O
processo civil brasileiro foi construído a partir do modelo esculpido pela
Constituição Federal Brasileira de 1988. Tal modelo designa um conjunto de
princípios constitucionais destinados a disciplinar o processo civil e, não
apenas esse, mas todo e qualquer processo.
O mater princípio de origem constitucional
é o devido processo legal e, deste advém todos os outros como o da isonomia,
contraditório, ampla defesa, da inafastabilidade da jurisdição, da motivação
das decisões judiciais e da duração razoável[1] do processo. Sem se
olvidar do princípio da segurança jurídica.
É
verdade que todos esses princípios são implementados positivamente nas
disposições do CPC/2015. As normas fundamentais presentes na parte geral do
novo codex traçam o arcabouço lógico
e ideológico de todo diploma legal, mas não se trata de rol exaustivo, conforme
informa o enunciado 369 do FPPC.
A inafastabilidade da jurisdição implica no amplo e universal acesso ao Judiciário, mas ainda, há compatibilidade com a arbitragem e também com as outras formas que buscam a consensualidade na solução dos conflitos, e também, pela viabilidade dos negócios processuais[2] desde que atendidos os requisitos legais.
A verdade[3] é que as soluções
consensuais das lides se revelam mais adequadas do que a imposição
jurisdicional dos julgamentos, ainda que construídos de forma dialógica e
democrática conforme prega a versão contemporânea de processo que cada vez mais
se define em ser um procedimento em contraditório.
É
relevante que se busquem as soluções constitucionalmente legítimas e, muitas
vezes, tais soluções são consensuais, é o caso das ações de família.
O que
é realmente relevante, é o fato que exista a efetiva tutela de direitos quer
seja exercida por soluções jurisdicionadas ou não, com a garantia da duração
razoável do processo, com celeridade[4] e segurança jurídica (com
o processo sendo capaz de produzir resultados para os quais se dirige).
Há um
sistema de vinculação aos precedentes judiciais que ouso mencionar, onde quase
tudo é vinculativo, especialmente quanto às causas repetitivas e, há ainda, a
tutela provisória (de urgência e de evidência e a inibitória); bem como a
melhoria do sistema recursal, com redução de recursos e maior simplificação
procedimental.
Não
basta um processo célere se não for capaz de gerar resultados
constitucionalmente adequados, não sendo, eficiente. O processo deve ter o
tempo necessário e hábil para a produção de resultados legítimos daí, se
justificar a imposição de multas e antecipação de tutela.
Vale
destacar o princípio da primazia da resolução do mérito que vem reafirmando que
o processo é um método de resolução do caso concreto.
Afinal
extinguir o feito sem resolução do mérito, assim como decretar a nulidade de um
ato processual ou não conhecer de um recurso é algo que só pode ser admitido
quando tiver diante de vício que não se consiga sanar, ou por ser de tal
natureza insanável, ou por se ter aberto a oportunidade para que o mesmo fosse
sanado e, isso não tenha acontecido tempestivamente.
Deve
haver a maior sanabilidade dos feitos que possível de modo que se desenvolva a
atividade jurisdicional tendente a permitir a resolução de mérito da causa.
Inclusive o CPC/2015 viabiliza a audiência de saneamento onde as partes poderão
ser convocadas para prover os devidos esclarecimentos e capacitar o processo
para a apreciação do mérito.
Além
do que na matéria probatória ter adotado a possibilidade de admissão da ata
notarial e da prova emprestada de forma de aperfeiçoar a instrução do processo.
Há,
pois no moderno direito processual civil brasileiro, um princípio da primazia
da resolução de mérito, o qual, espera-se, seja capaz de produzir resultados
bastante positivos no funcionamento do sistema de prestação de justiça civil.
Outra
fundamentalidade é o princípio da boa-fé[5] objetiva exigida dos
sujeitos do processo, mas também a vedação de comportamento contraditório[6] (venire contra factum proprium) e que impõe a sanção ao abuso de
direito processual e às condutas dolosas de todos os sujeitos do processo
(Enunciado 378, FPPC).
Decorre
da boa-fé objetiva o reconhecimento de que os comportamentos produzem legítimas
expectativas. Também a boa-fé objetiva impede que o julgador profira, sem
motivar de forma específica a alteração, as decisões diferentes sobre uma mesma
questão de direito aplicável a situações de fato análogas, ainda que em
processos distintos (Enunciado 377 do FPPC). O que ratifica a existência do
livre convencimento judicial motivado.
O
resultado do processo deve ser fruto de intenso debate e a efetiva participação
dos interessados, não podendo ser produzido solitariamente pelo juiz. E, mesmo
diante de matéria de ordem pública.
Importante
alertar que a autorização para conhecer de ofício, porém, não significa a
autorização para decidir sem prévio contraditório. O atual modelo
constitucional de processo impõe um viés comparticipativo e policêntrico, não
mais centrado no juiz, mas no diálogo na cooperação de todos participantes do
processo.
O
processo cooperativo e comparticipativo exige que todos os seus sujeitos que
atuem de forma ética e leal, agindo de modo a evitar vícios capazes de levar à
extinção do processo sem resolução do mérito, além de caber-lhes cumprir todos
os deveres mútuos de esclarecimentos e transparência.
Há
apenas três exceções à exigência de oitiva prévia da parte contra quem se
decide. A primeira exceção é a tutela provisória de urgência. Tal exceção é
legitimada pelo princípio de acesso à justiça e pelo periculum in mora, pois a medida deve ser deferida inaudita altera parte, sem a oitiva da
parte contrária (sendo uma decisória provisória). Mas, não há negatória do
contraditório pois apenas ocorre uma postergação ou postecipação.
Existe
também a exceção para os casos de tutela da evidência previstos no art. 311, II
e III do CPC/2015. O caráter provisório da decisão proferida inaudita altera parte que é uma
exigência do contraditório, uma vez que ao demandado, mas deve ser assegurada a
possibilidade de promover o distinguishing[7],
ou seja, de demonstrar que o caso concreto em julgamento é diferente daquele
que gerou o precedente e, por isso, nele a tese firmada, não deve ser aplicada
(ou, ainda, quando é o caso de overruling[8],
a superação do precedente).
Admite-se
também a concessão inaudita altera
parte da tutela de evidência (mais calcada no fumus boni iuris) de demanda fulcrada em contrato de depósito,
estando este comprovado documentalmente, caso em que será desde logo
determinada a entrega da coisa, sob cominação de multa.
In casu, em que o demandado é
considerado logo, como sendo depositário infiel. Ora, se a lei civil impõe a
devolução da coisa depositada, sob pena de multa tanto que o depositante a
exija, não haveria sentido em que o direito processual civil não fosse capaz de
prever mecanismos para a pronta restituição da coisa da depositada, sob pena de
frustrar-se o próprio direito material.
Mais
uma vez, porém, há uma decisão provisória sempre sendo possível ao réu, após
regular o contraditório, demonstrar que não era o caso de devolução do bem.
Outra
hipótese de decisão inaudita altera
parte é a decisão que determina a expedição de mandado monitório que apresenta
a inversão de iniciativa de contraditório (que só será pleno com o oferecimento
de embargos, sem os quais, constituir-se-á de pleno direito o título executivo
judicial.
Lembremos que o contraditório deve ser compreendido como uma garantia de não surpresa (da decisão judicial). Significa que o resultado do processo não pode ser tal que surpreenda a qualquer dos seus participantes.
O que
ocorre quando uma questão de ordem pública é arguida de ofício sem ser dada a
oportunidade para as partes de prévia manifestação.
Baseada
na vetusta parêmia da mihi factum, dabo
tibi ius (dá-me os fatos que te darei o direito) acreditando-se que a
incumbência das partes era somente apresentar os fatos ao juízo e, cabendo ao
órgão jurisdicional e estabelecer o direito aplicável.
Mas
esse atuar é incompatível com o Estado Constitucional. Só é constitucionalmente
legítima e democrática a decisão judicial construída em contraditório, por
todos os participantes do processo. Não se admitem as decisões chamadas de “terceira
via”, ou seja, baseadas em fundamento que o juiz tenha encontrado
inesperadamente, sem haver o prévio debate.
Há
outros princípios que são expressas nas normas fundamentais integrantes na
parte geral do CPC/2015 e que norteiam todo o processo civil como o da
dignidade da pessoa humana, o da proporcionalidade, o da razoabilidade, da
legalidade, publicidade e a eficiência.
Quanto
aos princípios de proporcionalidade e razoabilidade de seus conteúdos ainda
provocam na doutrina controvérsia, sem haver sequer um consenso acerca de serem
os termos sinônimos ou não.
A
Corte Suprema do Brasil tem invocado a razoabilidade e a proporcionalidade em
diversas decisões usualmente fazendo referência a estes como projeções no plano
substancial, do princípio do devido processo legal (substantitve due process).
A legalidade deve ser entendida como a exigência de que as decisões sejam tomadas com apoio no ordenamento jurídico vigente.
Não
incumbe ao Judiciário fazer a lei, mas tão apenas interpretar e aplicar a lei
que é democraticamente aprovada e publicada pelo Legislativo.
Não
tem, pois, os juízes a legitimidade para criar soluções segundo sua consciência
ou valores pessoais para os casos concretos que lhes são submetidos a
apreciação. O papel criativo do juiz limitação à interpretação[9] da norma jurídica e a
gestão do processo, não estando legitimado a criar.
A ordem constitucional vigente notabiliza-se pela grande difusão dos valores fundamentais para todos os ramos da Ciência Jurídica. Na mesma proporção se busca a conformação das normas infraconstitucionais com os preceitos constitucionais, o que bem reflete o constitucionalismo que trouxe diversas mudanças paradigmáticas.
Afinal
a ordem constitucional se compõe de normas e valores que direcionam e legitimam
todo o ordenamento jurídico.
A
instituição explícita do Estado Democrático de Direito traz o assegurar dos
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça visando ser os valores supremos da sociedade fraterna,
pluralista e baseada na harmonia social a solução pacífica dos conflitos.
A
legítima política do Estado Democrático de Direito se firma na medida em que
cumpre seu compromisso com estabelecimento da ordem, da justiça e do bem-estar
social.
Assim devem ser disponibilizados um conjunto de mecanismos capazes a tanto e através dos poderes do Executivo, Legislativo e Judiciário pois a segurança jurídica em sua acepção objetiva exige um patamar mínimo de continuidade do Direito, ao passo que na acepção subjetiva, significa a proteção da confiança do cidadão nesta continuidade da ordem jurídica, no sentido de uma segurança jurídica individual das suas próprias posições jurídicas.
A eficácia do direito fundamental à segurança jurídica decorre da dignidade da pessoa humana que é um dos fundamentos da república brasileira.
Lembremos
que é a segurança jurídica que atua como garantia e controle dos atos estatais.
A
Constituição confere legitimidade a uma ordem política e dá legitimação aos
respectivos titulares do poder político. Assim, a Constituição se assume como
estatuto jurídico do político englobando num único sentido (a legitimidade e da
legislação).
Canotilho[10] apud Fux leciona com lucidez que o esforço de constituir uma ordem política segundo os princípios justos consagrados na Constituição e, confere ainda ao texto uma indispensável bondade material a vincular juridicamente os titulares do poder justificado pela autoridade.
O
princípio da confiança legítima dos cidadãos imprime grande expectativa e fé na
tutela estatal de suas relações passadas, presentes e futuras.
Refere-se a um relevante componente psicológico que regula as condutas humanas em favor do respeito ao Estado de Direito notabilizado pela democracia.
O
direito processual atua como um poderoso instrumento de realização dos ideais
constitucionais. É através destes que se concretizam os direitos fundamentais
constitucionalmente reconhecidos, explícita ou implicitamente, por meio de
técnicas adequadas a tal fim.
Por
isso, exige-se que o direito processual esteja afinado com os preceitos
constitucionais, ao mesmo tempo absorvendo e transmitindo seus valores.
Deve o
processo cumprir a cláusula do devido processo legal, em seu aspecto formal e
substancial, garantindo, assim, a legalidade e o controle dos atos pelos
jurisdicionados.
Mas as
técnicas judiciais devem estar atualizadas e atender as transformações sociais
e jurídicas a fim de melhor tutelar o direito material em debate. E, nesse
sentido o processo eletrônico[11] representa um grande
avanço.
Pois o
processo ao cumprir sua missão constitucional se caracteriza não só por sua
face instrumental de resolução de conflitos, mas também, como garantia de uma
tutela jurisdicional adequada, igualitária, eficiente e justa. E, dentro da
duração razoável.
Ao
longo do século XX, o ordenamento jurídico brasileiro sofreu relevantes
mutações valorativas que acompanharam as tendências mundiais.
Surgiram
novas perspectivas jurídicas que propiciaram a remodelação do Estado de
Direito, pois teve que abandonar a concepção liberal para adotar uma postura
mais intervencionista, atendendo-se aos anseios do chamado Estado Social.
O
início se deu com o desenvolvimento do direito constitucional contemporâneo
após a Segunda Grande Guerra Mundial quando o fracasso do positivismo clássico
se aliou à pressão sofrida pelo ente estatal a atuar e finalmente garantir à
sociedade multidimensionada, uma série de benefícios de uma população
massificada, confirmando os direitos à educação, à saúde, à segurança e à
qualidade de vida.
A
alteração ideológica ocorrida ao longo do século XX mobilizou o mundo jurídico
fazendo-o acompanhar a trajetória e as consequências da nova forma de
interpretação jurídica.
A
Constituição não se trata de apenas um sistema em si, dotado de ordem unidade e
harmonia mas passou a significar também um modo de visão e interpretação de
todos os demais ramos do Direito.
A
constitucionalização identifica um efeito expansivo das normas constitucionais
que se irradiam por todo o sistema jurídico. Deve-se inclusive notar a
crescente e definitiva constitucionalização do Direito Privado.
Em
nosso país, essa nova percepção da Constituição teve como marco histórico o
texto constitucional de 1988 que fora encarregada da redemocratização do país e
com objetivo de gerar um sentimento constitucional.
Filosoficamente atribui-se ao pós-positivismo as transformações ocorridas no direito constitucional e há três situações contribuíram para as mudanças, a saber: o reconhecimento da força normativa constitucional que passar de aplicação direta e imediata; a expansão da jurisdição constitucional; o surgimento de uma nova forma, de interpretação constitucional, com relevantes alterações na hermenêutica jurídica.
A
busca da efetividade constitucional ensejou três alterações paradigmáticas, a
saber: no plano jurídico com a atribuição de plena normatividade à Constituição
que se tornou fonte de direitos e obrigações, independentemente da
intermediação do legislador; do ponto científico ou dogmático, reconheceu o
direito constitucional um objeto próprio e autônomo, retirando-se do discurso
político e sociológico.
E, por
derradeiro, sob o ponto de vista institucional deu-se a ascensão do judiciário
no Brasil, imprimindo-lhe um papel de maior relevância na concretização de
valores e direitos constitucionais.
Enfim,
o discurso normativo, científico e judicial fora resultado de uma necessidade
história. O positivismo constitucional que tanto impulsionou o movimento, mas
não se contentava em reduzir o direito à norma, mas sim, em elevá-lo em
condição, pois até então, ele havia sido menos que norma e nada mais que uma
promessa.
A
efetividade processual corresponde finalmente ao rito de passagem do antigo
para o novo direito constitucional, fazendo que a Constituição deixasse de ser
a maravilhosa miragem honrada com a falsa supremacia para efetivamente
significar o maior proveito da cidadania brasileira.
Não à
toa que Ulysses Guimarães[12] alcunhou o atual texto
constitucional de Constituição-Cidadã.
O
neoconstitucionalismo representa uma consequência evolutiva sofrida pela teoria
dos princípios. Aliás, a juridicidade dos princípios passara por três fases
distintas em sua saga evolutiva.
A fase jusnaturalistas em que sua normatividade é basicamente nenhuma ou duvidosa, contrastando com a dimensão ética-valorativa de ideia que tanto inspira os postulados de justiça.
Na fase positivista em que os princípios participam dos textos codificados como fonte normativa subsidiária e, ainda, na qualidade de princípios gerais do Direito, além de funcionarem nas ordens constitucionais como meras pautas programáticas de pouca importância jurídica.
Já na
fase pós-positivista onde existem as novas constituições das últimas décadas do
século XX, onde se enxerga a hegemonia axiológica dos princípios que foram
convertidos em pedestal normativo que suporta toda a construção jurídica dos
sistemas constitucionais contemporâneos.
A fase
pós-positivista no Brasil que fora em 1995 abordada por Paulo Bonavides que
apontou o abandono da separação havida entre o direito e a moral, e enxergava
na normatividade constitucional dos princípios, a principal razão da mutação de
seu caráter programático para uma força positiva e eficaz de maneira
inquestionável e cada vez mais presente.
Assim,
os princípios se tornaram normas-chave de todo o sistema jurídico, oxigenando
os textos constitucionais e auferindo a valoração de sua ordem normativa, se
transformando a sede de toda a legitimidade de poder.
Além da constitucionalização dos princípios, outro fator caracteriza o neoconstitucionalismo, é a atividade argumentativa, trazendo maior racionalidade jurídica para a hermenêutica jurídica.
Os
direitos fundamentais foram enaltecidos pelos princípios que reforçam a
importância de uma teoria da interpretação e da argumentação.
Enfim, o neoconstitucionalismo reformula um paradigma clássico referente ao conceito de direito e de seu valor moral, a partir da carga axiológica do direito nos Estados constitucionais e do funcionamento e a estrutura das normas sobre os direitos fundamentais.
A segurança jurídica quanto à sua natureza jurídica pesa a divergência doutrinária quanto esta constituir um valor, um princípio ou uma qualidade dentro do sistema jurídico.
Podendo
ainda ser classificada como garantia, como proteção dos direitos subjetivos
(como o social e as demais garantias constitucionais) com a finalidade do
Direito.
É
verdade que a segurança jurídica abrange muitas variáveis tais como
ideológicas, formais e materiais que contribuem para o regular desenvolvimento
estatal e social.
Ademais o Estado Democrático de Direito deve buscar concretiza os direitos e garantias fundamentais, conferindo a confiança e boa-fé por meio de estabilidade e da durabilidade dos direitos e das relações jurídicas. Passando a segurança jurídica, portanto, ser reconhecida como direito subjetivo.
A mudança axiológica e ideológica no texto constitucional refletiu e alterou sobremaneira o contexto de todo o ordenamento jurídico e, consequentemente, o conceito e a finalidade do processo, a fim de melhor atender aos reclames sociais e políticos, mormente promovidos ao patamar constitucional. O processo contemporâneo é a síntese da constitucionalização progressiva do direito infraconstitucional.
O
processo deve ser enfocado como técnica idônea para ser a garantia do direito
substantivo, mas sob a perspectiva constitucional que trouxe significativas
mudanças intestinas, para passar a reconhecer o processo, também como direito
fundamental, e imprimiu também mudanças externas, conferindo ao instituto, a
responsabilidade de fazer valer os ideais constitucionais, possuindo na
cláusula do devido processo legal sua expressão mais autêntica.
A
participação de processo para a formação da decisão constitui, de modo
imediato, uma posição subjetiva inerente aos direitos fundamentais, portanto, é
ela mesma o exercício de um direito fundamental. É a vedação à decisão
não-surpresa.
É
escorreito o pensamento de que o direito processual é o direito constitucional
aplicado, não se esgota na mera realização de direito material, constituindo-se
como uma ferramenta de natureza pública indispensável para a realização da
justiça e da pacificação social.
O
poder de gestão do processo pelo juiz vem sendo admitido e utilizado por vários
ordenamentos jurídicos como forma de aperfeiçoar a qualidade da justiça, mesmo
entre aqueles que sempre desconfiaram desse tipo de postura ativa do magistrado,
como é o sistema norte-americano.
Um dos
maiores desafios do processo civil contemporâneo consiste em equilibrar o
garantismo processual com a maior efetividade da prestação jurisdicional. É um
desafio enfrentado tanto do sistema common
law como no civil law.
A
expressão processo justo ou giusto
processo que consta expressamente no art. 111 da Constituição Italiana e
representa o que em França se chama por procès
équitable e que no Brasil denominados de devido processo legal, previsto no
art. 5º, LIV da CF/1988.
O
processo justo seria a versão dinâmica do devido processo legal devidamente
vinculado aos princípios e aos direitos fundamentais.
A
ordem pública processual seria o elemento justificador da segurança jurídica-processual,
sendo pautado no respeito aos princípios e garantias fundamentais do processo
justo.
A
segurança jurídica resulta a priori
presente em três esferas subjetivas distintas da pessoa. O bem-estar
jurídico-social decorrente da certeza da existência do ordenamento jurídico
garantidor de direitos e deveres.
Outra esfera é a justiça com paz como escopo imediato da jurisdição e a terceira esfera é a certeza quanto a questão em sede de processo judicial.
O novo
CPC inova ao trazer logo em seu início um rol de artigos relativos aos
princípios e garantias do processo civil, exteriorizando as premissas que devem
pautar o direito processual. Tudo influenciado fortemente pela ideologia
neoconstitucional e neoprocessualista e, promovendo maior harmonização entre os
princípios constitucionais da segurança jurídica e da efetividade processual.
No CPC
de 2015 foram mantidas e inseridas cláusulas gerais e normas abertas de maneira
que seus conteúdos fossem preenchidos de acordo com as particularidades do caso
concreto, proporcionando uma justiça mais eficaz.
Enfim, não se pode cogitar propriamente em segurança jurídica e nem em efetividade processual sem mencionar o relevante papel da jurisprudência em nosso ordenamento jurídico.
Sendo
certo que tanto a doutrina como a legislação são igualmente importantes fontes
de aperfeiçoamento do direito processual, mas é a atividade jurisdicional que
aponta concretamente e diariamente para os dilemas jurídicos e sociais
instalados na sociedade e, deve orientar o raciocínio interpretativo, a fim de
que se cheguem até às soluções mais tangentes ao ideal de justiça.
Percebe-se,
no entanto, que se tem monocratizado progressivamente as decisões dos
Tribunais, em total afronta ao princípio da colegialidade, retirando das partes
o direito de ter questões litigiosas enfrentadas pela composição mais
experiente de magistrados.
Por
outro lado, se observa a desjudicialização das controvérsias e as
autocomposição[13]
pelas partes do processo representam a forte tendência de ser galgar maior
satisfação por parte dos litigantes nos conflitos.
Destaca-se
os benefícios trazidos da mediação e da conciliação[14] o que confirma a
contemporânea difusão da ordem constitucional e dos valores fundamentais da
democracia, desde que preenchidos todos os requisitos em lei.
Desta forma, reitera-se a legitimidade necessária da atuação do Estado, na face subjetiva (gerando confiança e credibilidade) e, na face objetiva (garantismo e eficiência do sistema jurídico-processual).
O
processo fora reformulado ganhando merecido protagonismo tal qual o direito
material e reforçando o sincretismo que garantisse a adequada tutela
jurisdicional dos direitos.
Ademais,
a simplificação e a organização do sistema processual foram as principais metas
do novo Código de Processo Civil brasileiro, conferindo ao processo, o maior
rendimento que possível e permitindo que o julgador realize as adequadas
decisões, provendo a devida e específica fundamentação e fugindo de
complexidades burocráticas e desnecessárias.
Consagra-se
então a feição de um processo participativo, notabilizado pela máxima: Audiatur et altera pars! Ouça ambas as
partes que bem traduz a antiga parêmia e que se encontrava na obra de Sêneca.
E,
mais propriamente na tragédia Medeia[15] (Quem decide o que quer
que seja sem ouvir a outra parte, mesmo que decida com justiça, não é justo!).
Assim, tem-se o contraditório dinâmico muito além da bilateralidade da audiência, soando mais efetivo e que permita o conhecimento, a manifestação das partes, além do justo direito de influenciar o julgamento da demanda e, ainda, de ter o diálogo cooperativo preconizado tão poeticamente pelo art. 6º do CPC/2015.
Referências:
CÂMARA,
Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015.
FUX,
Luiz. (Coordenador) Processo Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
FLEXA,
Alexandre; MACEDO, Daniel; Fabrício Bastos. Novo Código de Processo Civil. O que
é inédito. O que mudou. O que foi suprimido. Salvador: JusPodivm, 2015.
LAGO,
Rodrigo. O distinguishing e a preservação da jurisprudência no julgamento do
mensalão. Disponível em: http://www.osconstitucionalistas.com.br/o-distinguishing-e-a-preservacao-da-jurisprudencia-no-julgamento-do-mensalao Acesso em 06.12.2015.
MELO,
Nehemias Domingos de. (Coordenador) Novo CPC Anotado Comentado e Comparado. São
Paulo: Editora Rumo Legal, 2015.
SAMPAIO
JÚNIOR, José Herval. Processo Constitucional Nova Concepção de Jurisdição.
Prefácio de Luiz Guilherme Marinoni. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
Método, 2008.
NEVES,
Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais. 2ª edição. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: Método, 2013.
P.S. Aproveito a oportunidade para parabenizar o
professor Alexandre Flexa pela sua generosidade em gravar diariamente preciosos
esclarecimentos sobre o CPC de 2015 no Periscope (aplicativo de smartphone), aliás, sou contumaz em
assisti-lo. Além de ser brilhante, fornece didáticas explanações sobre temas
normalmente complexos. Parabéns!!!!
[1]
Foi por conta da
duração razoável do processo e na busca de impessoalidade que o art. 12 do
CPC/2015 prevê o respeito à ordem cronológica de julgamentos. O que também
obriga o juiz e tribunal a criar e manter a lista de processos aptos a
julgamentos e que seja acessível em cartório e também no sistema eletrônico do
Tribunal. A lei traça exceções à regra mas que não comprometem o comando geral.
[2]
São admissíveis os seguintes negócios processuais, dentre outros: pacto de cooperabilidade,
acordo de dilação de prazos das partes de qualquer natureza, acordo de rateio
de despesas processuais, dispensa consensual de assistente técnico, acordo para
retira o efeito suspensivo da apelação, acordo para não promover a execução
provisória.
[3]
Não devemos ressuscitar o discurso processual as teorias de busca da vontade no
trato de atos e negociações decorrentes da autonomia privada, na utilização da
cláusula de negociação processual.
[4]
O novo CPC a questão
da duração razoável há de ser entendi a partir de um referencial mais amplo do
que a mera aceleração ou desformalização dos procedimentos. A celeridade
processual deverá oferecer a solução integral do mérito. Ademais não se
soluciona o mérito apenas se proferindo qualquer sentença, pois esta deverá
conter o objeto do processo, e ainda a função jurisdicional deve ser tal
direito definido e satisfeito.
[5]
A repulsa e
reprimenda à má-fé subjetiva (conduta dolosa, com o propósito de lesar a
outrem) sempre foram severamente punidas, tanto no âmbito do direito público
como no direito privado. Mas, há outra acepção de boa-fé, que se desprende do
subjetivismo para se localizar objetivamente no comportamento do agente,
trazendo como exigência uma ordem ético-jurídica. A boa-fé objetiva assumiu
maior destaque, em nosso direito brasileiro, com o advento do CDC e de Código
Civil de 2002 que a adoraram com um dos princípios fundamentais do direito das
obrigações.
[6]
O BGB no final do século
XIX e no alvorecer do século XX inovou o papel da boa-fé no Direito privado ao
dispor em seu parágrafo 242, com grande repercussão, que “o devedor está
adstrito a realizar a prestação tal como exija a boa-fé, com consideração pelos
costumes do tráfego”. Tal boa-fé foi amplamente acolhida pelo direito
estrangeiro e corresponde a conduta leal e confiável, independentemente de
considerações subjetivistas. Foi a partir dos graves problemas ocasionados pela
Primeira Grande Guerra Mundial que a boa-fé objetiva preconizada pelo BGB
ganhou plenitude e assumiu sua vocação de cláusula geral apta a importar os
parâmetros de conduta nas relações sociais, sobretudo, por meio da criação de
direitos e obrigações, anexos e correlatos ao objeto do contrato, voltados a galgar
a mútua, leal e normativa cooperação entre as partes.
[7]
Distinguishing - É possível que uma decisão judicial não represente exatamente
o conteúdo de uma norma de interpretação refletida na jurisprudência de um
tribunal, mas não seja a hipótese de um erro judicial, e nem também se esteja
diante de uma interpretação evolutiva. A aparente dissonância entre a norma de
interpretação e norma de decisão pode ser resultado de um distinguishing, que
ocorre quando o caso concreto em julgamento apresenta particularidades que não
permitem aplicar adequadamente a jurisprudência do tribunal.
[8]
Na hipótese de overruling, o Tribunal
deve ter sempre o cuidado de observar se a mudança da regra pode já valer para
o caso concreto, e para todos os casos futuros, ou se é necessário o respeito à
segurança jurídica. Neste último caso, é possível se recorrer ao prospective
overruling, que é a mudança de regra prospectiva, apenas para o futuro. Ou
seja, apesar de reconhecer a mudança da regra, o tribunal deixa de aplicá-la àquele
caso concreto, servindo esta apenas como sinalização do tribunal para a mudança
da norma de interpretação, aplicando aos fatos ocorridos no pretérito as regras
até então vigentes.
[9]
O Supremo Tribunal Federal, ainda que não o afirme expressamente, não raramente
recorre ao distinguishing, até mesmo
para afastar a incidência de uma súmula de sua jurisprudência. A hipótese mais
comum é o afastamento do verbete da Súmula 691 para que se possa conhecer de
habeas corpus contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal
Justiça que indefere medida liminar. Em geral, quando isto ocorre, apesar do
Supremo reafirmar a higidez de sua jurisprudência e do conteúdo da sua súmula,
excetua o caso concreto de sua incidência, considerada alguma ilegalidade
flagrante.
[10]
José Joaquim Gomes Canotilho é jurista português. É licenciado e doutor em
Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, onde é professor
catedrático e professor visitante da Faculdade de Direito da Universidade de
Macau. É um dos nomes mais relevantes do direito constitucional da atualidade.
Ganhou o Prêmio Pessoa em 2003 e fora agraciado com a Grã-Cruz da Ordem do
Infante Dom Henrique em 09.06.2005.
[11]
O novo CPC visa
ampliar o uso do chamado processo eletrônico para todos os tribunais em consonância
com a preocupação de melhor gerencialmente processual e ampliar a eficácia
processual, eliminando os chamados “tempos mortos” do processo. Aliás, visa o
novo CPC em garantir meios de acesso aos autos não somente do advogado, mas
igualmente dos jurisdicionados.
[12] Ulysses
Guimarães (1916-1992) foi político e advogado brasileiro e opositor à ditadura
militar. Fora Presidente da Câmara dos Deputados em duas ocasiões distintas e
também fora candidato a presidência da República na eleição de 1989. Morreu em
acidente aéreo de helicóptero no litoral de Angra dos Reis, no RJ, mas seu
corpo jamais foi encontrado.
[13]
Cogita-se em meios
alternativos de solução de conflito de interesses o que corresponde a criança
de um sistema chamado de multiportas, principalmente quando se tratar de causas
menores, fazendo muitas vezes que pessoas até mesmo desacompanhadas de
advogados, conforme permite a Lei 9.00/95 para causas de até vinte
salários-mínimos se submetam a transações iníquas ou abusivas.
[14] Na mediação, visa-se recuperar o diálogo entre as partes. Por isso
mesmo, são elas que decidem. As técnicas de abordagem do mediador tentam
primeiramente restaurar o diálogo para que posteriormente o conflito em si
possa ser tratado. Só depois pode se chegar à solução. Na mediação não é
necessária interferência, ambas partes chegam a um acordo sozinhas, se mantém
autoras de suas próprias soluções. Conflitos familiares e de vizinhança, por
exemplo, muitas vezes são resolvidos apenas com o estabelecimento da
comunicação respeitosa entre os envolvidos. A conciliação pode ser mais indicada quando há uma
identificação evidente do problema, quando este problema é verdadeiramente a
razão do conflito - não é a falta de comunicação que impede o resultado
positivo. Diferentemente do mediador, o conciliador tem a prerrogativa de
sugerir uma solução.
[15]
Medeia é uma das personagens mais terríveis e ao mesmo tempo fascinante de toda
mitologia, pois ao envolver sentimentos contraditórios e profundamente cruéis,
que inspiraram muitos artistas ao longo da história, na escultura, pintura,
teatro, cinema e até ópera. Eurípedes foca sua obra em uma personagem feminina,
pois na Grécia antiga a mulher era vista como fraca, seu papel era cuidar do
lar e de seu marido. Medeia mostrou a angústia, o sofrimento que pode morar
dentro de um coração e as consequências desse sofrimento. No caso da obra, não
poderia haver maior vingança do que tirar do homem a sua família.