso ignorar tanto a lei quanto a
súmula vinculante, somente podendo fazê-lo, se declarar incidentemente
inconstitucional o texto normativo da lei ou da súmula vinculante.
Há um déficit
qualitativo das decisões, mais precisamente da falta de motivação adequada,
procedimento que infringe a CF/1988, art.93, IX e não em função da falta de
efeito vinculante das decisões dos tribunais superiores.
Trata-se
de equívoco apontar a falta de efeito vinculante das decisões das Cortes
Superiores como causa da insegurança jurídica ignorando-se, assim a verdadeira
discricionariedade judicial que impera em nosso sistema, que ocasiona reflexos
no ativismo judicial ou na nulidade de diversas decisões em virtude de omissão
e falta/deficiência de fundamentação.
Faz-se
necessário ressaltar que os pronunciamentos, que possuem efeito vinculante
também necessitam interpretação para serem utilizados, de modo que tal como a
própria legislação, nada garante que as decisões, dotadas do referido efeito
não serão afastadas em diversos casos, com fundamento em convicções pessoais do
magistrado.
A
função jurisdicional, principalmente a constitucional, ganha força e
legitimidade, não com aumento de decisões dotadas de efeito vinculante, como
acontece em nosso país, mas sim, por meio de fundamentação constitucional
rigorosa de suas decisões. Eis a fonte de legitimidade das decisões do
Judiciário, que não podem mais buscar em meras convicções pessoais de seus
julgadores, mas em critérios racionais imputáveis e contidos no próprio texto
constitucional.
Deve-se
concretizar a obrigatoriedade do Judiciário submeter-se-á legislação vigente,
nada assegura que o recrudescimento de decisões com efeito vinculante
contribuirá para o progresso da democracia, com o incremento da fundamentação
das decisões e redução da discricionariedade judicial. Somente pode se
desvincular da Constituição ou da lei ao realizar o controle difuso de
constitucionalidade, recolhesse a inconstitucionalidade da lei ou do ato
normativo.
A
atual Constituição Federal brasileira em seu artigo 3º e seus incisos aborda a
necessidade de a república pátria construir uma sociedade justa, livre e
solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e promover
o bem de todos.
Assim,
o Judiciário responde quando evocado por demandas que envolvem o mínimo
existencial, que corresponde ao conjunto de direitos e garantias do cidadão
para lhe assegurar a sobrevivência humana com dignidade, a isso não podemos
chamar de ativismo judicial e, sim, de acesso ao processo justo onde resta
assegurado a razoável duração do processo[28].
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[1]
Tanto o ativismo judicial como a judicialização necessitam de provocação do
Judiciário. No ativismo há o entendimento criativo de um Tribunal, uma
interpretação nova do direito, muitas vezes precedente a uma lei, interpretação
legal de forma muito ampla não contemplada pela própria lei. Na judicialização,
as decisões com teor político, das políticas públicas, entre outros, na qual o
Poder Judiciário interfere nas decisões de outros poderes, baseado na
legislação (princípios e regras). No ativismo, o Judiciário atua além da
legislação sem respaldo legal e, na judicialização, o Judiciário atua além de
suas competências baseado em lei.
[2] Administração Pública é o conjunto de órgãos,
serviços e agentes do Estado que procuram satisfazer as necessidades da
sociedade, tais como educação, cultura, segurança, saúde, etc. A administração direta é aquela exercida pelo
conjunto dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios.
Di Pietro admite que a
expressão Administração Pública pode ser compreendida em sentido subjetivo,
formal ou orgânico e, em sentido objetivo material ou funcional. Em sentido
formal ou orgânico designa os entes que exercem a atividade administrativa,
compreendendo pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de
exercer uma das funções em que se triparte a atividade estatal; a função
administrativa. Já em sentido material ou funcional designa a natureza da
atividade exercida pelos referidos entes, nesse sentido, a Administração
Pública é a própria função administrativa que incumbe, predominantemente, ao
Poder Executivo. Segundo a doutrinadora citada (2012:50), a Administração Pública
também pode ser compreendia em sentido amplo ou em sentido restrito: “a) em
sentido amplo, a Administração Pública, subjetivamente considerada, compreende
tanto os órgãos governamentais, supremos, constitucionais (Governo), aos quais
incumbe traçar os planos de ação, dirigir, comandar, como também os órgãos
administrativos, subordinados, dependentes (Administração Pública, em sentido
estrito), aos quais incumbe executar os planos governamentais; ainda em sentido
amplo, porém objetivamente considerada, a Administração Pública compreende a
função política, que traça as diretrizes governamentais e a função
administrativa, que as executa; b) em sentido estrito, a Administração Pública
compreende, sob o aspecto subjetivo, apenas os órgãos administrativos e, sob o
aspecto objetivo, apenas a função administrativa, excluídos, no primeiro caso,
os órgãos governamentais e, no segundo, a função política”. In: DI PIETRO,
Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 25 ed. São Paulo, Atlas, 2012.
[3]
Os conflitos de normas ocorridos durante o processo de interpretação
denominam-se antinomias. Tais busilis podem ser solucionados através de
aplicação de três critérios, a saber: hierárquico, cronológico e da
especialidade. O primeiro critério solucionador de antinomias e o mais
relevante é o hierárquico, pois não há o que se falar em norma jurídica
inferior contrária à superior. Isto
ocorre porque “a norma que representa o fundamento de validade de uma outra
norma é, em face desta, uma norma superior”, por exemplo a Constituição Federal
de 1988 tem caráter supralegal, na qual, as demais leis (ordinárias,
complementares, etc.) devem estar em consonância aos princípios estabelecidos
por ela, caso contrário será considerada inconstitucional perdendo sua
efetividade.
O critério cronológico tem
por fundamentado o artigo 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro, que regula que norma posterior revoga a anterior: “A lei posterior
revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela
incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei
anterior”.
O terceiro e último
critério é o da especialidade o qual prescreve que a norma especial prevalece
sobre a geral. Este critério também se encontra no artigo 2º, § 2o da Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro. “A lei nova, que estabeleça
disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem
modifica a lei anterior”. O princípio da especialidade tem por finalidade
evitar o bis in idem, sendo certo que a comparação entre as normas será
estabelecida in abstracto. Um exemplo que podemos citar é o conflito de
parâmetros de níveis sonoros determinados em decibéis. O Decreto-Lei n.
4.657/1942, em sua redação original, tinha como ementa: “Lei de Introdução ao
Código Civil Brasileiro” (LICC). Porém, com a entrada em vigor da Lei n.
12.376/2010, o título do referido decreto-lei foi alterado para “Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro” (LINDB). Essa mudança ocorreu em
virtude de a LINDB não ser parte integrante do Código Civil, e sim uma lei
autônoma. As normas previstas na LINDB não regulam apenas as partes integrantes
do Código Civil, mas todas as normas previstas no ordenamento jurídico. Ela não
rege a vida das pessoas, como é o caso do Código Civil, mas sim as próprias
normas jurídicas, alcançando tanto o direito privado, quanto o direito público.
[4] ALEXY,
Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. São Paulo, SP: Malheiros
Editores, 2011. p. 90.
[5]
É presidente do American Philosophy Institute, que é um grupo
interdisciplinar de acadêmicos de várias universidades, apoiado por líderes
empresariais e profissionais locais, que promove uma filosofia pública de
direito natural enraizada nos princípios da Fundação Americana - uma que busca
a liberdade e prosperidade, alicerçada na integridade moral da cultura e das
nossas instituições sociais e políticas. O trabalho recente do doutrinador
inclui: O Direito Natural Hoje: O Estado Atual da Filosofia perene ( Lexington
Books, 2018; Reflexões Origiinalistas sobre a Liberdade de Expressão
Constitucional, SMU Law Review, volume 71, nº3 (verão de 2019); Natural
Law and Politics em The Cambridge Companion to Natural Law
Ethics, Ed. Tom Angier (Cambridge
University Press, 2019); O Conceito de Justiça Judicial (St. Augustine Press);
McCulloch versus Md. e Marschall's Constitutional Interpretation
(AEI).
[6]
Earl Warren (1891-1974) foi político e jurista norte-americano que serviu como
governador da Califórnia entre 1943 a 1953 e Chefe de Justiça dos EUA de
5.10.1953 a 23.6.1969. É considerado em geral como sendo um dos juízes e
líderes políticos da Suprema Corte mais influentes da história dos EUA.
[7]
O pragmatismo jurídico consiste na revivescência de movimento preponderante na
esfera jurídica norte-americana, no início do século XX. o realismo jurídico
que é igualmente conhecido como Jurisprudência sociológica. O pragmatismo pode
ser considerado como um movimento filosófico, principalmente difundido nos
Estados Unidos da América, surgido entre o final do século XIX e início do
século XX. A segunda a ideia fundante do pragmatismo, o consequencialismo,
impõe o exame axiológico da ação, avaliando quais serão as suas possíveis
consequências, de modo que esta antevisão possibilite obter os resultados mais
satisfatórios, úteis ou benéficos para a coletividade. A lição de Holmes, de
que o direito é, sobretudo, experiência e não lógica pura, ou a tese de Ortega
Y Gasset, de que a lógica do direito é a lógica do razoável, de certa forma
guardam a essência do método sociológico que é também conhecida como a Escola
Sociológica do Direito de Benjamin Cardozo e Roscoe Pound. O pensamento
compartilhado aí era no sentido de que o elemento político-social deve
interferir na interpretação da lei, com vistas à satisfação do interesse público
e dos superiores interesses da coletividade.
[8]
Lochner versus New York, 198 US 45 (1905), foi uma decisão histórica da
Suprema Corte dos EUA, que considerou que os limites do tempo de trabalho
violavam a Décima Quarta Emenda. A decisão foi efetivamente anulada. Uma lei do estado de Nova York limitava as
horas de trabalho dos funcionários da padaria a 10 horas por dia e 60 horas por
semana. Uma maioria de cinco juízes considerou que a lei violava a cláusula do
devido processo, afirmando que a lei constituía uma "interferência
irrazoável, desnecessária e arbitrária no direito e na liberdade do indivíduo
de contratar ". Quatro juízes dissidentes rejeitaram essa visão, e a
dissidência de Oliver Wendell Holmes Jr., em particular, tornou-se uma das
opiniões mais famosas da história do direito dos Estados Unidos. Lochner é uma
das decisões mais controversas da história da Suprema Corte e deu o nome ao que
é conhecido como Era Lochner. Durante esse tempo, o Supremo Tribunal Federal
emitiu várias decisões invalidando estatutos federais e estaduais que buscavam
regular as condições de trabalho durante a Era Progressiva e a Grande
Depressão. O período terminou com West Coast Hotel Co. versus Parrish
(1937), no qual a Suprema Corte manteve a constitucionalidade da legislação de
salário mínimo promulgada pelo Estado de Washington.
[9]
Robert Heron Bork (1927-2012) foi juiz norte-americano, funcionário do governo
e acadêmico jurídico que serviu como Procurador-Geral dos EUA de 1973 a 1977.
Professor da Escola de Direito de Yale por ocupação, e mais tarde serviu como
juiz no influente Tribunal de Apelações dos EUA para o Circuito de DC de 1982 a
1988. Em 1987, o presidente Ronald Reagan indicou Bork para a Suprema Corte dos
EUA, mas o Senado dos EUA rejeitou sua nomeação.
[10]
Edwin Meese III é um advogado norte-americano, professor de Direito, autor e
membro do Partido Republicano que ocupou cargos oficiais na administração
governamental de Ronald Reagan, na Equipe de Transição Presidencial Reagan e a
Casa Branca Reagan (1981-1985), eventualmente subindo para ocupar o cargo de
75º Procurador-Geral dos EUA (1985-1988), cargo do qual renunciou após o
escândalo Wedtech.+
[11]
Bernard H. Siegan (1924-2006) foi professor de direito de longa data na Escola
de Direito da Universidade de San Diego, teórico jurídico libertário e
ex-nomeado juiz federal para o Tribunal de Apelações dos EUA para Novo
Circuito. O New York Times chamou a nomeação de Siegan como uma das
nomeações judiciais mais amargamente disputada na Era Reagan.
[12]
Richard Allen Epstein é estudioso do direito americano conhecido por seus
escritos sobre temas como delitos, contratos, direitos de propriedade, direito
e economia, liberalismo clássico e libertarianismo. Epstein é atualmente Laurence A. Tisch
Professor de Direito e diretor do Classical Liberal Institute da New York
University, Peter e Kirsten Bedford Senior Fellow na Hoover Institution
e James Parker Hall Distinguished Service, Professor emérito de Direito
e conferencista sênior na Universidade de Chicago. Os escritos de Epstein
influenciaram amplamente o pensamento jurídico americano. Em 2000, um estudo publicado no The
Journal of Legal Studies identificou Epstein como o 12º acadêmico jurídico
mais citado do século XX. Em 2008, ele foi escolhido em uma pesquisa feita pela
Legal Affairs como um dos pensadores jurídicos mais influentes dos tempos
modernos. Um estudo de publicações jurídicas entre 2009 e 2013 revelou que
Epstein foi o terceiro estudioso jurídico americano mais citado durante esse
período, atrás apenas de Cass Sunstein e Erwin Chemerinsky. Ele é membro da
Academia Americana de Artes e Ciências desde 1985.
[13]
Randy Evan Barnett é jurista e advogado norte-americano. Atua como professor na
Patrick Hotung de Direito Constitucional na Universidade de Georgetown. onde
ensina Direito Constitucional e Contratos, sendo o Diretor do Centro de
Constituição de Georgetown. As publicações de Barnett incluem onze livros, mais
de cem artigos e resenhas, bem como numerosos op-eds. Seu livro mais
recente é “Uma introdução ao direito constitucional”: 100 casos da Suprema
Corte que todos devem saber] '(2019) (com Josh Blackman). Seus outros livros
sobre a Constituição são Restaurando a Constituição perdida: A Presunção da
Liberdade (2ª ed. 2013), A Estrutura da Liberdade: Justiça e o Estado de
Direito (2ª ed. 2014), Nossa Constituição Republicana: Garantindo a Liberdade e
a Soberania de We the People (2016) e Constitutional Law: Cases in Context (3ª
ed. 2018) (com Josh Blackman). Seus livros sobre contratos são The Oxford Introductions
to US Law: Contracts (2010), Contracts: Cases and Doctrine (6ª ed.
2016) (com Nate Oman).
[14]
A Suprema Corte aceitou o argumento de que a cláusula do devido processo
protegia o direito de contratar sete anos antes em Allgeyer versus Louisiana
(1897). No entanto, a Corte havia reconhecido que o direito não era absoluto,
mas sujeito ao poder de polícia dos Estados. Por exemplo, em Holden versus
Hardy (1898), a Suprema Corte manteve uma lei de Utah estabelecendo um dia de
trabalho de oito horas para os mineiros. Em Holden, o juiz Henry Billings Brown
escreveu que, embora "o poder policial não possa ser apresentado como
desculpa para legislação opressora e injusta, pode ser legalmente utilizado com
o propósito de preservar a saúde, segurança ou moral públicas". A questão
enfrentada pela Suprema Corte em Lochner era se a Lei Bakeshop
representava um exercício razoável do poder de polícia do Estado.
O caso de Lochner foi
defendido por Henry Weismann, que foi um dos principais defensores da Lei Bakeshop
quando era secretário do Sindicato dos Padeiros de Journeymen. Em seu
relatório, Weismann condenou a ideia de que "a liberdade valorizada do
indivíduo, deve ser varrida sob o disfarce do poder de polícia do Estado".
Ele negou o argumento de Nova York de que a Lei Bakeshop era uma medida de
saúde necessária, alegando que "a padaria comum dos dias atuais é bem
ventilada, confortável tanto no verão quanto no inverno, e sempre com um cheiro
doce". O relatório de Weismann continha um apêndice com estatísticas
mostrando que as taxas de mortalidade dos padeiros eram comparáveis às dos
profissionais de colarinho branco.
[15]
Leciona Fredie Didier Jr. que há distinção entre cláusula geral e o conceito
jurídico indeterminado é be sutil, porém, é existente. Pois ambos pertencem ao
gênero conceito vago. No conceito jurídico indeterminado, o legislador não
confere ao juiz a competência para criar o efeito jurídico do fato cuja
hipótese de incidência é composta por termos indeterminados; já na cláusula
geral, além da hipótese de incidência ser composta por termos indeterminados,
ainda é conferida ao magistrado a tarefa de criar o efeito jurídico decorrente
da verificação da ocorrência daquela hipótese normativa.
Rodrigo Mazzei ainda complementa que:
"Havendo identidade quanto à vagueza legislativa intencional, determinando
que o Judiciário faça a devida integração sobre a moldura fixada, a cláusula
geral demandará do julgador mais esforço intelectivo. Isso porque, em tal
espécie legislativa, o magistrado além de preencher o vácuo que corresponde a
uma abstração (indeterminação proposital) no conteúdo na norma; é compelido
também fixar a consequência jurídica correlata e respectiva ao preenchimento
anterior. No conceito jurídico indeterminado, o labor é reduzido, pois, com
mera e simples enunciação abstrata, o juiz após efetuar o preenchimento
valorativo, já estará apto a julgar de acordo com a consequência previamente
estipulada em texto legal. (In: Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes; RACHEL,
Andrea Russar. Como diferenciar a cláusula geral do conceito jurídico
indeterminado? Disponível em: https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/1886442/como-diferenciar-a-clausula-geral-do-conceito-juridico-indeterminado-andrea-russar-rachel Acesso em 11.1.2021).
[16]
Mark Turner é cientista cognitivo, linguista e autor. É professor do Instituto
e professor de ciência cognitiva na Case Western Reserve University. Ele
ganhou um Anneliese Maier Research Prize da Alexander von Humboldt
Foundation (2015) e um Grand Prix da Academia Francesa (1996) por seu
trabalho nessas áreas. Turner e Gilles Auconnier fundaram a teoria da
combinação conceitual, apresentada em livros e enciclopédias. Em Linguística Cognitiva,
Combinação conceitual, também chamada de integração conceitual ou aplicação de visão,
é uma teoria da cognição desenvolvida por Gilles Fauconnier e Mark Turner. De
acordo com essa teoria, elementos e relações vitais de diversos cenários são
"mesclados" em um processo subconsciente, que se supõe onipresente no
pensamento e na linguagem cotidianos. Muito parecido com a memética, é uma
tentativa de criar uma descrição unitária da transmissão cultural de ideias.
[17]
Aduz Marshall, brilhantemente, em sua decisão,
que a Constituição norte-americana teria atribuído à Suprema Corte a
competência originária para analisar todas as causas concernentes a
embaixadores, outros ministros públicos e os cônsules, bem como as ações em que
for parte um Estado. Nas demais causas, teria a Corte competência revisional,
em grau de recurso. Nesse sentido, verificava-se um conflito de normas entre a
Constituição Americana e a Seção 13 do Judiciary Act. O questionamento
que se fazia, por óbvio, era o que deveria prevalecer: a carta magna ou uma lei
federal? John Marshall, em sua decisão, se encarrega de pacificar a questão.
Argumenta Marshall, em apertada síntese, que, na hierarquia das leis, impera a
Constituição dos EUA, estando os tribunais, bem como os demais departamentos,
vinculados a ela. Deste modo, toda lei que contrarie a Constituição deveria ser
declarada nula. Assim, decide Marshall, incidentalmente (incidenter tantum),
pela inconstitucionalidade da Seção 13 do Judiciary Act, no ponto em que
contraria os preceitos da Constituição Americana. Declarou-se a
inconstitucionalidade de uma lei, sem a análise do mérito propriamente dito.
Percebam que Marshall, ao proferir tal decisão não adentrando no mérito, não
profere, em tese, entendimento favorável a nenhum dos dois polos, de modo a não
gerar, para ele, conflitos políticos com os dois partidos. Criou-se, assim, um
novo modelo de controle de constitucionalidade: o controle difuso, que pode ser
entendido, portanto, como aquele que é realizado incidentalmente, num caso
concreto, prejudicando o exame de mérito. In: BOAVENTURA, Thiago Henrique.
Conheça o caso Marbury vs. Madison. Disponível em: https://thiagobo.jusbrasil.com.br/artigos/451428453/conheca-o-caso-marbury-vs-madison Acesso
11.1.2021.
[18]
Duas províncias do Canadá usaram o poder de anulação. Saskatchewan o usou para
forçar funcionários provinciais a trabalhar e permitir que o governo pagasse
para não-católicos frequentarem uma escola católica, e Quebec o usou para
permitir que o governo restringisse a linguagem dos sinais. Nenhum dos usos foi
renovado e, portanto, cada um deles expirou após cinco anos. Saskatchewan e Quebec introduziram uma nova
legislação que invoca a substituição e ainda pode entrar em vigor em outubro de
2019. Quatro jurisdições - Yukon, Alberta, Ontário e New Brunswick -
introduziram projetos de lei que invocaram a anulação, mas nunca entraram em
vigor por vários motivos. Outras províncias e territórios, e o governo federal,
não o usaram.
[19]
Jean Chrétien é estadista canadense. Foi o vigésimo primeiro-ministro do Canadá
de 4.11.1993 a 12.12.2003, sob a bandeira do partido liberal do Canadá. Foi
elemento membro do Parlamento nas eleições federais de 1963, ocupou vários
cargos ministeriais, notadamente nos governos de Lestes B. Pearson e Pierre
Elliott Trudeau, bem como de vice-primeiro ministro do Canadá por alguns meses
em 1984 sob John Turner. Retirou-se desde 2004, Chrétien é conhecido por sua
promoção da unidade canadense e a luta contra a soberania de Quebec.
[20]
O Neoprocessualismo é caracterizado pela aproximação de institutos processuais
aos ditames previstos na Constituição Federal vigente, sendo um relevante
fenômeno manifestado no direito processual pátrio através da Lei 13.105/2015
fruto da busca no estreitamente da efetivação de direitos e garantias
fundamentais dentro do processo. In: LEITE, Gisele. Neoprocessualismo e o
Contraditório. Disponível em: https://www.jornaljurid.com.br/colunas/gisele-leite/o-neoprocessualismo-e-o-contraditorio#:~:text=O%20Neoprocessualismo%20%C3%A9%20caracterizado%20pela,direitos%20e%20garantias%20fundamentais%20dentro
Acesso em 10.1.2021.
[21]
Destaque-se que a constitucionalização dos direitos e garantias processuais não
pode ser tratada como mero fenômeno, pois retira a centralidade do ordenamento
processual e ressalta o caráter publicístico do processo.
[22]
É fato que o STF também se apresenta como Tribunal Constitucional quando afirma
o vinculante efeito de suas decisões, afastando-se de suas tradicionais funções
de Corte Suprema. Enfim, o Tribunal Constitucional, afastando-se da típica
missão do Judiciário, que é aplicar a lei contenciosamente, também produz
provimentos que devem gozar da mesma força vinculante da lei E, novamente, o
Tribunal Constitucional, por estar fora do Poder Judiciário, tem poderes
estranhos ao Poder Judiciário. Cabe recordar que a via processual mais
relevante da Suprema Corte, por ser autêntico órgão de cúpula do Judiciário
adquiriu novos contornos, no que se tem chamado de objetivação do recurso
extraordinário, Tal fenômeno é perceptível na repercussão geral, que fora
introduzida pela Emenda Constitucional 45/2004. Portanto, não é mais a demanda
particular e concreta que importa para o STF quando do julgamento do recurso
extraordinário, mas sim, as características objetivas que são consideradas na
controvérsia dos autos, as quais permitem identificar sua repercussão geral. O
julgamento no extraordinário passa então a ser um provimento geral e abstrato
que repercute nas demais instâncias inferiores em todos os casos concretos
análogos. E, tal repercussão automática já significa um ensaio de efeito
vinculante a ser reconhecido nas decisões proferidas em recurso extraordinário.
In: HORBACH, Carlos Bastide. É preciso definir a função do Supremo Tribunal
Federal. Disponível: https://www.conjur.com.br/2014-mar-22/observatorio-constitucional-preciso-definir-funcao-supremo-tribunalfederal#:~:text=O%20STF%20tamb%C3%A9m%20se%20apresenta,tradicionais%20fun%C3%A7%C3%B5es%20de%20Corte%20Suprema.&text=Mais%20uma%20vez%20aqui%2C%20o,poderes%20estranhos%20ao%20Poder%20Judici%C3%A1rio
. Acesso em 11.1.2021.
[23]
ANA POMPEU – Repórter em Brasília. Cobre Judiciário, em especial o
Supremo Tribunal Federal (STF), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o
Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Passou pelas redações do ConJur, Correio
Braziliense e SBT. Colaborou ainda com Estadão e Congresso em Foco. E-mail: ana.pompeu@jota.info
; HYNDARA FREITAS – Repórter em Brasília. Cobre Judiciário, em especial o
Supremo Tribunal Federal (STF), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o
Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Antes, foi repórter no jornal O Estado de
São Paulo. E-mail: hyndara.freitas@jota.info
[24]
Ementa: Processo civil. Questão de
ordem. Incidente de Recurso Especial Repetitivo. Formulação de pedido de
desistência no Recurso Especial representativo de controvérsia (art. 543-C, §
1º, do CPC). Indeferimento do pedido de desistência recursal. - É inviável o
acolhimento de pedido de desistência recursal formulado quando já iniciado o
procedimento de julgamento do Recurso Especial representativo da controvérsia,
na forma do art. 543-C do CPC c/c Resolução n.º 08/08 do STJ. Questão de ordem
acolhida para indeferir o pedido de desistência formulado em Recurso Especial
processado na forma do art. 543-C do CPC c/c Resolução n.º 08/08 do STJ.
Decisão: Vistos, relatados
e discutidos estes autos, acordam os Ministros da CORTE ESPECIAL do Superior
Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas
constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr.
Ministro Nilson Naves indeferindo o pedido de desistência, no que foi
acompanhado pelos Srs. Ministros Ari Pargendler e Hamilton Carvalhido, e as
retificações de voto da Sra. Ministra Relatora e do Sr. Ministro Luiz Fux para
aderir ao voto do Sr. Ministro Nilson Naves, e os votos dos Srs. Ministros
Aldir Passarinho Junior, Eliana Calmon e Francisco Falcão acompanhando a posição
originária da Sra. Ministra Relatora, por maioria, indeferir o pedido de
desistência. Vencido o Sr. Ministro João Otávio de Noronha e vencidos, em
parte, os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Eliana Calmon, Francisco
Falcão e Laurita Vaz. Os Srs. Ministros Luiz Fux, Nilson Naves, Ari Pargendler
e Hamilton Carvalhido votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausentes,
justificadamente, os Srs. Ministros Gilson Dipp e Paulo Gallotti e,
ocasionalmente, os Srs. Ministros Fernando Gonçalves e Felix Fischer.
Declarou-se habilitada a votar a Sra. Ministra Eliana Calmon. Não participaram
do julgamento os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Castro Meira e Arnaldo
Esteves Lima. Data: 12.12.2208.
[25]
Ementa: CIVIL E CONSUMIDOR. INTERNET. RELAÇÃO DE CONSUMO. INCIDÊNCIA DO CDC.
GRATUIDADE DO SERVIÇO. INDIFERENÇA. PROVEDOR DE CONTEÚDO. FISCALIZAÇÃO PRÉVIA
DO TEOR DAS INFORMAÇÕES POSTADAS NO SITE PELOS USUÁRIOS. DESNECESSIDADE.
MENSAGEM DE CONTEÚDO OFENSIVO. DANO MORAL. RISCO INERENTE AO NEGÓCIO.
INEXISTÊNCIA. CIÊNCIA DA EXISTÊNCIA DE CONTEÚDO ILÍCITO. RETIRADA IMEDIATA DO
AR. DEVER. DISPONIBILIZAÇÃO DE MEIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DE CADA USUÁRIO. DEVER.
REGISTRO DO NÚMERO DE IP. SUFICIÊNCIA.
A exploração comercial da
internet sujeita as relações de consumo daí advindas à Lei nº 8.078/90.
O fato de o serviço
prestado pelo provedor de serviço de internet ser gratuito não desvirtua a
relação de consumo, pois o termo mediante remuneração, contido no art. 3º, §
2º, do CDC, deve ser interpretado de forma ampla, de modo a incluir o ganho
indireto do fornecedor. A fiscalização prévia, pelo provedor de conteúdo, do
teor das informações postadas na web por cada usuário não é atividade
intrínseca ao serviço prestado, de modo que não se pode reputar defeituoso, nos
termos do art. 14 do CDC, o site que não examina e filtra os dados e imagens
nele inseridos. O dano moral decorrente de mensagens com conteúdo ofensivo
inseridas no site pelo usuário não constitui risco inerente à atividade dos
provedores de conteúdo, de modo que não se lhes aplica a responsabilidade
objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do CC/02. Ao ser comunicado de
que determinado texto ou imagem possui conteúdo ilícito, deve o provedor agir
de forma enérgica, retirando o material do ar imediatamente, sob pena de responder
solidariamente com o autor direto do dano, em virtude da omissão praticada. Ao
oferecer um serviço por meio do qual se possibilita que os usuários externem
livremente sua opinião, deve o provedor de conteúdo ter o cuidado de propiciar
meios para que se possa identificar cada um desses usuários, coibindo o
anonimato e atribuindo a cada manifestação uma autoria certa e determinada. Sob
a ótica da diligência média que se espera do provedor, deve este adotar as
providências que, conforme as circunstâncias específicas de cada caso,
estiverem ao seu alcance para a individualização dos usuários do site, sob pena
de responsabilização subjetiva por culpa in omittendo. A iniciativa do
provedor de conteúdo de manter em site que hospeda rede social virtual um canal
para denúncias é louvável e condiz com a postura esperada na prestação desse
tipo de serviço – de manter meios que possibilitem a identificação de cada
usuário (e de eventuais abusos por ele praticado) – mas a mera disponibilização
da ferramenta não é suficiente. É crucial que haja a efetiva adoção de
providências tendentes a apurar e resolver as reclamações formuladas, mantendo
o denunciante informado das medidas tomadas, sob pena de se criar apenas uma
falsa sensação de segurança e controle. Recurso especial não provido.
[26]
CPC 2015 Art. 79. Responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como
autor, réu ou interveniente. Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele
que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir
objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do
processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do
processo; VI - provocar incidente manifestamente infundado; VII - interpuser
recurso com intuito manifestamente protelatório.
Art. 81. De ofício ou a
requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá
ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da
causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar
com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. § 1º Quando
forem 2 (dois) ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na
proporção de seu respectivo interesse na causa ou solidariamente aqueles que se
coligaram para lesar a parte contrária.
§ 2º Quando o valor da
causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até 10 (dez)
vezes o valor do salário-mínimo.
§ 3º O valor da indenização
será fixado pelo juiz ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado por
arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos.
Quando o assunto é
litigância de má-fé, o Superior Tribunal de Justiça tem diversos entendimentos
que delimitam as punições possíveis nos casos em que ocorre o abuso do direito
de recorrer ou quando uma das partes do processo litiga intencionalmente com
deslealdade.
O Código de Processo Civil
de 2015 (CPC/2015), em seus artigos 79, 80 e 81, estabelece a configuração da
litigância de má-fé e as sanções que podem ser aplicadas para quem age de
maneira desleal. A prática da litigância de má-fé e as punições possíveis, de
acordo com o que prevê a legislação, têm despertado várias discussões no STJ e,
por vezes, críticas ao sistema recursal. Para o ministro Og Fernandes, faltam
sanções efetivas para impedir a sucessão indefinida de recursos nas cortes do
país.
[27]
Vide em http://neryadvogados.com.br/blog/wp-content/uploads/2013/12/Georges-Abboud-Direitos-Fundamentais-RT-907.pdf
ou https://www.academia.edu/20309804/O_MITO_DA_SUPREMACIA_DO_INTERESSE_PU_BLICO_SOBRE_O_PRIVADO_A_DIMENSA_O_CONSTITUCIONAL_DOS_DIREITOS_FUNDAMENTAIS_E_OS_REQUISITOS_NECESSA_RIOS_PARA_SE_AUTORIZAR_RESTRIC_A_O_A_DIREITOS_FUNDAMENTAIS
[28]
A duração razoável do processo, consagrada como princípio constitucional, não
pode ser um mero ornamento no texto da Constituição. É preciso que nós
efetivamente concretizemos esse princípio, e aqui temos um instrumento eficaz,
um instrumento idôneo para a concretização das teses e, consequentemente, para
a diminuição do tempo do processo." A afirmação foi feita pelo presidente
do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ministro João Otávio de Noronha, nesta
terça-feira (29.10.2019), ao abrir o seminário Recursos Repetitivos nos 30 anos
do STJ, no auditório do tribunal. In Notícias STJ. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Duracao-razoavel-do-processo-nao-pode-ser-mero-ornamento-do-texto-constitucional--diz-presidente-do-STJ.aspx Acesso em 11.1.2021.
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