Estado
de sítio e, outros estados de exceção: abordagem comparativa e explicativa.
Autores:
Gisele Leite
Ramiro
Luiz Pereira da Cruz.
Resumo:
O texto pretendeu situar historicamente e constitucionalmente o estado de
sítio, estado de defesa e estado de calamidade pública. Elucidando não só o
ritual procedimental, mas esmiuçando as causas autorizativas que são taxativas.
Também abordou a atual crise sanitária produzida pela pandemia de Covid-19 que
impôs medidas restritivas e, até lockdown, mas, não se confundem com o
estado de sítio nem o estado de defesa.
Palavras-Chave:
Estado de Exceção. Estado de Sítio. Estado de Defesa. Pandemia de Covid-19.
Medidas restritivas. Medidas Sanitárias.
Abstract:
This
text intends to both historically and constitutionally situate state of siege,
state of defense and state of public calamity clarifying not only procedural
rites, but scrutinizing authorizing causes which are exhaustive. It has also
dealt with the actual sanitary crisis due to Covid 19 pandemy which demanded
restrictive measures even the lockdown, but they do not have to do with neither the state of siege
nor with the state of defense.
Keywords:
State of exception. State of Siege. State of defende. Covid 19 pandemy.
Restrictive measures. Sanitary measures.
Introdução
Os estados de exceção e concentração de
poderes eram conhecidos dos hebreus, cartagineses, gauleses e gregos. Havendo o
precedente do Direito Romano com a ditadura consular e o iustititum
(suspensão do Direito) proclamado quando o Senado editava um senatus
consultum ultimum, em situação de emergência, em Roma, provocada por guerra
externa, insurreição ou guerra civil ou tumultus.
Em
1714, no Reino Unido, o Riot Act[1]
incriminava a participação em tumultos com desobediência às ordens de
dissolução por parte de autoridades e eram isentas de responsabilidade as
autoridades encarregadas de restabelecer a ordem.
Já
em 1791, em França, decreto de Assembleia Constituinte previu a possibilidade
de suspensão temporária e localizada de determinados direitos em circunstâncias
de crise grave[2].
Porém, a previsão em sede constitucional ocorreu com a Constituição Francesa de
1799, que estabelecia a possibilidade de suspensão da Constituição, por meio de
lei, em caso de revolta armada ou de agitações que ameaçasse a segurança do
Estado e com a Carta de 1814[3], onde aliás, apareceu pela
primeira vez a expressão "estado de sítio".
Já, em nosso país, excetuando todas as vezes em
que se anulou o próprio Estado de Direito, houve várias decretações formais de
estado de exceção, tais como a de 25.9.1893 (quando foi decretado estado de
sítio em quatro Estados e no Distrito Federal), em 1914 (Hermes da Fonseca, que
solicitou o estado de sítio para o Rio de Janeiro). Noutra ocasião, ocorreu
previsão em 1967[4],
mas nenhuma decretação desde 1988.
Progressivamente,
a causa do estado de sítio (dos estados de exceção, em geral) ultrapassou e
descolou-se das situações de guerra e conflitos armados, para abranger
inclusive as crises econômicas.
O
estado de sítio, o estado de emergência e o estado de calamidade pública[5] são espécies do gênero
estado de exceção que de acordo com doutrina é conceituado como medida
extraordinária e excepcional à legalidade, sendo autorizado pelo ordenamento
constitucional mediante as situações emergenciais.
Todavia,
sua utilização, segundo as Constituições modernas, pelo poder constituído tem
demonstrado funcionar propriamente mais como regra do que exceção.
O
estado de sítio é instrumento que pode ser utilizado pelo Presidente da
República em casos de: comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de
fatos que comprovem a ineficácia da medida tomada durante o estado de defesa;
declaração de estado de guerra, ou ainda, resposta à agressão armada
estrangeira.
A
decretação do estado de sítio é solicitada pelo Presidente da República ao
Congresso Nacional, ouvidos o Conselho da República[6] e o Conselho de Defesa
Nacional[7]. Vide artigos 137 a 139 da
Constituição Federal de 1988.
Com
a pandemia de COVID-19 ou coronavírus, deu-se a decretação do estado de
calamidade pública por parte do Governo Federal. Desde de 18 de março de 2020,
foi aprovada a lei pela Câmara dos Deputados. Não é inédito o estado de calamidade
pública.
Anteriormente,
em 2016, em junho no Rio de Janeiro foi feito idêntico decreto pelas
dificuldades de realizar os Jogos Olímpicos.
O mesmo já ocorreu no Rio Grande do Sul que em novembro daquele mesmo
ano, tomou a medida para conter o déficit nas contas públicas estaduais.
Tais decretos permitem que secretários e dirigentes da Administração Pública
estadual adotem medidas excepcionais necessárias à racionalização de todos os
serviços públicos. Entre tais medidas está o home office ou teletrabalho[8].
O
estado de calamidade pública[9] é uma situação anormal, em
que a capacidade de ação do Poder Público municipal ou estadual fica seriamente
comprometida. Essa situação é fruto de um desastre e não importa se causado
pela natureza ou por outros motivos econômicos, sociais e, etc. E, nessas
situações, o Governo Federal deve intervir para auxiliar o ente a superar a
referida situação.
O
estado de calamidade pública é decretado por governantes em situações
reconhecidamente anormais, decorrentes de desastres (naturais ou provocados) e
que causam danos graves à comunidade, inclusive ameaçando a vida dessa
população. É preciso haver pelo menos dois entre três tipos de danos para se
caracterizar a calamidade: danos humanos, materiais ou ambientais.
Atualmente,
quem exatamente pode decretar esse estado? No Brasil, essa é uma prerrogativa
reservada para as esferas estadual e municipal. Ou seja, governadores e
prefeitos podem decretar uma calamidade pública. Questiona-se o porquê o presidente, não tem
esse instrumento à disposição? É porque na esfera federal, podem ser decretados
apenas os chamados estados de exceção. De dois tipos: o estado de defesa e o
estado de sítio – que é o mais grave.
Além
do estado de calamidade pública, também é comum ouvirmos que algum município
brasileiro decretou estado de emergência. De fato, esse é outro estado de
exceção que pode ser decretado por governadores e prefeitos – e o nomen
usado na lei é situação de emergência.
Mas,
qual seria a diferença entre emergência e calamidade? Segundo a lei, trata-se
de uma questão de intensidade, pois a calamidade pública é decretada apenas nos
casos mais graves, quando a capacidade do poder público agir resta seriamente
comprometida.
Ou
seja, o Estado ou município não conseguem resolver o problema por conta própria
e precisam da ajuda do governo federal. É o estado que requer mais atenção e
cuidado.
Já,
a situação de emergência refere-se aos danos menores, que comprometem
parcialmente a capacidade de resposta do poder público, ou seja, menos graves
que aqueles de uma calamidade pública. Nessa situação, eles também dependem de
ajuda do Governo Federal, mas em um grau menor. Evidentemente, não é fácil
definir essa diferença de intensidade, e isso acaba dependendo da visão do
governante a respeito de cada caso.
A
Câmara Legislativa (CLDF) aprovou, em sessão extraordinária remota nesta terça
(15.12.2020), a prorrogação do estado de calamidade pública no Distrito Federal
até 30 de junho de 2021. O pedido foi feito pelo governador Ibaneis Rocha ao
poder legislativo em decorrência da pandemia do novo coronavírus no DF.
O
texto prolonga os efeitos do Decreto Legislativo nº 2.284, de 2020, que
reconhecia o estado de calamidade pública[10] até o próximo dia 31. Com
isso, o Executivo fica desobrigado de cumprir metas da Lei de Responsabilidade
Fiscal (LRF), podendo orientar recursos e investimentos para o combate à
pandemia, além de poder solicitar recursos a nível federal, como o Fundo
Nacional para Calamidades Públicas[11], Proteção e Defesa Civil.
Estado
de sítio, enfim, é o instrumento utilizado pelo Chefe de Estado em que se
suspende temporariamente os direitos e as garantias dos cidadãos e os Poderes
Legislativo e Judiciário ficam submetidos ao Executivo, tendo em vista a defesa
da ordem pública.
No
Brasil, para decretar o estado de sítio, o chefe de Estado, após o devido
respaldo do Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional que
oferecerão parecer não vinculativo, onde solicita uma autorização do Congresso
Nacional para efetivar o decreto.
A
práxis cotidiana do estado de exceção, em face de fatos históricos serve
para assinalar o como se deu o estado de exceção no país desde a Primeira
República até os presentes dias.
Logo
após a Proclamação da República, o enfermo Marechal Deodoro da Fonseca[12], em 1889, vivíamos sob o
prenúncio da instauração de novo regime político, pois deixaríamos de ser
autocrático para se tornar democrático. Porém, o regime era orquestrado por uma
elite econômica rural e, com o apoio de grande parte da oficialidade do
Exército e, sem a participação do povo.
E,
assim, se institui o governo provisório com os objetivos de consolidar o novo
regime e institucionalizá-lo com a aprovação de uma Constituição e criar as
formas administrativas do Estado que se faziam necessárias.
Em
1891 quando, finalmente, a Constituição republicana fora promulgada, trazendo
já os modernos direitos fundamentais e, logo em seguida, os institutos
jurídicos de exceção. Já se observava que a tendência de estado de sítio era introduzida
nos ordenamentos jurídicos espanhol e francês.
Nessa
época, o texto constitucional já conferia à competência ao Congresso Nacional
para sua declaração, exceto na hipótese de as câmaras não estarem reunidas e na
iminência de perigo à pátria (quando poderia ser exercido pelo Executivo
federal).
O
estado de sítio prevê sua aplicação somente em casos de agressão estrangeira ou
ameaça interna ou insurreição por tempo determinado.
As
medidas de exceção[13] consentidas impunham
restrições às liberdades e garantais individuais tal como na tradição europeia.
O estado de sítio, portanto, não previa a restrição à liberdade de imprensa ou
à inviolabilidade de domicílio, como na França, mas sim, apenas a aplicação
pelo Executivo de medidas repressivas de detenção e desterros de pessoas.
Tais
medidas extraordinárias de restrição à liberdade não poderiam ser confundidas
com penas, pois a sua legitimidade cessava naturalmente com a restauração das
garantias. Porém, como regra, os governos da Primeira República brasileira
enfrentaram as contestações sociais por meio exatamente do estado de sítio, o
que denotou abuso no manejo do instituto.
A
pesquisa no Senado brasileiro aponta que na República Velha (1889-1930)
governou-se por 2.365 dias em estado de sítio, que assinala certa tendência
cultural e política ao estado de exceção.
O
cômputo total de dias de estado de sítio, na república brasileira, a saber: no governo de Floriano Peixoto houve o estado
de sítio que vigorou por 295 dias, no de Prudente de Morais, por 104 dias; no
de Rodrigues Alves por 121 dias; no Hermes da Fonseca[14] por 268 dias, no de
Wenceslau Braz por 71 dias, no de Epitácio Pessoa por 132 dias, no de
Washington Luís por 87 dias e no de Arthur Bernardes[15] por 1.287 dias e,
governou em estado de normalidade por apenas menos de dois meses, dentro de mandato
presidencial de quatro anos.
O
estado de sítio, num panorama histórico-jurídico, se apresenta como forma de
regulamentação constitucional de estado de exceção. Para alguns doutrinadores,
o estado de exceção vem se transformando em paradigma permanente no governo do
Estado moderno.
E,
reconstruindo a origem dos institutos normativos que regulamentam a exceção
constitucionalmente, para inserir o debate no contexto de cada tradição
constitucional vigente.
A
Constituição brasileira de 1891 representa o momento inaugural do estado de
sítio, decretando o começo da regulação do estado de exceção em nosso país.
A
Constituição Imperial, por sua vez, apesar de abrir provisões emergenciais, mas
não delimitou de forma precisa os procedimentos[16], conforme o fez a
primeira Constituição republicana com o estado de sítio, de forma que esta pode
ser considerada do ponto de partida da regulamentação constitucional da
exceção.
Observando
a jurisprudência do STF e a prática normativa do estado de sítio no período
entre 1891 a 1930, delimitando-se pela promulgação da primeira Constituição
republicana e, o fim pela ascensão do governo provisório de Getúlio Vargas, com
a Revolução de 1930, que revogou a Constituição de 1891 por meio da criação da
Constituição de 1934, que inaugurou nova etapa histórica, com reverberação
jurídica-constitucional.
Como
é sabido, repriso, o estado de sítio corresponde a uma das espécies de
regulamentação de estado de exceção, igualmente considerado como forma de
ditadura constitucional.
Enfim,
a função do estado de exceção é permitir meios excepcionais para se afastarem
determinados perigos sérios à ordem pública, segurança ou existência do Estado
que não possam ser afastados pelos trâmites normais previstos pela
Constituição.
Portanto,
o estado de sítio é uma forma pela qual uma Constituição regulamenta o
exercício de poderes excepcionais em meio a uma emergência para proteger o
Estado, a ordem ou a segurança pública.
A
forma do estado de sítio difere de outras formas de exceção, posto que possa
ser declarada explicitação pelo Legislativo, ou outro dos poderes do governo e,
principalmente pretende a suspensão temporária de certas garantias ou direitos
fundamentais especificamente estabelecidos.
A
expressão "estado de sítio" advém da literal tradução do instituto
francês etat de siége[17],
criado por decreto na Assembleia Nacional em 1791, para situações de ameaça
militar, mas que logo se expandiu ao longo do tempo para fora do contexto
bélico, para ser usado como medida extraordinária de polícia diante as desordens internas,
transformando-se, de efetivo ou militar em fictício ou político.
Surgiu
no Brasil, pela primeira vez, através da Constituição da República de 1891 e,
onde se estabeleceu claro regramento de competência. Incialmente, era privativo
do Congresso Nacional. Porém, previa-se a excepcional hipótese de ser decretado
o estado de sítio pelo Poder Executivo, apenas quando na ausência do Congresso
Nacional, relatar e motivar as medidas de exceção tomadas pelo Executivo. As
autoridades que ordenavam tais medidas podiam ser devidamente responsabilizadas
por abusos cometidos nessas medidas.
A
situação que ensejava o sítio era a emergente agressão por forças estrangeiras
ou de comoção interna, assim ficava a cargo do órgão declarante, ou seja, o
Congresso Nacional ou, subsidiariamente o Executivo.
No
entanto, a interpretação da expressão "comoção interna" é vaga. E,
tal brecha semântica está alinhada com o fito de regulamentar a exceção. Sendo
muito difícil prever com exatidão, qual tipo de emergência seria capaz de desafiar
os meios constitucionalmente previstos para a defesa da própria Constituição.
Deste
modo, a agressão estrangeira e comoção interna se configuram com situações
fáticas capazes de ensejar o efeito da declaração do estado de sítio, com seus
respectivos efeitos jurídicos.
São
os efeitos da declaração de estado de sítio segundo a Constituição brasileira
de 1891, a saber: Competência do Congresso Nacional para determinar a suspensão
de quaisquer garantias por tempo determinado, a competência excepcional do Executivo
para impor detenção em lugar não destinado aos réus de crimes comuns e, para
impor desterro a outros sítios do território nacional.
Mais
tarde, a Emenda Constituição nº3 de 1926 adicionou mais um efeito, pela
inclusão de um parágrafo ao artigo 60 da Constituição brasileira de 1891, qual
seja, a proibição colocada ao Judiciário de conhecer de ações motivadas pelos
atos praticados pelo Legislativo e Executivo em face do estado de sítio.
As
demais constituições brasileiras mantiveram alguma regulamentação sob a forma e
o nomen de estado de sítio, exceto a Constituição brasileira de 1937,
que previa os institutos do estado de emergência e do estado de guerra,
diferenciados do de sítio ,sobretudo, pela competência exclusiva do Presidente
da República, independente de autorização do Legislativo e, não podendo o
Congresso suspender o estado de emergência.
Nas
Constituições de 1934 e a de 1946, a previsão de regulamentação do estado de
sítio manteve-se muito parecida com àquela da primeira Constituição
republicana.
Convém
adendar que o STF jamais chegou a decidir a respeito do estado de emergência
sob a égide da Constituição brasileira de 1937. E, este texto constitucional
previa a impossibilidade aos juízes e tribunais de conhecerem de atos
praticados em virtude do estado de emergência enquanto este estivesse em vigor
(artigo 170, Constituição de 1937).
Provavelmente,
houve apenas um ano entre o fim da emergência e a nova Constituição e, nenhuma
demanda envolvendo o dispositivo da emergência chegou ao STF.
Deste
viés, ao longo das Constituições que disciplinavam o estado de sítio, coube ao
Supremo Tribunal dirimir as questões jurídicas que envolviam o estado de sítio.
Nota-se
que a primeira Constituição republicana brasileira teve efeitos significativos
na tradição constitucional, dentro da temática do estado de sítio, o que afetou
sensivelmente as Constituições seguintes.
Em
1892, a regulamentação do estado de sítio fora colocada em debate pela primeira
vez. Na época, o Executivo estava sob o comando do então vice-presidente
Marechal Floriano Peixoto, o famoso Marechal de Ferro, que havia declarado o
Distrito Federal em estado de sítio, através do Decreto 791, de 10 de abril de
1892, como uma resposta à Revolta Armada[18], rebelião causada por
motins militares da Marinha que tomaram os navios de guerra e, ainda, exigiam a
saída de Floriano Peixoto da presidência, com a consequente convocação de novas
eleições (vez que Hermes da Fonseca havia renunciado ao cargo de Presidente, e
então, Floriano assumiu como vice, sem convocar novas eleições).
A
controvérsia havia sido agravada pelo Manifesto dos Treze Generais[19], documento assinado por
oficiais militares de diversas partes do país, que contestavam a continuidade
de Floriano na Presidência, entendo que cabiam novas eleições, haja visto o
art. 42 da Constituição de 1891, o qual
estabelece: “Se no caso de vaga, por qualquer causa, da Presidência ou
Vice-Presidência, não houverem ainda decorrido dois anos do período
presidencial, proceder-se-á a nova eleição”.
Restou
configurada a situação de comoção interna já prevista no bojo do texto
constitucional vigente da época. E, assim, o Marechal Floriano editou o
decreto, in litteris: Declara em estado de sitio o Distrito Federal e
suspende as garantias por 72 horas.
O
Vice-Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, considerando: que
foi commettido o crime de sedição, sahindo cidadãos a depor o Chefe do
Governo Federal; que intentou-se
revoltar contra as instituições nacionaes a força armada mantida para a defesa
e garantia dessas mesmas instituições; que entre os autores e promotores da
sedição se acham membros do Congresso Nacional,
que gosam de immunidades por lei prescriptas; que o crime commettido
produziu grave commoção intestina (art. 48 n. 15 e art. 80 § 1º da Constituição
Federal); que é principal dever do Poder Executivo assegurar a ordem e a
manutenção das instituições nacionaes;
Resolve, usando das attribuições conferidas pelos citados artigos,
Decreta:
Artigo unico. É declarado em estado do
[sic] sitio o Districto Federal e suspensas as garantias constitucionaes, por
72 horas. O Ministro de Estado dos Negocios do Interior o faça executar.
Assim,
com tal declaração de sítio, Floriano Peixoto determinou a detenção e desterro
de várias pessoas, tidas como envolvidas na Revolta e mantendo os detidos
presos em fortalezas.
Na
ocasião, o advogado Ruy Barbosa[20] assumiu a defesa de
vários entre os afetados pelas medidas, ingressando com várias petições de Habeas
Corpus perante o STF, tendo os detidos como pacientes.
Convém
destacar os HC números 300, 406, 410 e 415 quando Ruy Barbosa questionou
juridicamente as medidas tomadas pelo Executivo, provocando o Judiciário a
decidir a respeito da interpretação das normas constitucionais vigentes que
disciplinavam o estado de sítio.
Com o trâmite dos processos, Ruy
Barbosa veio a patrocinar ações civis em favor dos reformados e demitidos pelo
governo e contra o Decreto de 12 de abril de 1892, editado em meio ao estado de
sítio e reconhecido como retaliação governamental contra quem julgava serem os
envolvidos na Revolta[21].
O primeiro Habeas Corpus, de
nº 300, foi julgado em 30 de abril de 1892. No acórdão, o relator toma posição
sobre uma série de questões que se colocavam à interpretação pelo tribunal. De
início, deve notar-se que, nesse acórdão, o Supremo Tribunal Federal decidiu
qual era a natureza das medidas que podiam ser tomadas pelo Presidente durante
o estado de sítio (detenção em local distinto dos réus de crimes comuns e
desterro):
“Considerando que durante o estado de sítio é autorizado o Presidente da
República a impor, como medida de repressão, a detenção em lugar não destinado
aos réus de crimes comuns e o desterro para outros sítios do território
nacional;
Considerando que estas medidas não revestem o caráter de pena, que o
Presidente da República em caso algum
poderá impor, visto não lhe ter sido conferida a atribuição de julgar, mas são
medidas de segurança, de natureza
transitória, enquanto os acusados não são submetidos aos seus juízes naturais
nos termos do art. 72, § 15º da
Constituição”.
Desta forma, enquadrou-se a detenção
prevista no estado de sítio como medida de segurança, uma vez que a imposição
de pena requeria formalidades e garantias legais que não eram concedidas na
situação de estado de sítio.
O que deu azo a maior polêmica na
jurisprudência do STF seria a chamada Doutrina da Questão Política. Pois,
interpretava as faculdades conferidas ao Presidente da República durante do
estado de sítio, e o relator do acórdão considerou-as como sendo
discricionárias do Presidente da República que se torna responsável nesta declaração
e também pelos eventuais abusos cometidos durante o estado de sítio.
Quanto à discricionariedade, é fato
que jamais se questionou constitucionalmente o instituto e, foi necessário,
certo grau de discricionariedade à atribuição de qualquer funcionário público,
em face do que este atue sempre dentro do quadro normativo, criando e aplicando
normas.
No entanto, o STF decidiu que essa discricionariedade
implicava que as questões surgidas do uso das faculdades do Executivo no estado
de sítio não podiam ser resolvidas pelo Judiciário, posto que dependiam sempre
de um juízo político prévio.
Desta forma, o HC 300 considerava a
avaliação das medidas de sítio do Executivo pelo Congresso Nacional, como juízo
político que impedia um juízo jurídico[22].
Tendo em mira que o exercício de tal
extraordinária faculdade, a Constituição confiou ao critério e prudente
discrição do Presidente da República, sendo responsável por ela, pelas medidas
de exceção que tomar, e, principalmente, pelos abusos que foram cometidos.
Em tempo, previa o artigo 80,
parágrafo terceiro combinado com o artigo 43, parágrafo 21º da Constituição da
época, ao Congresso compete privativamente aprovar ou reprovar o estado de
sítio declarado pelo Presidente da República, bem como realizar o exame das
medidas excepcionais, que ele houver tomado, as quais para esse fim lhe serão relatadas com
especificação dos motivos em que se fundam;
Considerando, portanto, que, antes do
juízo político do Congresso, não pode o Poder Judicial apreciar o uso que fez o
Presidente da República daquela atribuição constitucional, e que, também, não é
da índole do Supremo Tribunal Federal envolver-se nas funções políticas do
Poder Executivo ou Legislativo;
Considerando que, ainda quando na
situação criada pelo estado de sítio, estejam ou possam estar envolvidos alguns direitos individuais, esta
circunstância não habilita o Poder Judicial a intervir para nulificar as medidas de segurança decretadas pelo
Presidente da República, visto ser impossível isolar esses direitos da questão política, que os envolve e compreende,
salvo se unicamente tratar-se de punir os abusos dos agentes subalternos na execução das mesmas medidas,
porque a esses agentes não se estende a necessidade do voto político do Congresso.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal
Federal buscava excluir as decisões jurídicas sobre o estado de sítio de sua competência,
por tratar-se de uma suposta questão política. Tal jurisprudência encontraria
um forte contraponto na arguição que Ruy Barbosa faria nas ações civis dos
reformados e demitidos pelos decretos de 7 e 12 de abril de 1892.
Sobre o tema, Ruy Barbosa deixa claro
que a previsão de um juízo político não impede que ocorra também um juízo
jurídico-constitucional. Explicando a questão política, o autor apresenta duas
acepções para a expressão “questão política”: uma acepção ampla, que acabaria
abrangendo toda a soberania constitucional, e uma acepção restrita, em que a
questão política o é “pela natureza do assunto, pela forma que a controvérsia
assumir, pelos termos em que a
resolverem”.
Muito brevemente, questões políticas
no sentido estrito, esclarece Barbosa, é a que versa sobre a conveniência[23] ou oportunidade de exercitar os
poderes que a constituição confere a um determinado cargo.
Entretanto, quando a questão é se o
ato praticado pelo detentor de um cargo público estava dentro das competências
e faculdades que a lei prescreve ao cargo, a questão será jurídica, pois não
diz respeito a conveniência ou oportunidade (onde a autoridade tem seu poder discricionário), mas diz respeito justamente à
ausência de um tal poder discricionário à autoridade.
Percebe-se que surge a fundamentação
do Habeas Corpus 300 pela “Doutrina da Questão Política”[24], na medida em que exige o juízo
político do Congresso como condição para realizar juízos jurídicos sobre a
competência e alcance constitucional de medidas do Executivo, apresenta grave
falha. Confunde os dois tipos de juízo, pois o Congresso não pode aprovar o uso
feito pelo Presidente de uma determinada competência, se o Presidente não a
tem.
Não se trata de uma mesma avaliação,
que caiba ao Judiciário ou ao Legislativo, mas de duas avaliações distintas. O
juízo político coloca a pergunta: O Presidente usou de maneira oportuna e
conveniente os poderes de sítio a ele conferidos? O juízo jurídico
(constitucional, no caso) coloca a pergunta: “As medidas que o Presidente
ordenou estão incluídas nos poderes de sítio a ele conferidos”?
O juízo jurídico, portanto, é
técnico, dependendo da interpretação adequada do texto constitucional. Essa
interpretação jurídica demanda um saber técnico, que só é adquirido às custas
do estudo dedicado do Direito.
Deste modo, diferem fundamentalmente
os juízos político e jurídico. O juízo político pode ser exercido por qualquer
representante, independente do conhecimento deste acerca do Direito, porque é
um juízo de conveniência. O juízo jurídico, diferentemente, só pode ser
exercido por um juiz competente, que tenha o conhecimento do Direito para poder
delimitar, por meio da interpretação constitucional, o quadro normativo das
medidas permitidas, de maneira clara e fundamentada.
Assim, inaugurou-se nesse acórdão do
HC 300 uma restrição indevida do acesso ao tribunal, por meio da afirmação
dessa doutrina da questão política, que
acabou por impedir o pleno exercício da jurisdição constitucional sobre os
abusos cometidos no estado de sítio, ao
submeter o exercício desta a uma decisão do Congresso que não era jurídica, mas
sim política. Na prática, a
jurisprudência do STF deixava o direito individual dos cidadãos na dependência
de uma decisão de conveniência do Congresso, que nada tinha de
técnico-jurídica.
Desta forma, inaugurou-se nesse
acórdão do HC 300 uma restrição indevida do acesso ao tribunal, por meio da
afirmação dessa doutrina da questão
política, que acabou por impedir o pleno exercício da jurisdição constitucional
sobre os abusos cometidos no estado de
sítio, ao submeter o exercício desta a uma decisão do Congresso que não era
jurídica, mas sim política.
Na prática, a jurisprudência do STF
deixava o direito individual dos cidadãos na dependência de uma decisão de
conveniência do Congresso, que nada tinha de técnico-jurídica.
A outra questão que se distingue no
acórdão do HC300 é acerca da duração das medidas tomadas durante o estado de
sítio. O tribunal decidiu que as medidas tomadas na duração do estado de sítio
não devem cessar automaticamente com o fim do estado de sítio, mas que se
prolongam além desta cessação, pelo menos até o acusado ser submetido ao
tribunal competente.
A questão voltaria a ser confrontada
na jurisprudência futura do tribunal, visto que tal interpretação tem
dificuldades muito mais profundas de fundamentação.
Em primeiro lugar, há um problema de
coerência entre dois pontos da decisão: por um lado, o STF reconhece que a
detenção determinada pelo Presidente da República não tem o caráter de uma pena criminal,
enquanto por outro lado, implica que essa medida, sem caráter penal, se torne uma prisão preventiva, como se o detido
necessariamente devesse tornar-se réu de ação penal (o que o tribunal dá a entender ao usar o termo
“acusado” para referir-se ao paciente).
Se soma a isso a doutrina da questão
política, impedindo o Habeas Corpus ao STF, o que resulta na
interpretação da medida de detenção no sítio em um sentido tal que cria um instituto jurídico
em que o detido tem sua liberdade de locomoção restrita, mas sem que isto
implique o caráter de pena, aguardando um julgamento, sendo que foi detido não
por um crime propriamente dito, mas por
decisão discricionária do Presidente da República, e que depende de uma decisão
política do Congresso para poder ser
julgado e ter acesso a garantia fundamental do Habeas Corpus.
Desenvolvimento
E, essa situação já com a ordem
constitucional restaurada à normalidade, vez que cessada a situação que levou a
repressão. Tal interpretação deixou o direito individual fundamental do detido
no sítio totalmente dependente de juízos políticos.
Ou seja, se o Presidente da República
julgasse conveniente, mandava deter (o que implica, por conseguinte, em uma
acusação criminal, a julgar pela terminologia adotada pelo STF) e, se o
Congresso não se manifestasse,
continuaria detido indefinidamente, ainda que sem pena alguma, até o Congresso
decidir a conveniência dos atos do
Presidente durante o sítio.
Ponto de fundamentação mais breve,
mas que veio a causar grande efeito nas discussões seguintes do STF sobre
estado de sítio, dizia respeito à duração das medidas tomadas dentro do estado
de sítio.
No acórdão do HC 300, o voto vencedor
afirmava que as medidas tomadas no estado de sítio não se encerravam
automaticamente com a cessação do estado de sítio. Tal decisão carrega em si
uma fundamentação simples, mas que acabou se tornando a solução para uma
controvérsia complexa. A duração das medidas tomadas no estado de exceção não
era explicitamente colocada na Constituição de 1891.
Deste modo, confrontados com
detenções, determinadas no decreto que declarava o sítio, que ainda perduravam
após o fim da situação de sítio, os ministros do STF tiveram que dar resposta a
seguinte pergunta: a detenção deve
cessar imediatamente com o fim do estado de sítio ou a detenção pode se
prolongar, mesmo depois de restaurada a
normalidade constitucional?
A resposta de tal pergunta,
obviamente, é central à decisão do caso, uma vez que, no caso de a detenção
cessar junto com o estado de sítio, a detenção perderia seus fundamentos e
deveriam ser soltos os detidos.
Entretanto, o STF decidiu que as
medidas tomadas no estado de sítio se prolongam além da cessação do estado de
sítio, até os detidos serem submetidos aos tribunais competentes. Aqui,
novamente, a detenção aparece como preventiva, sem revestir o caráter de penalidade,
mas atrelada a um possível processo criminal.
Ao que tudo indica, portanto, o
sentido da detenção no estado de sítio que
está presente nesse acórdão é a ideia de que a detenção configura uma medida
política e discricionária do Presidente da República, decretada em um estado de
sítio, pelo qual o detido é privado da liberdade de locomoção sem as garantias do devido processo legal,
para ser futuramente submetido a um processo criminal e decidida, apenas ao fim deste, a transformação da
detenção em pena ou o livramento do detido.
Para chegar ao livramento, portanto, é necessário que ocorram todos os
seguintes fatos: (1) o fim da comoção intestina e a cessação do estado de sítio, (2) o juízo político do
Congresso, antes do qual o Judiciário não poderia decidir e (3) a apresentação do detido a um tribunal
competente.
Os tribunais competentes para a
decisão sobre a detenção não são explicitados na Constituição, nem tampouco
nesse acórdão. Entretanto, o Habeas Corpus 415, ao decidir questões de competência
e de indivisibilidade de juízo, deixa entrever que as regras de competência
seriam as da legislação penal vigente, sendo a detenção tratada como uma medida
temporária anterior à uma decisão de caráter verdadeiramente penal. O único
voto divergente na decisão do HC 300 foi o voto do ministro Piza e Almeida.
Ele interpretou o regimento interno
do STF, no seu art. 65, § 3º: “O tribunal se declarará incompetente para
conceder a ordem [...] se a coação
proceder de autoridade militar, no exercício privativo de suas atribuições
contra outro militar ou cidadão sujeito
no regímen militar (Dec. n. 848 de 11 de outubro de 1890, art. 47), ou se
tratar-se de medida de repressão
autorizada pelo art. 80 da Constituição de 1891, enquanto perdurar o estado de sítio”.
E, Piza e Almeida interpreta, a contrario
sensu, que se o regimento determina que o tribunal é incompetente enquanto perdurar
o estado de sítio, isso implica que, uma vez cessado o sítio, ele seria
competente para conceder a ordem.
Além desse fundamento, baseado em uma
interpretação textual, divergiu no sentido de conceder a ordem baseando em um
fundamento histórico. Uma vez que não havia lei regulamentando o art. 80 da
Constituição brasileira de 1891, voltou-se à tradição sob a Constituição anterior
para buscar antecedentes que guiassem a interpretação. O ministro Piza e
Almeida referiu ao art. 179, XXXV da Constituição Imperial de 1824, que previa:
Nos casos de rebelião, ou invasão de inimigos, pedindo a segurança do
Estado, que se dispensem por tempo determinado algumas das formalidades, que
garantem a liberdade (sic) individual, poder-se-á fazer por acto especial do
Poder Legislativo.
Não se achando, porém, a esse tempo
reunida a Assembleia, e correndo a Pátria perigo iminente, poderá o Governo exercer esta
mesma providencia, como medida provisória indispensável, suspendendo-a imediatamente que cesse a
necessidade urgente, que a motivou; devendo num, e outro caso remeter à Assembleia, logo que reunida for,
uma relação motivada das prisões, e d'outras medidas de prevenção tomadas; e quaisquer Autoridades, que tiverem
mandado proceder a elas, serão responsáveis pelos abusos, que tiverem praticado a esse respeito.
Colocando esse dispositivo como
antecessor, na tradição constitucional brasileira, do art. 80 da Constituição
da República de 1891, Piza e Almeida fundamentou seu voto em uma ampla base de
legislação imperial que aplicava o
dispositivo do art. 179, XXXV, para demonstrar que, sob a Constituição
Imperial, a detenção sem processo só era
mantida durante a situação de rebelião ou invasão. Nas palavras do próprio,
sobre as Leis e decretos imperiais:
As leis e decretos citados, dando ao
preceito constitucional sua verdadeira inteligência, terminantemente declaram
que a faculdade, que tem o Governo, para mandar prender e conservar em prisão
um cidadão sem ser sujeito a processo, é
somente durante o tempo da suspensão de garantias, que deve necessariamente ser
fixo e determinado.
Entendendo que “não se pode admitir
que a Constituição Republicana seja interpretada e executada de modo menos liberal, e menos
garantidor dos direitos e liberdades individuais, do que o foi a do império
pelas leis e decretos citados” interpretou o art. 80 da Constituição de 1891 como impedindo a manutenção da detenção no
estado de sítio. A conclusão desse voto divergente, portanto, foi a seguinte:
Durante o estado de sítio tem o
Governo a faculdade de efetuar as prisões que a segurança do Estado exigir. Mas
se levantado o estado de sítio, os cidadãos continuam presos ou desterrados,
sem serem sujeitos a processo, havendo assim para eles uma suspensão de
garantias por tempo indeterminado, contra a expressa disposição do art. 80 da
Constituição, a lei os provê de remédio para resguardarem-se de semelhante
violência, e esse remédio é o habeas
corpus.
Em 1893, o STF voltou a julgar Habeas
Corpus de detidos em estado de sítio, mas desta vez com uma discussão
razoavelmente diferente ao fundo. Uma vez colocado o entendimento do HC 300 de
que as medidas não revestem caráter penal, mas que a detenção se estende após
cessado o sítio até submeter o detido ao foro criminal competente, o tribunal foi chamado a
decidir sobre detidos que alegavam não se enquadrarem na competência criminal da justiça militar.
Foram três Habeas Corpus,
impetrados por Ruy Barbosa em favor de diferentes pacientes, todos capturados a
bordo do navio “Júpiter”, embarcação de guerra rebelada contra o governo no
episódio da Revolta da Armada.
O primeiro destes a ser julgado foi o
HC 406. Apresentados os pacientes ao STF, que eram em número de 48 no caso,
concederam por maioria a soltura com um único argumento como fundamentação. O
argumento dizia respeito à incompetência do Foro Militar para julgá-los diante
dos fatos que eram imputados:
Vistos, expostos e discutidos os
presentes autos de habeas corpus, em que são pacientes David Ben Obill[25] e outros, resolve o Supremo Tribunal
Federal conceder a referida ordem de soltura em favor dos detidos, visto ser ilegal a conservação da prisão em que se
acham, desde que se verifica pelos autos e pelas informações prestadas, que os fatos que lhes são imputados, não
constituem crimes que os sujeitem ao foro militar.
Os votos divergentes também são
igualmente sucintos e pouco argumentados. O ministro Bento Lisboa, cujo voto
divergente se resume a uma frase, decidiu pela manutenção dos pacientes na
prisão, visto que estes teriam cometido
crimes inafiançáveis e sido detidos em flagrante delito, mas que deveriam ser
conduzidos a um juízo competente, não
militar, para serem processados por tais delitos.
A outra divergência, do ministro
Sobral, indica uma pequena ampliação nos
fundamentos dessa postura, referindo ao fato do STF não reconhecer como vigorantes certos Códigos Penais da Marinha,
promulgados em 1890 e 1891, e referindo a legalidade da prisão dos pacientes como sendo fundada no art. 1º,
§§ 2º e 5º da Lei 631 de 1851 e art. 60, letra I, da Constituição de 1891.
Diante da ausência de estruturas
argumentativas mais elaboradas, essas referências à legislação, pelo ministro
Sobral, são a única coisa que permite entrever o debate enfrentado pelo STF
quando dessa decisão. O art. 60, letra
I, da Constituição de 1891 fazia referência à competência dos Tribunais Federais
para julgar crimes políticos.
Com isso, entrevê-se que o que
pretendia Sobral era a readequação da competência em relação aos pacientes,
devendo-se retirá-la da Justiça Militar e passando à Justiça Federal, por se
tratarem de crimes políticos[26].
No entanto, as normas da Lei 631/1851
diziam respeito aos crimes de deserção, espionagem, sedução de militares para
desertarem ou se levantarem contra o governo e atacar sentinelas.
Mais especificamente, previam ritos
distintos de processamento: quando estes crimes eram cometidos por militares,
seriam processados nos termos daquela lei e de acordo com o Direito Penal
Militar, ao passo que quando cometidos por paisanos, seriam processados nos
termos da lei civil.
O que se conclui da leitura sistemática
da legislação citada e da breve argumentação é que o voto do Ministro Sobral
considerava a Lei 631/1850 como norma válida para o processamento dos militares envolvidos, mas, que o cometimento
dos mesmos crimes por civis configurava crime político, sendo julgado pela Justiça Federal, a partir da
Constituição Republicana.
Assim, reproduz-se nessa decisão a
lógica do HC 300 de que a detenção no estado de sítio é pré-penal, quer dizer,
é prévia a um processo penal, mas sem o caráter de pena. Mais ainda, a decisão
da maioria é de que, no caso de não serem levados os detidos ao foro
competente, a detenção torna-se ilegal e cessa após o Estado de Sítio cessar.
De outro lado, também se observa o reconhecimento
do aspecto de crime político aos fatos delituosos cometidos por civis e que
resultem na detenção excepcional.
No Habeas Corpus 410, julgado
pelo STF na semana seguinte ao julgamento do HC 406, tratou-se de um imediato do navio Júpiter, que fora detido
e mantido incomunicável, e que por isso foi defendido em Habeas Corpus em separado, após o julgamento dos
demais, mas que estava inserido, no tocante aos fatos e a características subjetivas, no mesmo grupo do Habeas
anterior.
Mesmo assim, a corte não se limitou a
estender ao imediato a decisão do HC 300, mas o fez com uma fundamentação
aumentada, mas ainda consideravelmente breve, para conceder a soltura. Sobre
essa fundamentação, é importante destacar o seguinte trecho:
Que incumbe aos Tribunais de Justiça
verificar a validade das normas que têm de aplicar aos casos ocorrentes e negar
efeitos jurídicos àquelas que forem incompatíveis com a Constituição, por ser
esta a lei suprema e fundamental do país;
Que este dever não só decorre da
índole e natureza do Poder Judiciário, cuja missão cifra-se em declarar o direito vigente, aplicável aos casos
ocorrentes regularmente sujeitos à sua decisão, se não também é reconhecido no art. 60, letra “a”, da Constituição que
inclui na competência da Justiça Federal o processo e julgamento das causas em que alguma das partes fundar a ação
ou a defesa em disposição Constitucional (BRASIL, STF, HC 410, p.2);
Nesse trecho, o STF reconhece a
existência do controle difuso de constitucionalidade no sistema jurídico
brasileiro. Tal questão, referente ao controle de constitucionalidade no
Brasil, sob a Constituição de 1891, voltaria a ser detalhadamente discutida em
outro momento, nas ações dos reformados pelos atos do Marechal Floriano Peixoto
no contexto da Revolta da Armada, que foi proposta por Ruy Barbosa[27].
Mas já nesse Habeas Corpus, o
STF reconhecia tal mecanismo e colocava-o nas bases de sua decisão. É uma das
primeiras menções ao controle de constitucionalidade na jurisprudência
nacional. Que tenha ocorrido em uma decisão sobre o Estado de Sítio pode
representar um indicativo da importância de um controle de constitucionalidade
adequado nas situações limite da Constituição, especialmente em relação ao
estado de exceção.
Portanto, é, justamente, no ponto em
que o quadro da Constituição está em risco de romper-se que o controle de
constitucionalidade demonstra sua essencialidade.
Além disso, na decisão no caso, a
Corte resolveu um ponto essencial ao controle de constitucionalidade, que é a distinção entre a não aplicação e a
revogação, explicando que a consequência da inconstitucionalidade é a não aplicação, e que esta não se confunde com
a revogação da norma (a qual compete apenas ao legislador, no sistema de controle de constitucionalidade
difuso do Brasil à época).
Outro ponto refere-se às competências
na exceção. Logo após a proclamação da República, dentro do contexto do governo
ditatorial e provisório, foi concedida ao Ministério da Marinha (órgão do
Executivo, portanto) a competência de reformar o Código da Armada. No entanto,
o Ministério da Marinha apenas fez uso dessa competência após a Constituição de
1891 entrar em vigor, ou seja, já fora do período de exceção do governo provisório.
O STF entendeu, então, que este uso
da competência era inconstitucional, porque a Constituição marcava um retorno à
normalidade e que com isso caducava a competência excepcional, pois a
Constituição reservara ao Legislativo o poder de legislar.
Constata-se, ora a
inconstitucionalidade de uma medida de exceção tomada fora do prazo dado sendo
declarada pelo STF, a partir da qual observamos um controle judicial sobre o
quadro normativo de exceção, a partir do retorno à normalidade constitucional.
A consequência disso, no caso, foi
que a competência para processar o detido seria determinada a partir do Código
Penal e da legislação militar do período do Império.
Com isso, a Lei 631/1851, citada pelo
Ministro Bento Lisboa no HC 406, foi invocada no HC 410, justamente para
comprovar que o crime de sedução à deserção ou ao levante contra o governo era
de competência da Justiça comum, quando cometido por civis.
Com isso, ausente a jurisdição
militar, a decisão entendia que a prisão militar sendo incompetente o foro
militar configurava constrangimento ilegal, suficiente para deferir o Habeas
Corpus.
O único voto divergente nesta
decisão, do Ministro Ferreira de Resende, negava a soltura alegando que não
haviam sido apresentados o paciente nem as informações necessárias, motivo pelo
qual se considerava inabilitado para julgar a causa, sem desenvolver quanto ao
mérito[28].
O Estado de defesa, o estado de sítio
e a intervenção federal[29] representam medidas extraordinárias
previstas pela Constituição Federal vigente, que objetiva a restabelecer ou
garantir a continuidade da normalidade constitucional ameaçada.
Trata-se de instrumentos que são
estados de exceção e somente devem ocorrer quando estritamente necessários e
por prazo determinado, sob risco de dar vez e voz aos impulsos autoritários e
regimes totalitários.
O estado de defesa e de sítio
tipificam regimes jurídicos para crise grave, seja decorrente de guerra, golpe
de Estado, calamidades que afetam o Estado e as instituições democráticas.
Ao prever uma disciplina jurídica
para tais momentos excepcionais, a Constituição institui mecanismos de
autopreservação, a fim de evitar, seja a falta de regulação jurídica (que
abriria espaço para arbitrária utilização do poder jurídico ou mesmo da força
bruta, sem limites jurídicos predefinidos), seja o afastamento ou suspensão
indiscriminado e episódico da Constituição ou de importantes normas suas, seja
a quebra ou ruptura definitiva da Constituição.
Por prover tratamento diferenciado
previsto no bojo da própria Constituição para situações excepcionais, pois
assim o texto constitucional consegue atravessar as crises graves sem ser
abandonada ou esquecida e, prevê medidas extremas de salvação pública, que é a
prova de sua estabilidade. Regula não apenas a normalidade, mas também as
exceções.
As expressões utilizadas para a
disciplina normativa de situações de crise grave revelam muito de seu sentido
estado ou direito de necessidade constitucional, sistema constitucional de
crises, direito de crise, legalidade constitucional extraordinária ou
excepcional, estado de exceção, estado de salvaguarda, Estado de Direito
Democrático excepcional, sistemas de emergência, Constituição de emergência,
direito de síncope.
O poder de decretar o estado de
exceção é dos mais fortes, a ponto de se ter afirmado que soberano é “aquele
que decide sobre o estado de exceção” (Carl Schmitt)[30].
A preocupação autocentrada da
Constituição com sua estabilidade tem base na experiência: crises graves
serviram e servem de pretexto para o rompimento da ordem constitucional, o
abandono da Constituição, a instalação da ditadura e do arbítrio.
É preciso, contudo, saber reconhecer
quando uma ordem constitucional legítima está em perigo e requer a decretação
de medidas drásticas de salvação, diferentemente de quando uma ordem
constitucional não é – ou não é mais – legítima e requer-se a manifestação
autêntica do poder constituinte para o estabelecimento de uma nova
Constituição.
Nesta hipótese, que também é de
quebra (abandono) definitiva da ordem constitucional vigente, a utilização
espúria de medidas como o estado de defesa ou de sítio representa um obstáculo
reacionário indevido à manifestação legítima do poder constituinte.
Em menor escala, o recurso a estados
de exceção não deve servir de pretexto para ameaçar ou tolher o direito de
crítica e de oposição, imprescindível a uma democracia, em que as divergências
devem ser livres e protegidas. Feita a advertência, supõe-se que a disciplina
constitucional das situações de crise grave garanta a vigência de uma ordem
constitucional legítima.
Se os estados de defesa e de sítio
estão vocacionados a proteger a Constituição de modo geral, têm eles o objetivo
de defender diretamente o Estado e as instituições democráticas.
Daí aludir-se ao Estado como titular
de um direito de existência, de autopreservação, de soberania.
Contudo, não se deve confundir a defesa do Estado
(preocupação permanente objetivada pela disciplina das situações constitucionais de crise) com a
defesa de determinado Governo
(preocupação política conjuntural, a ser adequadamente resolvida com
o funcionamento normal das instituições),
embora seja essa uma distinção muito relativa;
não se sustenta constitucionalmente o emprego do estado de defesa ou de
sítio com base numa espúria “doutrina de
segurança nacional”, cara a regimes de força (especialmente de matriz militar).
Contudo, todas as pessoas são titulares do direito de preservação da
Constituição, do Estado e das instituições democráticas.
Somente a agressão (potencial ou
efetiva) à ordem constitucional, e de modo grave, ou seja, com fortíssima
intensidade, é que autoriza a decretação dos estados de defesa ou de sítio.
Violações pontuais e de gravidade relativa devem encontrar resposta adequada
nos mecanismos ordinários de proteção da Constituição, do Estado e das
instituições democráticas (controle de constitucionalidade, intervenção,
emprego das forças armadas ou dos órgãos de segurança pública etc.).
Há uma nota de subsidiariedade: os
estados de exceção somente podem ser sacados quando os meios coercitivos
normais não derem conta da situação.
O avanço do Direito Internacional faz
com que a regulação jurídica das situações de crise grave ultrapasse as
fronteiras dos Estados e de suas Constituições, e tenha em perspectiva a
salvaguarda da ordem jurídica internacional.
Nesse sentido, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos[31] (ONU, 1966), que permite aos Estados
partes adotar medidas que suspendam as obrigações decorrentes do Pacto, se oficialmente proclamadas e na estrita medida
em que o exigir uma situação excepcional
que ameace a existência da nação, desde que tais medidas não sejam
incompatíveis com as demais obrigações
que sejam impostas aos Estados pelo Direito Internacional e não acarretem discriminação alguma apenas por
motivo de raça, cor, sexo, língua,
religião ou origem social” (art. 4º, 1).
Observemos a definição normativa dada pelo texto da
Constituição brasileira de 1988 ao estado de defesa, in litteris: “para
preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a
ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade
institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”
(art. 136, caput)[32].
O estado de sítio cabe, nos termos do
art. 137, I e II da Constituição vigente, nos casos de “comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de
fatos que comprovem a ineficácia de medida
tomada durante o estado de defesa” (estado de sítio simples), bem como
nos de “declaração de estado de guerra
ou resposta a agressão armada estrangeira” (estado de sítio qualificado).
As hipóteses previstas no art. 137,
I, são de “sítio fictício” ou “sítio atenuado”, pois não há, de fato, “sítio”
(no sentido de efeito de cerco, de assédio), mas sim, situação de crise grave
equiparada.
Realmente, nenhuma diferença
essencial existe entre os estados de defesa e de sítio, tendo em vista que se
trata de espécies de mesmo gênero, que diferem, basicamente, quanto à
intensidade da crise, pelo que as medidas adotadas no estado de sítio podem ser
mais amplas e severas, em verdade, afirma-se que o estado de defesa seriam um
"estado de sítio mitigado".
Não existe, necessariamente,
subsidiariedade do estado de sítio em relação ao de defesa, ou seja, cada qual
atende a seus próprios pressupostos e podem, inclusive, ser decretados
simultaneamente, hipótese pouco provável, por exemplo, uma calamidade enorme
provocada por chuvas torrenciais, que enseja a decretação de esteado de defesa
ao mesmo tempo de uma agressão armada estrangeira, que enseja a decretação de
estado de sítio, embora o estado de sítio tenda a absorver o estado de defesa.
A independência entre estes é
excetuada em relação ao estado de sítio decretado justamente com base na
ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o
estado de defesa. Que pressupõe a
decretação anterior de estado de defesa e, pelo menos quanto à causa específica
substitui-o caso a situação que gerou o estado d defesa não debelado persista.
É possível, portanto, decretar estado
de sítio diretamente, sem prévia decretação de estado de defesa, pois há
hipóteses que são exclusivas do estado de sítio (como a guerra). Também é
possível convolar o estado de sítio em estado de defesa, quando se verificar
que a situação específica é de menor gravidade e extensão.
Mesmo a localização da causa
(interior ou exterior) talvez já não seja critério seguro para distinguir o estado de defesa do
de sítio: dizia-se que o estado de defesa
destinava-se a proteger o Estado de crise interna, enquanto o estado de
sítio destinava se tanto a proteger o Estado de crise interna não debelada pelo
estado de defesa, quanto de crise externa.
Todavia, se é certo que o estado de
sítio esteja previsto para os conflitos
bélicos internacionais, também pode ser utilizado para debelar desordens internas, como visto, e o estado de defesa
pode prevenir ou combater instabilidades
institucionais decorrentes de fatores internos ou externos (por exemplo,
vicissitudes do mercado internacional),
bem como calamidades naturais ocorridas no Brasil ou no exterior[33].
Quanto ao momento, os estados de
defesa e de sítio podem ser classificados em preventivos (quando pretendem
evitar a crise) ou repressivos (quando pretendem debelar a crise já
deflagrada), sempre tendo em conta a restauração da normalidade abalada.
Embora o estado de sítio, mais grave,
seja mais provável na modalidade
repressiva, tendo em mira uma crise atual (tanto que a Constituição
alude a “preservar ou prontamente restabelecer... a ordem pública ou a paz social
ameaçadas” apenas quando trata do estado
de defesa – no art. 136, caput, limitando-se a dizer “nos casos de.”, quando trata do estado de sítio – art.
137, caput), não está excluída a
possibilidade de decretação preventiva, inclusive porque pode ter a
mesma causa do estado de defesa (art. 137, I); em outra hipótese, para
ilustrar, a declaração de estado de guerra pode ainda não estar acompanhada de
atos efetivos (art. 137, II).
Conclusão
Cumpre alertar para a taxatividade
das causas autorizadoras de decretação de estado de defesa e de sítio, ou
pressupostos materiais que devem estar previstas com clareza no texto
constitucional e, não podem ser outras, senão apenas aquelas taxativamente
enumeradas.
Cumpre que são expressos os termos,
apesar de não ser possível uma definição minuciosa de hipóteses cuja
configuração fática não é rigorosamente determinável. Uma vez acertado que a
causa aconteceu, para o que pesa a interpretação feita pelas autoridades a quem
a Constituição atribuiu participação, a saber: o Presidente da República, os
Conselhos da República e de Defesa Nacional e o Congresso Nacional, a
decretação é cabível.
Se, porém, a causa não se verifica,
não apenas os pressupostos materiais, mas igualmente os pressupostos formais
(forma de instauração por decreto; procedimento: necessidade oitiva dos
Conselhos da República e de Defesa Nacional, aprovação ou autorização do
Congresso Nacional, fundamentação do decreto, conteúdo básico do decreto e,
etc.
A propósito, tais exigências formais
refletem a tendência existente à procedimentalização na formação de principais
atos de poder público.
E, a aludida taxatividade não
caracteriza somente os pressupostos materiais e formais, informando-se também
quanto as restrições aos direitos, sendo cabíveis somente aquelas expressamente
previstas no texto constitucional vigente.
Cumpre, por derradeiro, que tanto os
estados de defesa e de sítio, que são por sua essência, limitados no tempo,
porque carregam em seu bojo o sentido avesso ou contrário à normalidade
constitucional (esta sim, vocacionada à longevidade).
A propósito, o prazo máximo de
duração do estado de defesa é de trinta dias, sendo possível apenas uma única
prorrogação, por igual período, o que totaliza sessenta dias. A fixação da
duração é elemento imprescindível do decreto, sem o qual, este se revela
inválido. A duração não fica, ao inteiro alvedrio do Presidente da República,
pois precisa fundamentar-se na exata duração das razões que tanto justificaram
a decretação.
No caso do prazo previsto se escoar
sem que o motivo desapareça, é necessária a prorrogação, se findo o prazo
desta, persistir o mesmo motivo, não se poderá decretar novamente, nem
prorrogar, o estado de defesa, ainda que o prazo total das medidas anteriores
não tenha ultrapassado os sessenta dias.
Tecnicamente, a rigor, não se trata
de prorrogação propriamente dita e, sim, de nova decretação o que requer a
edição de novo decreto, que deverá atender às exigências do primeiro, inclusive
com prévia oitiva dos Conselhos da República e da Defesa Nacional.
A cessação do estado de defesa pode
ocorrer pelo término do prazo estipulado, pelo desaparecimento do motivo
ensejador e ainda pela rejeição do Congresso Nacional. Se o Congresso Nacional
houver rejeitado o decreto, não será possível prorrogar o estado de defesa que
não mais subsiste, por ter cessado imediatamente (ex nunc) com a rejeição do
Congresso.
Há também a pouco provável hipótese
de que o Presidente decretar estado de defesa com a duração inferior a dez dias
ou quinze, se o Congresso estiver em recesso. E, enquanto o Congresso delibera,
o Presidente, cessado aquele prazo, prorrogar a decretação, o que seria sem aprovação,
mas também sem rejeição do decreto original, prorrogação que deverá ser
apreciada juntamente com este pelo Congresso Nacional.
Já o estado de sítio terá um máximo
de trinta dias, no caso de comoção grave de repercussão nacional, ou então, a
ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o
estado de defesa, hipótese em que, diferentemente do estado de defesa,
admitem-se sucessivas prorrogações sem a limitação de número, mas, à semelhança
do estado de defesa, admitem-se sucessivas prorrogações sem a limitação de
número, mas à semelhança do estado de defesa, nunca por mais de trinta dias, de
cada vez, isto é, a prorrogação é limitada no prazo, porém, não em número de
vezes e, também à semelhança do estado de defesa, as prorrogações devem ser
sempre pautadas pela duração da causa que justificou a decretação.
Já o estado de sítio no caso de
declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira, não
tem duração máxima predefinida no texto constitucional, mas também, nesse caso,
o decreto deverá fixar uma duração, pois não se admite a decretação de estado
de crise grave por tempo indeterminado.
Portanto, poderá ser prorrogado por
tantas vezes que se fizer necessárias. Cada prorrogação corresponde a nova
decretação sucessiva e, deverá ciosamente atender às exigências
constitucionais.
O penúltimo estado de sítio no Brasil
foi feito em 24 de dezembro de 1935, quando foi prorrogado por noventa dias,
tendo obtido autorização do Congresso Nacional para equipará-lo, no que fosse
necessário e conforme previa a Emenda nº1, ao estado de guerra. A justificativa
de Getúlio era de que “não obstante as medidas preventivas e coercitivas
empregadas pelas autoridades civis e militares, permitidas pelo estado de
sítio, força é confessar ainda não desistiram os extremistas de seu propósito”.
No dia 23 de novembro de 1955, a
instauração do estado de sítio foi aprovada pela Câmara dos Deputados por 178
votos contra 91, e no dia seguinte, pelo Senado Federal foi aprovado por 35
votos contra 16. No dia de 25 de
novembro de 1955, o Decreto 2.654 instaurou o estado de sítio no Brasil por
trinta dias, determinando que fosse ainda nomeado executor para zelar por sua
vigência e expedida uma regulamentação a respeito.
No dia 28 de novembro de 1955,
General Henrique Teixeira Lott[34] dirigiu nota circular aos
comandantes das zonas e regiões militares, informando que as forças armadas
estavam “unidas e coesas, isentas de partidarismos e atentas em seus deveres,
impedindo que a nação caminhe para a anarquia ou para a ditadura”.
Nessa ocasião, foi nomeado executor
do estado de sítio, sem prejuízo de suas funções de comandante da 1ª Região
Militar, o general-de-divisão Antônio José de Lima Câmara. Outro estado de
sítio que foi prorrogado sucessivamente pelo Decreto nº 38.402, de 23 de
dezembro de 1955, pela Lei nº 2.706, de 10 de janeiro de 1956, e pela Lei nº
2.713, de 21 de janeiro de 1956. Em 9 de fevereiro de 1956, já com Juscelino na
presidência da república, o estado de sítio foi suspenso, entrando em vigor a
medida de suspensão no dia 15 daquele mês.
O estado de guerra foi, finalmente,
instaurado pelo Decreto nº 702, de 21 de março de 1936, quando expirava a
vigência do estado de sítio. Este conferia ao chefe de Estado poderes
extraordinários, só concedidos em tempo de guerra, e que normalmente seriam
prerrogativas do Legislativo.
Apesar de haver restrição aos
direitos de ir e vir, de reunião, o bloqueio total de atividades, também
chamado de lockdown poderá ser implementado sem que se decrete o estado
de defesa ou necessidade. E, a crise aguda causada pelo Covid-19, o Estado
possui mecanismos e instrumentos adequados para enfrentar a pandemia sem ter
que aderir aos regimes de exceção.
Em regra, o lockdown[35] as pessoas só podem ir até à rua
para realizar compras em supermercados e farmácias ou trabalhar em atividades
essenciais.
Torna-se legítima a evidente
limitação de alguns direitos fundamentais. Particularmente, os direitos de ir e
vir e de reunião, apesar de existir alguns a questionar a constitucionalidade.
A Constituição brasileira prevista e
em vigência permite a restrição desses direitos fundamentais dos estados de
defesa ou de sítio, aliás, o Brasil não decretou nenhum destes, e sim, o estado
de calamidade pública. Apesar de que o estado de defesa pode ser instituído com
o fito de preservar ou restabelecer a ordem pública ou a paz social ameaçadas
por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades
de grandes proporções na natureza.
Destaca-se o momento de legalidade
extraordinária em face da pandemia, o que caracteriza um estado de exceção. A
legalidade extraordinária é forma admitida mesmo no Estado Democrático de
Direito reage diante de situação emergencial[36]. Não ocorre a anomia, que é a
ausência ou suspensão de leis e direitos, como no estado de exceção.
Na legalidade extraordinária, o
Estado prossegue submisso à legislação e dever criar o mínimo possível de novas
leis. Pois, o objetivo é solucionar os problemas com base no ordenamento
jurídico vigente.
A imposição de lockdown sem a
decretação de estado de defesa ou estado de sítio não é inconstitucional porque
estabelece medidas menos agressivas aos direitos fundamentais do que as que
ocorreriam nestes regimes. À medida que forem menos gravosas, tais medidas são
preferíveis do ponto de vista da proporcionalidade, por serem menos limitadores
de direitos fundamentais.
Ressalte-se, ainda, que em 15.4.2020
o Supremo Tribunal Federal reconheceu, através de videoconferência, o Plenário,
por unanimidade referendou medida cautelar deferida em março daquele ano, pelo
Ministro Marco Aurelio.
Assim, o plenário do STF, por
unanimidade, confirmou entendimento de que as medidas adotadas pelo Governo
Federal da Medida Provisória 926/2020 para enfrentamento do novo coronavírus
não afastam a competência concorrente nem tomada de providências normativas e
administrativas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios.
A decisão foi prolatada em face da
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6341 (Disponível a íntegra da
decisão no Link: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI6341.pdf
).
Por outro lado, a Emergência em Saúde
Pública de Importância Nacional, declarada pelo Ministério da Saúde, em
fevereiro de 2020, não tem prazo definido para acabar e depende de ato do
próprio ministério, mas não será maior que o tempo de emergência declarado pela
Organização Mundial da Saúde (OMS[37]). Essa declaração fundamenta todas
as ações urgentes de prevenção, controle de riscos e danos à saúde pública. In:
Agência Brasil. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2020-12/covid-19-decreto-de-calamidade-publica-vale-ate-meia-noite-de-hoje
Acesso em 13.3.2021.
O estado de calamidade pública
autoriza o governo federal a descumprir regras da Lei de Responsabilidade
Fiscal. Ficam suspensos prazos para ajuste das despesas de pessoal e dos
limites do endividamento; para cumprimento das metas fiscais; e para adoção dos
limites de empenho (contingenciamento) das despesas.
O Ministro Lewandowski estendeu em
30.12.2021 a vigência de medidas sanitárias contra Covid-19, a fim de assegurar
a continuidade de medidas profiláticas e terapêuticas necessárias ao
enfrentamento da pandemia.
O Ministro Ricardo Lewandowski, do
Supremo Tribunal Federal (STF), estendeu a vigência de dispositivos da Lei
13.979/2020 que estabelecem medidas sanitárias para combater à pandemia da
Covid-19. A decisão do ministro, proferida na Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 6625, ajuizada pela Rede Sustentabilidade, leva em
conta o término do prazo de vigência da lei, que ocorrerá em 31.12.2020.
A medida cautelar será submetida a
referendo do Plenário da Corte. Vide a íntegra da decisão, no link: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI6.625MC4.pdf
Acesso em 13.3.2021.
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[1]
Foi um ato do Parlamento do Reino Unido que autorizou as autoridades locais a
declarar que qualquer grupo de doze ou mais pessoas se reunisse ilegalmente e
se dispersasse ou enfrentasse ação punitiva. Dotado de longo título do ato era
"um ato para prevenir tumultos e assembleias tumultuadas e para punir os
desordeiros de maneira mais rápida e eficaz e entrou em vigor em 1 de agosto de
1715. Foi revogado na Inglaterra e no País de Gales pela Seção 10 e Parte III do
Anexo 3 da Lei de Direito Penal de 1967. Atos semelhantes ao Riot Act passaram
para as leis das colônias britânicas na Austrália, Canadá e América, alguma das
quais permanecem até hoje. A frase "leia o Riot Act" passou a ser
usada como severa reprimenda ou advertência das consequências.
[2]
Importado pela Carta Magna Imperial de 1.824, embora sem a denominação
hodierna, dispunha no art. 179, § 35: nos casos de rebelião ou invasão de
inimigos pedindo a segurança do Estado se dispensassem por tempo determinado,
algumas formalidades que garantem a liberdade individual.
[3]
Foi a Constituição francesa emitida por Rei Luís XVIII, quando ocorreu a
restauração de Bourbon. A carta que foi revisada em 1830 e, permaneceu em vigor
até 1848, preservou muitas liberdades conquistadas pela Revolução Francesa.
Estabelecera a monarquia constitucional com um parlamento bicameral, e garantiu
as liberdades civis, proclamou a tolerância religiosa e reconheceu o catolicismo
como religião oficial. O fundamento
sobre o poder político que nesta se estabeleceu não é a soberania, mas sim, a
autoridade real, concretizada nos direitos e prerrogativas tradicionais da
Coroa, limitados pelo Soberano. Em virtude desta limitação, certos direitos e
garantias são atribuídos aos cidadãos, resultado de um ato gracioso de poder
real. Deu-se o reconhecimento de certos direitos particulares que o estado se
compromete a assegurar.
[4]Houve
dispositivo na Constituição brasileira de 1967 que disciplina a suspensão de
direitos políticos por seu uso abusivo, que não há similar em nenhuma outra
legislação pesquisada. In litteris:
Art.151- Aquele que abusar dos direitos individuais previstos nos §§ 8º,
23, 27 e 28 do artigo anterior e dos direitos políticos, para atentar contra a ordem democrática ou praticar a corrupção, incorrerá
na suspensão destes últimos direitos
pelo prazo de dois a dez anos, declarada pelo Supremo Tribunal Federal,
mediante representação do Procurador-Geral da República, sem prejuízo da ação
civil ou penal cabível, assegurada ao paciente a mais ampla defesa. Parágrafo único:
Quando se tratar de titular de mandato eletivo federal, o processo dependerá de
licença da respectiva Câmara, nos termos do art. 34, § 3º. (BRASIL,1967).
[5]
O estado de calamidade pública é um termo definido por um decreto de 2010,
editado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o texto, é
caracterizado por "uma situação anormal, provocada por desastres, causando
danos e prejuízos que impliquem o comprometimento substancial da capacidade de
resposta do poder público do ente atingido". Ele pode ser decretado por
prefeituras, Estados e União. Em geral, a calamidade é decretada quando, em
razão da magnitude dos danos, o estado requer auxílio direto e imediato para
arcar com os custos do atendimento. É o nível mais grave de atenção possível.
In: NOVO, Benigno Núnez. Estado de calamidade pública. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/3072/estado-de-calamidade-pblica
Acesso em 13.3.2021.
[6]
Dirigido pelo presidente da República, esse Conselho é composto pelo
vice-presidente da República, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes
da maioria e da minoria na Câmara e no Senado, o ministro da Justiça e seis
cidadãos brasileiros maiores de 35 anos de idade. Foi criado pela Lei 8.041/90.
Dos atuais membros, dois são ligados ao Poder Executivo Federal: o presidente
da República Jair Bolsonaro e o Ministro da Justiça André Mendonça. Ligados ao
Poder Legislativo Federal há outros seis membros: os deputados Arthur Lira,
Presidente da Câmara, líder da maioria na Câmara Aguinaldo Ribeiro e líder na
minoria na Câmara José Guimarães, respectivamente; além dos senadores,
Presidente do Senado Federal do Brasil. Rodrigo Pacheco, o líder da maioria no
Senado Renan Calheiros e líder na minoria no Senado Jean-Paul Prates,
respectivamente. A primeira convocação efetiva do Conselho foi em fevereiro de
2018 -- em sessão conjunta com o Conselho de Defesa Nacional -- para uma
consulta a posteriori sobre a intervenção federal na segurança pública do
estado do Rio de Janeiro.
[7]
Atualmente a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional são
regulados pela Lei n° 8.183, de 11 de abril de 1991, alterada pela Medida
Provisória nº 2216-37, de 2001. Estrutura do Conselho de Defesa Nacional
(Atual): Presidente Jair Messias Bolsonaro (Presidente do Brasil); Secretário
Executivo: General Augusto Heleno (Ministro de Segurança Institucional);
Estatutários: Hamilton Mourão (Vice-presidente do Brasil); Arthur Lira
(Presidente da Câmara dos Deputados do Brasil); Rodrigo Pacheco (Presidente do
Senado do Brasil); Fernando Azevedo e Silva (Ministro da Defesa); André Luiz de
Almeida Mendonça (Ministro da Justiça e Segurança Pública ); Ernesto Araújo
(Ministro das Relações Exteriores); Paulo Guedes (Ministro da Economia);
Assessores Militares; Ten.-Brig.-do-Ar Raul Botelho (Comandante do Estado Maior
das Forças Armadas); Alte.Esq. Ilques Barbosa Junior (Comandante da Marinha);
Gen.Ex. Edson Leal Pujol (Comandante do Exército); Ten.-Brig.-do-Ar Antônio
Carlos Moretti Bermudez (Comandante da Força Aérea); Participantes adicionais O Presidente da República pode nomear
novos participantes, quando apropriado.
[8]
No direito do trabalho brasileiro, o teletrabalho era regido, por analogia,
pelo art.6°, caput, da CLT, cuja redação não tratava do trabalho a distância,
mas do executado em domicilio, como visto. A instituição legislativa do
teletrabalho no ordenamento jurídico trabalhista brasileiro se deu por meio da
lei 12.551, de 15 de dezembro de 2011, que alterou a redação do caput do art.6°
da CLT, prevendo o trabalho a distância, e inseriu o parágrafo único, que
equipara a submissão aos meios telemáticos e informatizados de controle do trabalho
aos meios pessoais e diretos, para fins de subordinação jurídica, ou seja, para
a caracterização de um contrato de trabalho.
[9]
A Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020 dispõe sobre as medidas para
enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional
decorrente de surto pandêmico iniciado no ano de 2019. Posteriormente, a
pandemia provocou, através do Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020, o
reconhecimento oficial do estado de calamidade pública no brasil. Além de
flexibilizar os limites orçamentários e permitir a destinação excepcional de
mais recursos à saúde sem cometimento de crime de responsabilidade fiscal, a
medida também legitima a instauração de regimes jurídicos urgentes e
provisórios, com a finalidade de conter os impactos da situação calamitosa. A
Resolução 313 do CNJ determinou, ainda, a suspensão dos prazos processuais até
30 de abril de 2020 (art. 5º), não obstando a prática de ato processual
necessário à preservação de direitos e de natureza urgente (parágrafo único).
Os tribunais podem, evidentemente, estender o período de suspensão, a depender
das condições locais ou regionais da propagação do vírus. A Assembleia
Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou hoje (24), em discussão única, a
prorrogação do estado de calamidade pública para prevenção e enfrentamento à
pandemia do novo coronavírus no estado e em dez municípios fluminenses. No caso
da calamidade estadual, a prorrogação se estenderá até o dia 1º de julho. Já
com relação aos municípios, os prazos iniciais e finais estabelecidos em cada
norma municipal devem respeitar como limite final a data de 31 de dezembro de
2021. Em 30.12.2021, Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal
(STF), prorrogou estado de calamidade pública por causa da pandemia de
coronavírus.
[10]
A Câmara Legislativa (CLDF) aprovou, em sessão extraordinária remota nesta
terça (15.12.2021), a prorrogação do estado de calamidade pública no Distrito
Federal até 30 de junho de 2021. O pedido foi feito pelo governador Ibaneis
Rocha ao poder legislativo em decorrência da pandemia do novo coronavírus no
DF. O texto prolonga os efeitos do Decreto Legislativo nº 2.284, de 2020, que
reconhecia o estado de calamidade pública até o próximo dia 31. Com isso, o
Executivo fica desobrigado de cumprir metas da Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF), podendo orientar recursos e investimentos para o combate à pandemia,
além de poder solicitar recursos a nível federal, como o Fundo Nacional para
Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil.
[11]
Decreto-Lei 950, de 13 de outubro de 1969 que foi revogado pela Lei 12.340/2010
e MP 494/2010. Art. 4º São obrigatórias
as transferências da União aos órgãos e entidades dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios para a execução de ações de prevenção em áreas de
risco de desastres e de resposta e de recuperação em áreas atingidas ou com o
risco de serem atingidas por desastres, observados os requisitos e
procedimentos estabelecidos pela legislação aplicável. (Redação dada pela Lei nº 12.983, de 2014).
§ 1º A liberação de
recursos para as ações previstas no caput poderá ser efetivada por meio de
depósito em conta específica a ser mantida pelos órgãos e entidades dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em instituição financeira oficial
federal, observado o disposto em regulamento. (Redação dada pela Lei nº 12.983, de
2014).
§ 2º Para as ações
previstas no caput, caberá ao órgão responsável pela transferência de recursos
definir o montante de recursos a ser transferido de acordo com sua disponibilidade
orçamentária e financeira e desde que seja observado o previsto no art.
1o-A. (Redação dada pela Lei nº
12.983, de 2014).
[12]
O primeiro presidente da república do Brasil, Deodoro da Fonseca é lembrado
sempre em diversos símbolos. Conheça alguns deles e aspectos da vida do militar
que não foram mencionados: Fazia parte da Maçonaria e foi Grão-Mestre; sua vida
foi material para uma minissérie, República. Ela foi produzida por Paulo Cesar
Ferreira e exibida na Rede Globo em 1989; Hermes Rodrigues da Fonseca, seu
sobrinho, foi presidente da República em 1910; Na moeda atual de 25 centavos,
há a inscrição da imagem de Deodoro da Fonseca; Sua doença tinha relação com
questões respiratórias; No Rio de Janeiro, existe a Casa Histórica de Deodoro,
um lugar em que foi habitado por ele e se tornou um memorial; Em Alagoas, há o
Museu Marechal Deodoro da Fonseca.
[13]
São possíveis durante o Estado de Sítio: A obrigação de permanência em
localidade determinada; A detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados
por crimes comuns; Restrições relativas à inviolabilidade da correspondência,
ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de
imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei; A suspensão da liberdade
de reunião; A busca e apreensão em domicílio; A intervenção nas empresas de
serviços públicos; A requisição de bens.
[14]
Hermes Rodrigues da Fonseca era oriundo de família tradicional militar, sendo
sobrinho do fundador da República o Marechal Deodoro da Fonseca. Marechal Hermes
da Fonseca destacou-se no meio militar por conta da modernização das forças
armadas. Assim, tornou-se o candidato dos militares para a sucessão
presidencial da República. A candidatura militar aglutinou a maioria das
oligarquias estaduais e o governo federal. Em oposição, o jurista Rui Barbosa
lançou-se candidato e promoveu a “campanha civilista”, divergindo da
possibilidade de ascensão de militares à presidência nacional. Hermes da
Fonseca obteve maioria dos votos. Ambos os candidatos acusaram o opositor de
fraude no pleito eleitoral.
[15]
Arthur da Silva Bernardes (1875-1955) foi advogado e político brasileiro,
presidente de Minas Gerais de 1918 a 1922 e presidente do Brasil entre 15 de
novembro de 1922 a 15 de novembro de 1926. Além da oposição por parte da baixa
oficialidade militar, ele ainda confrontou uma guerra civil no Rio Grande do
Sul, onde Borges de Medeiros se elegeu presidente do estado pela quinta vez
consecutiva, e também o movimento operário que se fortalecia novamente. Em 1923
e 1924 ocorreram novas ações tenentistas no Rio Grande do Sul e em São Paulo,
onde ocorreu a Revolta Paulista de 1924, que levou Bernardes a bombardear a
cidade de São Paulo. Tudo isso levou Bernardes a decretar o estado de sítio,
que perdurou durante quase todo seu governo.
Foi o pioneiro da siderurgia em Minas Gerais e sempre
se bateu pela ideologia nacionalista e de defesa dos recursos naturais do
Brasil. Bernardes promoveu a única reforma da Constituição de 1891, reforma que
foi promulgada em setembro de 1926 e que alterava principalmente as condições
para se estabelecer o estado de sítio no Brasil. Após deixar o governo, foi
eleito senador em 1929.
[16]
Atualmente, uma vez emitido o Decreto Presidencial, o Presidente deve enviar o
ato, juntamente com suas justificativas, ao Congresso Nacional, no prazo de 24
horas. Caso o Congresso esteja em recesso, será convocado em um prazo de 05
dias, tendo um prazo de 10 dias para analisar a decisão presidencial. Dessa
forma, restam duas possibilidades: se o Congresso rejeitar a decisão, o Estado
de Defesa será imediatamente interrompido; caso aprove, por maioria absoluta,
deverá permanecer em funcionamento até que se encerre o Estado de Exceção.
[17]
Na França, o estado de sítio é um mecanismo legislativo e constitucional que
permite a transferência de poderes de polícia da autoridade civil para a
autoridade militar, a criação de tribunais militares e a extensão dos poderes
de polícia. Este tipo de padrão legal é até certo ponto comparável à lei
marcial. A Constituição Francesa de 1958 enquadrou esta disposição em seu
artigo 36. Só pode ser implementado em parte do território, após deliberação em
Conselho de Ministros e com assinatura presidencial, quando houver perigo
iminente de insurreição armada ou de guerra. Durante o estado de sítio, há
transferência de poderes das autoridades civis para as autoridades militares. A
prorrogação do estado de sítio para além de 12 dias está sujeita à autorização
do Parlamento.
[18]
A Revolta Armada (1891-1894), ocorrida no Rio de Janeiro, foi uma rebelião
realizada pela Marinha, que na época era denominada “Armada” e daí o nome deste
movimento. A rebelião tem início com o fechamento do Congresso pelo presidente
Deodoro da Fonseca, em 3 de novembro de 1891, e termina no governo de Floriano
Peixoto, em abril de 1894. Por isso, o conflito é dividido em dois: Primeira
Revolta da Armada, no governo de Deodoro da Fonseca, e Segunda Revolta da Armada,
sob a presidência de Floriano Peixoto. A Marinha estava insatisfeita com os
rumos que a república estava tomando. Afinal, os dois primeiros governos foram
exercidos por dois representantes do Exército: Deodoro da Fonseca e Floriano
Peixoto. Não por acaso este período é conhecido como “República da Espada”
(1889-1894). Tradicionalmente, a Marinha era uma arma ligada à monarquia e não
havia participado nem apoiado o golpe da República em 15 de novembro de 1889.
Por isso, ansiavam pela saída de Floriano e a entrada do Almirante Custódio de
Melo (1840-1902), que pretendia se candidatar a presidente.
[19]
O Manifesto dos Treze Generais foi um documento assinado por treze autoridades
militares do Brasil, datado de 31 de março de 1892 e publicado em 6 de abril, logo
no início do governo de Floriano Peixoto, que assumiu após a renúncia de
Deodoro da Fonseca. O manifesto contestava a legitimidade do governo e
condenava as atitudes de Floriano Peixoto contra rebeliões nos estados e
solicitava convocação de nova eleição para a presidência da república. Eram os
signatários: Marechal José de Almeida Barreto,
Vice-almirante Eduardo Wandenkolk,
General de divisão José C. de Queirós, General de divisão Antônio Maria
Coelho, Barão de Amambaí, General de divisão Cândido José da Costa,
Contra-almirante José Marques Guimarães, comandante da 1a divisão de
cruzadores, General de brigada João Nepomuceno de Medeiros Mallet,
Contra-almirante Dionísio Manhães Barreto, membro efetivo do conselho naval.
General de brigada João Severiano da Fonseca, 2º
vice-presidente do IHGB, Contra-almirante Manuel Ricardo de Cunha Couto,
inspetor do arsenal da Marinha da capital federal, General de brigada João José
de Bruce, General de brigada José Cerqueira de Aguiar Lima, General de brigada
João Luís de Andrade Vasconcelos.
[20]
BARBOSA, Ruy, Discurso e Escriptos. O Estado de Sítio. Sua natureza. Seus
efeitos, seus limites. Capital Federal: Companhia Impressora, 1892.
Conteúdo : Petição de
habeas-corpus requerido ao Supremo Tribunal Federal a favor das vítimas dos
decretos de 10 e 12 de abril -- Oração de Ruy Barbosa em defesa do
habeas-corpus ante o Supremo Tribunal Federal na sessão de 23 de abril de 1892
-- O acordão de 27 de abril : escriptos publicados na imprensa contra a
denegação do habeas-corpus -- Appendice I: d'o paiz. -- Appendice II: acordão
do Supremo Tribunal Federal, em 27 de abril de 1892 na petição de habeas-corpus
n. 300 -- Appendice III: opiniões na imprensa.
Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/227378
Acesso em 12.3.2021.
[21]
Enquanto ocorria a Revolta da Armada no Rio de Janeiro, o sul do país passava
pela Revolução Federalista (1893-1895). Também chamada de Revolta Federalista
foi uma guerra civil que ocorreu no estado do Rio Grande do Sul e se espalhou
por Santa Catarina e Paraná. Este movimento foi caracterizado pela disputa
entre os federalistas (maragatos) e o exército republicano (pica-paus). Na
verdade, era um conflito entre dois modelos de república: descentralizado
(federalista) e centralizado (positivista). Em 1894, o Almirante Custódio de
Melo conduz o navio "Aquidabã" em direção ao sul para apoiar os
federalistas contra Floriano Peixoto. No entanto, a embarcação é a torpedeada
na ilha de Desterro (SC), marcando o fim do conflito.
[22]
Quando se passa a cogitar a coerência do Direito como uma grande mecânica que
reúne regras e princípios, a razoabilidade do Direito deixa de depender
simplesmente da lógica intrassistêmica das regras entre si (o que foi decretado
pelo legislador) e passar a depender da lógica intersistêmica (o que as
instituições reconhecem como práticas legítimas socialmente) em face da
recorribilidade à história e à práxis em torno da justiça.
[23]
O poder discricionário permite ao executor um juízo de oportunidade e
conveniência, também conhecido como mérito do ato. Esclarece Gasparini: Há
conveniência sempre que o ato interessa, convém ou satisfaz ao interesse
público. Há oportunidade quando o ato é praticado no momento adequado à
satisfação do interesse público. São juízos subjetivos do agente competente sobre
certos fatos e que levam essa autoridade a decidir de um ou outro modo. O ato
administrativo discricionário, portanto, além de conveniente, deve ser
oportuno. A oportunidade diz respeito com o momento da prática do ato. […] A
conveniência refere-se à utilidade do ato. […] Este juízo de conveniência e
oportunidade deve sempre ser pautado no princípio do interesse público sobre o
privado, jamais atendendo os interesses particulares do administrador. Além
disso, o Poder Discricionário não possui liberdade absoluta, mas sim relativa,
pois está circunscrito por diversos limites, como as exigências do bem comum e
os princípios norteadores do regime jurídico administrativo, em especial os
princípios da Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência.
In: GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 14ª Ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
[24]
A evolução da doutrina no Tribunal implicou no reconhecimento de que a violação
de direito individual não se justifica pela ação política dos Poderes do
Estado, e que ela se submete ao princípio da supremacia da Constituição. No
passado, a doutrina transitou por temas como estado de sítio, intervenção
federal, verificação de poderes, dualidade de governos e assembleias
legislativas, rejeição de veto ao projeto de lei, convocação extraordinária do
Congresso Nacional e declaração de impedimento do Presidente da República (caso
Café Filho). Atualmente, ela tem sido suscitada em questões envolvendo matéria
interna corporis das Casas do Congresso Nacional, processo legislativo,
expulsão de estrangeiros, condução da política econômica do governo, anistia,
processos de impeachment do Presidente da República e político-punitivo de
parlamentar, além dos pressupostos das medidas provisórias. Diversamente dos
demais temas, no caso das medidas provisórias, a matriz norte-americana da
doutrina foi substituída pela sua variante italiana. Vide: TEIXEIRA, José
Elares Marques. A doutrina das questões
políticas no Supremo Tribunal Federal - STF. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/87028
Acesso em 13.3.2021.
[25]
Presos por crime militar inafiançável, juntamente com todos os ocupantes do
navio, ficam retidos ilegalmente, conforme alegação do advogado, nas Fortalezas
de Santa Cruz e Lage, no Rio de Janeiro, sem nota de culpa e à disposição da
Justiça Militar, incompetente para julgá-los. Relator: Ministro Barros Pimentel. Data do Julgamento: 2.8.1893 e 9.8.1893. Decisão: Concedida a ordem de soltura em
favor dos detidos, por maioria. Publicação do acórdão BARBOSA, Rui, Obras Completas de Rui Barbosa, RJ, v.
XX, 1893, t. V, MEC, 1958, p. 291.
Revista O Direito, v. 62/86-88.
[26]
A CF/1946 não definiu o que seriam os crimes políticos, ou mesmo distinguiu
esta categoria em face dos crimes contra a segurança externa do País. No que
diz com estes últimos, a questão assumia contornos de singeleza, pois a
primeira parte do Livro II do Código Penal Militar vigente à época (Decreto Lei
6.227/44) previa, no rol do Título I, os crimes contra a segurança externa do
País (arts. 118 a 129). A questão nodal, portanto, residia em definir o que
seriam os crimes políticos, o que não ocorreu expressamente em sede
constitucional ou mesmo infraconstitucional. Neste quadrante, a doutrina passou
a subdividir os crimes políticos em puros e relativos. O crime político puro é
aquele que “ofende ou expõe a perigo de ofensa, exclusivamente, a ordem
política em sentido amplo ou a ordem político social (compreensiva não apenas
das condições existenciais e o regime governamental do Estado e dos direitos
políticos dos cidadãos, senão também, nas suas bases fundamentais, a
organização social, sobre a qual se ergue a ordem política em sentido estrito),
e cujo autor, além disso, tem por escopo esse mesmo resultado específico ou
assume o risco de seu advento. Crime político relativo é o crime comum, isto é,
lesivo de interesses de direito comum, mas praticado por motivo político, ou
como meio de crime político, formando com este unidade jurídica (crime
complexo), ou no curso ou por ocasião de crime político, apresentando-se um e
outro intimamente conexos (crime político por conexidade)”. Para que possa
caracterizar-se o crime político é indispensável que a ofensa aos interesses da
segurança do Estado se faça com um especial fim de agir. É indispensável que o
agente dirija a sua ação com o propósito de atingir a segurança do Estado. (…)
Pode-se dizer que o fim de agir é aqui um elemento essencial ao desvalor da
ação neste tipo de ilícito, sem o qual verdadeiramente não se pode atingir os
interesses da segurança do Estado. A exigência do fim de agir é uma
indefectível marca de uma legislação liberal nessa matéria. Mas pode-se também
dizer que essa exigência do fim de agir está na natureza das coisas. Não há
ofensa aos interesses políticos do Estado de direito democrático se o agente
não dirige sua ação deliberadamente contra a segurança do Estado.” Independente
da se aceitar ou não o especial fim de agir como elemento subjetivo específico
nestes delitos, certo é que a partir da conceituação doutrinária, consolidou-se
entendimento de que os crimes políticos em sentido puro estavam positivados na
Lei 1.802/53 (Lei de Segurança Nacional) – que tipificava os delitos contra a
segurança interna do País –, bem como em dispositivos esparsos do Código Penal
Militar (Dec. Lei 6.227/53), do Código Eleitoral (Lei 1.164/50) e da Lei de
Imprensa (Lei 2.083/53) (HUNGRIA, 1960, p. 7-8).
Na vigência da CR/1969,
discutiu-se novamente a respeito dos crimes políticos, pois de um lado, o art.
125, IV, determinava a competência da Justiça Federal para o processo e
julgamento de crimes políticos, ao mesmo tempo em que o art. 129, § 1º,
dispunha que a competência para o processo e julgamento de crimes contra a segurança
nacional seria da Justiça Militar.
[27]
O advogado Rui Barbosa impetra habeas corpus em favor do Senador
Almirante Eduardo Wandenkolk e outros cidadãos, indiciados por crimes de
sedição e conspiração, presos ou desterrados em virtude de decretos expedidos
pelo Vice-Presidente da República, Marechal Floriano Peixoto, na função de
Presidente. Tais atos determinam a suspensão das garantias constitucionais,
decretando-se o estado de sítio no Distrito Federal. Fundamenta-se o pedido na
inconstitucionalidade do estado de sítio e na ilegalidade das prisões
ocorridas, umas antes de decretado o estado de sítio, outras, depois de
terminada a sua vigência, quando devem imediatamente ser restabelecidas as
garantias constitucionais. Relator: Ministro Costa Barradas. Data do
Julgamento: 27.4.1892. Decisão: Negada
a ordem, por maioria (10x1). Publicação do acórdão: Revista O Direito, v. 58/302-307 COSTA,
Edgard. Os Grandes Julgamentos. RJ. v. 1, Ed. Civilização Brasileira, 1964, p.
26-33. BARBOSA, Rui. Obras Completas de Rui Barbosa, RJ, v. XIX, 1892, t. III,
MEC, 1956, p. 355-361.
[28]
Julgamentos do STF: Caso do navio "Júpiter" – HC. Impetrado habeas corpus por Rui Barbosa, em
favor de David Ben Obill e outros, brasileiros e estrangeiros civis, num total
de 48, presos por militares cumprindo ordem do Vice-Presidente da República,
Marechal Floriano Peixoto, a bordo do navio mercante "Júpiter",
capturado no litoral de Santa Catarina. Presos por crime militar inafiançável,
juntamente com todos os ocupantes do navio, ficam retidos ilegalmente, conforme
alegação do advogado, nas Fortalezas de Santa Cruz e Lage, no Rio de Janeiro,
sem nota de culpa e à disposição da Justiça Militar, incompetente para julgá-lo.
Relator: Ministro Barros Pimentel. Data do julgamento: 2.8.1893 e 9.8.1893. Decisão:
Concedida a ordem de soltura em favor dos detidos, por maioria. Publicação do
acórdão: BARBOSA, Rui, Obras Completas de Rui Barbosa, RJ, v. XX, 1893, t. V,
MEC, 1958, p. 291. Revista O Direito, v. 62/86-88.
[29]
Cumpre expor as principais diferenças existentes entre o estado de defesa e o
estado de sítio que são previstos nos artigos 136 e 141 da Constituição
brasileira de 1988 e representam situações de restrições aos direitos
fundamentais em nome da preservação do próprio Estado. Logo, a primeira
diferença diz respeito à forma de decretação, pois o estado de defesa exige
decreto do Presidente da República, que a seguir, é sujeito ao exame do
Congresso nacional. Já no estado de sítio, o Presidente da República precisa
ser o primeiro a solicitar ao Congresso Nacional a autorização para sua
decretação, diante de sua maior gravidade. A segunda diferença é referente ao
tempo de duração de cada regime. O estado de defesa possui a duração máxima de
trinta dias, sendo prorrogável, uma vez por igual período. No caso de estado de
sítio envolvendo comoção grave de repercussão nacional ou em caso de ineficácia
do estado de defesa, o regime excepcional permanece no máximo trinta dias,
prorrogável, de cada vez, por igual período. Existe, ainda, outra modalidade de
estado de sítio disciplinada pelo artigo 137, II CF/1988, quando haverá duração
indeterminada, já que se trata de causa decorrente de guerra ou resposta a
agressão armada estrangeira. A derradeira diferença refere-se às medidas a
serem tomadas durante o estado de defesa e no estado de sítio. Enquanto no
primeiro podem ser tomadas as medidas previstas no art. 136, §1º da CF vigente;
no caso de estado de sítio, podem ser adotadas as medidas contempladas no
artigo 139 da mesma Constituição brasileira;
já no caso do estado de sítio decretado com fundamento no artigo 137,
II, não há previsão expressa das medidas que podem ser tomadas, o que evidencia
a gravidade da situação. Cumpre sublinhar que durante a vigência do estado de
defesa, de sítio ou de intervenção federal a Constituição Federal não poderá
ser emendada, em face de haver situações de limites circunstanciais ao
exercício do Poder Reformador.
[30]
Agamben recorre à reflexão de
Carl Schmitt sobre o estado de exceção. Depois de uma longa citação de Teologia
Política: quatro capítulos sobre a doutrina da soberania (1922), na qual a
exceção é definida com o um caso exterior ao ordenamento jurídico que revela um
elemento formal jurídico específico, que é a decisão, ele enfatiza o seu
efeito, a instauração do estado de exceção, ao invés detratar da própria
decisão, em cujo monopólio reside a essência da soberania para Schmitt. O interesse
de Agamben, como fica claro no decorrer de sua análise, é destacar o caso excepcional,
que ele considera o meio pelo qual o soberano cria e garante a situação da qual
o direito tem necessidade para sua própria vigência. Como na teoria jurídica de
Schmitt é o soberano quem decide sobre o estado de exceção, garantindo dessa
maneira sua ancoragem na ordem legal, Agamben infere que o soberano é
logicamente definido pela exceção, colocando-se na mesma situação paradoxal do
estado de exceção, ou seja, numa condição que não está nem fora nem dentro do ordenamento
jurídico: “o lugar e o paradoxo do conceito schmittiano de soberania derivam do
estado de exceção”.
[31]
Decreto 592, de 6 de julho de 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm Acesso em 13.3.2021. O Pacto Internacional
dos Direitos Civis e Políticos, de fato, consagra muitos dos direitos
fundamentais da pessoa humana, reafirmando a Declaração Universal. Vários dos
princípios previstos mostraram-se genéricos, tornando-se mais detalhados em
outros diplomas internacionais específicos, como a Convenção Americana de
Direitos Humanos, a Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura, a
Convenção para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher e tantas
outras citadas. De qualquer forma, o Pacto constitui-se inequivocamente num
rico instrumento para a proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana,
que, embora reconhecidos neste e noutros tratados internacionais e, em grande
parte, na própria legislação interna, inclusive constitucional, ainda carecem
de efetiva introjeção na cultura do povo brasileiro, com vistas a garantir a
concretização de um Estado Democrático de Direito.
[32]
Havendo ainda duas restrições explícitas, previstas pelo art. 136: que o Estado
de Defesa ocorra em “locais restritos e determinados” e que, antes de sua
decretação, sejam ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional (vale ressaltar que esses órgãos são meramente consultivos, não
estando o Presidente obrigado a adotar seus pareceres). Em que contextos
específicos, então, seria possível determinar Estado de Defesa?
Exemplificativamente, o instrumento poderia ser acionado em caso de rebeliões
populares ou em que um desastre natural seja de tamanhas proporções que chegue
a ameaçar a ordem pública ou a paz social. No caso do desastre da mineradora
Samarco em Mariana, por exemplo, caso a Presidência considerasse haver tal
ameaça, poderia fazer uso desse mecanismo (o que não ocorreu).
[33]
Diversos países como a Itália e Brasil e cidades como Nova York declararam em
25.3.2020, o estado de emergência face à epidemia do novo coronavírus. A
declaração tem de ser feita exclusivamente em situações fora do comum e o
governo pode alterar algumas de suas funções para melhor enfrentá-la, seja esta
situação causada por desastres naturais, crises políticas ou econômicas e até
mesmo epidemias, como é o caso do Covid-19.
[34]
Henrique Batista Duffles Teixeira Lott (1894-1984) foi militar e político
brasileiro que galgou o posto de marechal e, foi Ministro da Guerra e concorreu
à Presidência da República nas eleições de 1960. Porém, foi derrotado por Jânio
Quadros. Após isso tentou ainda permanecer na vida pública. Em 1961,
declarou-se contrário à tentativa de golpe planejada pelos ministros militares
para impedir a posse de João Goulart após a renúncia de Jânio e foi de extrema
importância para a Campanha da Legalidade de Brizola ao aconselhar a buscar
apoio em chefes militares nacionalistas locais. No caso, os generais de
Exército Oromar Osório, comandante em Santiago, e Peri Constant Bevilacqua, comandante
em Santa Maria. Para assegurar a legalidade, em 26 de agosto de 1961 (dia
seguinte à renúncia do presidente Jânio Quadros), fez um importante manifesto
às Forças Armadas No início de 1956, Lott continuou como ministro da Guerra no
governo de JK, pois garantira a posse do presidente, mobilizando as tropas nas
ruas. Foi quando recebeu uma espada de ouro da comunidade defensora da
legalidade constitucional (segundo familiares e amigos próximos, Lott teria
recusado a espada de ouro, ao brandir sua tradicional espada de general). Este
acontecimento ficou conhecido com Movimento de 11 de novembro.
[35]
Termo em inglês vem sendo usado para descrever medida de fechamento de regiões
na pandemia de Covid-19 para obrigar ao isolamento social. “Lockdown"
é uma expressão em inglês que, na tradução literal, significa confinamento ou
fechamento total. Ela vem sendo usada frequentemente desde o agravamento da
pandemia da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2).
Embora não tenha uma
definição única, o "lockdown" é, na prática, a medida mais
radical imposta por governos para que haja distanciamento social – uma espécie
de bloqueio total em que as pessoas devem, de modo geral, ficar em casa. Veja
as diferenças dos termos relacionados à reação à pandemia de Covid-19:
Isolamento social – é, em princípio, uma sugestão preventiva para todos para
que as pessoas fiquem em casa; Quarentena – é uma determinação oficial de
isolamento decretada por um governo. Lockdown – é uma medida de bloqueio
total que, em geral, inclui também o fechamento de vias e proíbe deslocamentos
e viagens não essenciais; Se um
governante impõe um "lockdown", a circulação fica proibida, a
não ser que ela se dê, por exemplo, para compra de alimentos, transporte de
doentes ou realização de serviços de segurança. In: Portal G1. Entenda o
que é "lockdown". Disponível em: https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/05/06/entenda-o-que-e-lockdown.ghtml Acesso em 12.3.2021.
[36]
A definição do termo quarentena está na Portaria nº 356/2020 do Ministério da
Saúde. A medida tem como objetivo garantir a manutenção dos serviços de saúde
em local certo e determinado. Para adoção da quarentena é necessária a
publicação de ato administrativo formal (lei, decreto, portaria) e ampla
divulgação pelos meios de comunicação. Pode ser ordenada em âmbito nacional,
estadual ou municipal, pelo prazo máximo até 40 dias, mas pode ser estendida
“pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a
manutenção dos serviços de saúde no território”.
[37]
A emergência internacional de saúde é definida pela OMS no seu Regulamento
Sanitário Internacional como “uma situação extraordinária que constitui um
risco de saúde pública para outros Estados através da disseminação
internacional de doenças e por potencialmente exigir uma resposta internacional
coordenada”. Desde a sua criação em 1948, a OMS decretou algumas vezes estado
de emergência de saúde global, que foram: Gripe H1N1 em 2009: OMS declara
estado de pandemia por conta da gripe, que causou 284 mil mortes. Vírus Zika em
2016: por volta de 30 países tiveram casos de bebês nascidos com malformações
que têm relação com este vírus, sendo este disseminado maioritariamente por
picada de mosquito. Ébola na República Democrática do Congo em 2019: apesar do
risco de epidemia continuar a ser alto dentro do país e o risco de expansão
para outras regiões era baixo, a OMS declarou o estado de emergência
internacional já que o surto acontecia desde 2018 e “quando foi decretada
emergência internacional, o surto já tinha provocado quase 1700 mortos e
registrava a cada dia 12 novos casos de infecção”.
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