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sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Breves notas sobre a audiência, sua evolução e previsão no Novo Código de Processo Civil brasileiro.



Pesquisando historicamente sobre a audiência, verifica-se que ao tempo das Ordenações, a audiência não se apresentava propriamente como um ato processual, mas como ato ordenatório e coordenador da atividade forense em geral.

Significava a sessão em que o juiz pessoalmente ouvia as partes, por si ou por seus advogados e procuradores, deferia seus requerimentos, proferia sua decisão sobre as questões de fácil e pronta solução e, publicava suas sentenças sejam interlocutórias ou definitivas.

A audiência ordinária consistia num tempo durante o qual o juiz ficava à disposição dos litigantes para a prática de atos de natureza administrativa, ouvindo requerimentos dos presos, as pessoas religiosas e mulheres que estivessem presentes, em seguida, os advogados e procuradores, começando pelo mais antigo, realizava-se assim, atos processuais de maior relevância, em vários processos, apresentando os advogados, os termos de recursos e protestos.

Todos os termos da audiência eram lançados nos respectivos livros encadernados para os escrivães, depois em seus cartórios os transcreverem em seus respectivos feitos. E as Ordenações Portuguesas eram expressas em que, “depois de acabar de ouvir a agente, que na audiência estiver, não a levantaria o juiz, sem antes mandar perguntar pelo porteiro, em alta voz, se ainda alguém havia que quisesse requerer alguma cousa” (Ord, Tít. 19, §4º).

Pereira e Souza apud Carreira Alvim conceituava a audiência como sendo o lugar no qual os juízes ouvem as partes por si, por seus advogados ou procuradores. Neste lugar é que as causas devem prosseguir os seus termos, sendo regulados pelos juízes que a elas presidem. Decidem-se em audiência as questões de fácil expedição.

Já Othon Sidou afirma que audiência como “momento culminante da atividade jurisdicional” constituiu e, ainda constitui, o núcleo do processo em todos os tempos: “os reis primitivos, depois os juízes que passaram a exercitar a distribuição da justiça em nome do monarca, o iudex e o pretor romanos, o vizir egípcio, o cádi muçulmano e o Rachimbourg germânico sempre ouviram de viva voz as partes, antes de fazerem ouvir seu julgamento.

No CPC de 1939 ao qual não se pode negar o crédito pela modernização da estrutura e dos conceitos básicos do processo civil brasileiro, substituíra a antiga concepção duelista pela ideia de o processo ser instrumento público e dinâmico de atuação da lei, a audiência passou a ser ato processual integrante de cada determinado processo, suprimidas as antigas audiências ordinárias, de evidente inutilidade, retratando apenas um ritualismo superado e inócuo.

Assim, a audiência de instrução e julgamento tornou-se no CPC de 1939 um termo essencial do processo ordinário, não se podendo conceber a sua preterição. É quando o processo viveu a sua hora culminante, porque é nela que o juiz entra em contato com as provas, ouve o debate e, pronuncia a sentença.

Assegurou a importância da audiência inclusive nas causas em que a pretensão das partes se fundamentasse em prova exclusivamente documental, por possibilitar, mesmo em tais casos, não apenas a realização do debate oral, como ainda, ser proferida logo a sentença e, o prazo para a interposição dos recursos começava de pronto a fluir, sem a necessidade de novas intimações.

O CPC de 1939 realmente adotou o sistema oral, apesar de manter a função de documentação, apresentando-se no simples caráter preparatório do debate oral, ou seja, contém o anúncio das declarações que serão feitas em audiência.

Na lição de Chiovenda, as declarações juridicamente relevantes far-se-ão somente em audiência, nesta se deseja mantê-las, deve-se também confirmar oralmente as declarações anunciadas e escritas, mas pode se modificar, retificar ou abandoná-las e formular outras não anunciadas. Usualmente a declaração oral não faz mais que evocar as declarações escritas, constituindo uma referência a estas, não se entende, porém, olvidar as alegações escritas ou simplesmente contrariá-las, se não é feita ou evocada oralmente em audiência, perdem     as declarações escritas sua relevância original.

Todavia o processo brasileiro, continuou consagrando a regra de que as declarações fundamentais das partes se contêm na petição inicial e na contestação apresentadas não com a função de meros escritos preparatórios, mas como declarações de vontade em definitivo traçando os lindes da pretensão e da resistência.

O CPC de 1939 adotou o processo oral e suas regras da imediação que Chiovenda considerou a essência da oralidade, da concentração e da identidade física do juiz, e regras que aliadas à atividade dos litigantes, realmente romperam em definitivo com os conceitos dominantes no antigo processo, já irrecusavelmente superado, inapto a atender as necessidades de eficácia da atuação jurisdicional em uma sociedade econômica e culturalmente em franco processo e evolução.

Liebman que teve certeira influência no CPC de 1973 considerou indispensável a audiência posto ser inaceitável suprimir a oralidade, ainda mais, num sistema legislativo brasileiro, onde havia uma única audiência que era a de instrução e julgamento destinada ao conhecimento do mérito.

Eliézer Rosa apud Carreira Alvim definiu a audiência de instrução e julgamento como o ato processual público solene, substancial do processo, presidido pelo juiz[1], onde se instrui, discute e decida a causa. Revelou o nobre doutrinador que, no entanto, a audiência nunca obteve o sentido que a teoria tanto enaltecera, referindo-se à má praxe de os advogados substituírem as alegações orais por memoriais escritos de antemão ou, ainda, de simplesmente se reportarem às peças básicas da fase postulatória.

Mas a realização da audiência muitas vezes representava um fator de procrastinação e não de aperfeiçoamento no andamento dos processos, pelo atraso decorrente das pautas de juízes sobrecarregados de trabalho.

Nas antigas ações executivas não contestadas e presentes no CPC de 1939 bem como as demandas baseadas em prova somente documental, realmente as audiências eram reduzidas à simples formalidade de um simbólico debate oral, que nada contribuíam para a encontrar a melhor solução da causa, mas sim, para acarretar indesejado retardamento, sendo apenas uma homenagem bizarra a um princípio teórico na prestação jurisdicional.

Galeno Lacerda em sua magnífica tese sobre Despacho Saneador em 1953 pioneiramente sustentou a possibilidade de julgamento antecipado do mérito no momento processual do despacho saneador, impugnando o posicionamento doutrinário de Liebman. Retrucou afirmando que Liebman situava-se no plano da pura técnica processual e a luz dela é que interpretou a lei brasileira. Enxergava a lei brasileira, porém com olhos italianos.

Não se ousa negar os méritos óbvios da oralidade e as virtudes das audiências. Mas, se postula efetivamente por uma visão teleológica do processo[2]. Assim Galeno Lacerda advertiu in litteris: “Antes de se afirmar que o processo brasileiro[3] é oral, que o debate e audiência são essenciais, impõe-se, primeiro, indagar quais, em nosso sistema, a natureza e a finalidade de tais atos. ”

Afinal há de se distinguir os atos essenciais indispensáveis à constituição e aos fins da relação processual de outros atos nem tão essenciais, posto que pertençam à esfera da disponibilidade das partes ou à do juiz. Assim, exemplificando: o recurso, a contestação, a exceção, a perícia que não constituem atos essenciais ao processo.

Destacou Galeno Lacerda que podemos vislumbrar pelo menos três objetivos da audiência: provar, discutir e julgar. E, o motivo pelo qual não se pode considerar a audiência ato essencial se prende primeiramente porque nem toda prova nesta se pode produz. A prova documental, por exemplo, se oferece ora nos atos de postulação ou de contestatória. Reservando-se para audiência, apenas, as inspeções diretas e provas orais tais como interrogatórios de peritos, depoimento das partes e de testemunhas.

Portanto, caso as provas orais não se fizerem necessárias, a audiência para colhê-las será ato inútil e dispensável. Outro motivo é porque a prova pertence ao poder de disposição da parte ou do juiz. Sendo certo que o destinatário da prova é o juiz. Como ato disponível, o meio através do qual possa manifestar-se é a audiência – não sendo essencial ao processo.

Não se pode negar que a audiência continua a ser ato disponível, renunciável e cuja existência pertence ao alvedrio dos litigantes. Portanto, não será daí que a audiência possa receber nota e adjetivo de ato essencial ao processo.

Conclui-se que são plenamente disponíveis para os litigantes ou mesmo para o magistrado todos os atos a serem praticados dentro da audiência em razão dos quais esta existe.

Concluindo, Lacerda é peremptório em aduzir que entre nós, a oralidade não é imperativa, mas disponível. Nossos atos postulatórios são escritos, e sua apresentação em juízo e a produção probatória documental, tantas vezes a única a realmente existir, não se fazem em audiência, portanto tais discussões orais são sumariamente renunciáveis, e nossas sentenças, salvo a publicação, independem igualmente de audiência.

Percebe-se que Liebman raciocinou, no Brasil, em termos da oralidade europeia, e mais particularmente a italiana. E, sua afirmação de que a petição inicial, a contestação e a réplica não são absolutamente suficientes para dar ao juiz um conhecimento satisfatório da causa é puro dogmatismo. Se o réu com a contestação, demonstrou cabalmente a prescrição ou a coisa julgada, ou pagamento, ou a transação, e ao autor não assiste nenhum argumento consistente lhe opôs, ao voltar a se manifestar no feito, o juiz restará habilitado a julgar a lide.

Se a audiência, portanto, em nosso processo, não é ato essencial, desaparece a única razão, que ao ver de Liebman, impediria decisão a respeito do mérito por ocasião do despacho saneador.

A jurisprudência pátria da época, no entanto, sendo fiel ao texto do diploma processual de 1939 só aceitava a supressão da audiência em face da não-contestação do réu, nos procedimentos especiais e ante a expressa autorização legal para o juiz de plano sentenciar.

E a referida lição veio a conduzir a uma das inovações mais exitosas e acolhida sob aplausos gerais no CPC de 1973 ao julgamento antecipada da lide, ou melhor, ao julgamento imediato da lide. O que mais tarde veio redundar no indeferimento liminar da petição inicial ou a decisão liminar de mérito.

Apesar de festejado o julgamento antecipado da lide deve ser usado com ponderações e prudência, a fim de não implicar graves riscos para o direito de defesa. A eminente professora Ada Pellegrini Grinover tecendo considerações sobre “O Julgamento Antecipado da Lide – Enfoque Constitucional” concluiu que: “O novo instituto, destinado a conferir ao processo maior celeridade, economia e concentração, representa uma escolha de política legislativa em detrimento da oralidade, e deve ser usado com cautelas, para que não haja prejuízo para a defesa dos direitos das partes. ”

Arruda Alvim, eminente professor, também escreveu que o princípio da oralidade nasceu inflacionadamente, tendo sido reduzido aos seus devidos termos. E, considerou que o auge da oralidade não reside, como consignado por Chiovenda e abonado por Liebman no debate oral realizado pelos advogados, mas sim, na aplicação do princípio[4] da imediatidade do juiz, de seu contato direto com a prova oralmente recebida que é sublinhado pela concentração, para que as imagens e provas colhidas pelo juiz não esmaeçam de sua memória pelo decurso do tempo e, pela regra da identidade física do julgado – o juiz que julga deve ser, sempre que possível, o mesmo que desfrutou das vantagens do contato imediato como prova oral.

Desde do CPC de 1939 tentamos sem êxito enfatizar a tônica da oralidade e do contraditório[5] no debate verbal realizado em audiência, e, para tanto, tornou a audiência como ato essencial do procedimento ordinário.

No entanto, o Código Buzaid reduziu a oralidade àquilo que seja essencial, ou seja, para consagrá-la onde se imponha como imprescindível para a apuração dos fatos a serem emergidos da prova oral.

Acentuou ainda Arruda Alvim a universalidade da atenuação do princípio da oralidade tal como inicialmente fora formulado, citando que na própria Alemanha, o professor Fritz Baur, observou também que o princípio da oralidade, pelo menos com a referida alta intensidade, é uma irrealidade e é impraticável.

A admissão pelo legislador brasileiro da possibilidade do julgamento antecipado da lide, com a abolição da audiência veio a reduzir a oralidade às suas verdadeiras e úteis dimensões. Pois o que importa é a justa composição da lide, ou seja, a imediação que é compatível com o processo escrito.

Afinal na Alemanha cresceu a convicção de que a oralidade e a imediatidade não podem ser óbices à realização rápida e econômica do processo, cabendo ao juiz ponderar e sopesar caso a caso, a utilidade desses princípios, que somente serão aplicáveis quando as vantagens inerentes a esses princípios forem maiores que as desvantagens.

A audiência de instrução e julgamento é ato processual complexo, por envolver outros atos e por sua duração, extensão e espaço, onde está presente necessariamente o juiz a preside e dirige, caracteriza-se pelo elevado grau que representa de imediatidade e de concentração.

Resta ainda a lembrança que a audiência é um ato processual obediente ao princípio geral da publicidade, trata-se de ato solene, no sentido da observância de determinadas formalidades, cuja infringência, todavia, regra geral, só acarretará invalidade na medida em que ofendido algum princípio fundamental do processo[6], como o da igualdade das partes dentro do contraditório.

Mas, reconheçamos que atualmente a audiência não se constitui um ato substancial ao processo, ou seja, indispensável à obtenção do julgamento do mérito, eis que o procedimento comum ordinário prevê o julgamento antecipado da lide, com exclusão da audiência, como forma simplificada do procedimento padrão. Havendo ainda a possibilidade de improcedência liminar.

Mais adequada e sóbria fora a definição trazida por Cândido Dinamarco de que a audiência de instrução e julgamento é um ato processual complexo realizado publicamente em primeiro grau de jurisdição e do qual participam o juiz, advogados, testemunhas, serventuários de justiça e as partes, com o objetivo de obter a conciliação destas, realizar a prova oral, o debater a causa e proferir sentença.

É cabível desdobrar as atividades normalmente relacionadas com a audiência, a saber: atos de preparação da audiência; abertura e pregões; tentativa de conciliação e atividades de instrução (depoimentos orais; eventuais juntada de documento); decisões interlocutórias proferidas no decurso da audiência; debates orais (caso não substituídos por posteriores razões finais escritas); prolação de sentença em audiência (caso o juiz não escolha proferi-la posteriormente) e, por fim, a lavratura do termo (pela forma tradicional ou pela forma eletrônica).

A Lei 8.952/94 trouxe a lume a audiência preliminar, no CPC/73, no art. 331, que nos processos sob rito ordinário será realizada ao término da fase postulatória e após cumpridas as providências preliminares, audiência dotada de múltipla finalidade, a saber: a) tentativa de conciliação; b) atividades finais de saneamento. c) ordenação da instrução probatória; d) designação, se necessária, da audiência de instrução e julgamento. Evidentemente galgada a conciliação amigável da lide, suprime-se os provimentos atinentes as letras b, c e d.

Caso a demanda versar sobre direitos sobre os quais não se possa transigir, a audiência preliminar não se fará necessária e, o juiz irá prover, por decisão de saneamento, quanto aos eventuais vícios processuais e quanto à organização da prova a ser produzida.

A abertura da audiência, com os pregões, é formalidade essencial, afirmou Moacyr Amaral Santos: “a falta de pregão importa em nulidade da audiência, alegável pela parte não apregoada e que por isso não tenha comparecido à mesma. Comparecendo, apesar de não apregoada, sanado estará o vício e válida será a audiência”.

A omissão da formalidade do pregão é causa de nulidade se tiver havido prejuízo para o não-apregoado, por mínimo que seja, o seu interesse. O comparecimento, sem prejuízo, dá validade à audiência.

Realizar-se-ão a portas fechadas, entretanto, as audiências nos casos de processos sob o regime de segredo de justiça, e tais são aqueles previstos no art. 155 do CPC/73 (art. 189 do Novo CPC), apesar de que em regra as audiências sejam públicas. Borges da Rosa, comentando o diploma legal pretérito, arrolou entre os motivos de interesse social aqueles que pudesse causar danos à sociedade, à coletividade, ao País, ao Estado, ao Município e à Justiça ou a outros institutos, repartições ou estabelecimentos de caráter público ou social, ou ao bem-estar, à ordem, à paz, ao sossego, à tranquilidade, à segurança pública, etc.

As hipóteses de segredo de justiça[7] parecem ser taxativas. Mas nos processos que em princípio não tramitam em segredo de justiça, poderá o magistrado determinar, em ocorrendo justo motivo, que algum ato de instrução, como a oitiva de alguma das partes, ou depoimento testemunhal, ou a inspeção na pessoa de alguém, se efetive a portas cerradas.

Na audiência a portas cerradas, permanecem na sala apenas os servidores da justiça (escrivão, meirinho, o representante do Ministério Público, os advogados dos litigantes, além do juiz e do depoente). E, todos presentes ficam vinculados ao dever de sigilo, respondendo no foro criminal e cível pelo descumprimento de tal dever.

Apesar do processo tramitar em segredo em justiça, a abertura da audiência é feita publicamente, com os respectivos pregões. Ocorre divergência doutrinária quanto à manutenção do sigilo no momento da prolação e publicação da sentença na audiência.

Ressaltando-se que o CPC vigente restringe a possibilidade de obter certidão do dispositivo da sentença apenas ao terceiro[8] que demonstra interesse jurídico, mantido, pois in totum o segredo de justiça, salvo para os litigantes e a fundamentação do decisório (art. 189 do Novo CPC).

O CPC/73 retomou a tentativa de conciliação com as velhas origens lusitanas. E, mesmo a Constituição do Império brasileiro em seu art. 161 previa que não se começasse processo algum, sem se fazer constar que se tem intentado o meio da reconciliação, confiado, então, aos juízes de paz eletivos.

A audiência de conciliação só se realizaria quando não se configurar a hipótese de julgamento antecipado da lide. Se, para formar o seu convencimento, necessitar o magistrado de outros elementos probatórios, quando se passará à instrução.

Há ainda segunda tentativa conciliatória que pode ser promovida no início da audiência de instrução e julgamento. Dinamarco observou que a audiência preliminar é destinada precipuamente às atividades tendentes à conciliação, e manda proceder ao início da audiência de instrução e julgamento. Afinal, afirma o grande processualista paulista que seria arbitrário suprimir a segunda tentativa de conciliar, quando as tendências do tempo são ampliativas da atividade conciliatória.

A franca valorização dos meios alternativos de solução dos conflitos é uma linha bem traçada através das ondas renovatórias do processo civil brasileiro e, hoje a tentativa de conciliar está incluída, pela própria Reforma, entre os deveres fundamentais do juiz[9]. Por essa razão o atual teor do art. 125, inciso IV do CPC/73(art. 139 do Novo CPC) que informa que compete ao juiz, a qualquer tempo, tentar conciliar as partes.

Frise-se que a sentença homologatória de conciliação ou de transação poderia versar a questão mesmo que não estivesse em juízo, isto é, alheia à res in iudicium deducta, mas mesmo assim constituía título executivo judicial.

Neste ponto, a circunstância de que a Lei 9.307/97 relativa à arbitragem, houvesse a alterado a redação inadvertidamente omitindo a referência à questão não posta em juízo. A tese, embora tal omissão, permanecia a mesma. Para aplacar as dúvidas, veio a Lei 10.358/2001 que arrolou entre os títulos executivos judiciais: a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que verse matéria não posta em juízo e a sentença arbitral.

Versando a lide sobre direitos patrimoniais de caráter privado impende ao juiz o dever de tentar a conciliação, que constitui, como que um ponto de encontro entre a autocomposição e heterocomposição da lide. As próprias partes fixam o conteúdo do ato (geralmente uma transação, mais raramente o reconhecimento do pedido ou renúncia à pretensão), mas assim agem debaixo da mediação e sugestões do magistrado, que buscará leva-las a uma solução conforme com equidade e que não traga em si o germe de novos litígios ou contenha cláusula ofensiva a normas jurídicas cogentes.

Obtida a conciliação, que inclusive pode versar, questões alheias à coisa julgada, suas cláusulas são consignadas no termo da audiência, seguindo-se a sentença homologatória e o encerramento da audiência.

Transitada a sentença em julgado, os efeitos do negócio jurídico material adquirem a imutabilidade e indiscutibilidade próprias da coisa julgada material (pois terão valor de sentença). É como se houvera julgamento de mérito, pois a conciliação e a sentença agem simultânea e imediatamente sulla lite e sul processo. Não obtida a conciliação, ou se houver apenas parcialmente o acordo, a audiência prosseguirá.

Em se participando pessoa jurídica de direito público[10], não é de se tentar, em regra a conciliação das partes, em face da indisponibilidade do interesse público, subjacente à pretensão ou à defesa.

Curial salientar é se o juiz não deverá incluir no termo de audiência as ofertas e recusas de propostas conciliatórias, quando infrutíferas. Pois tal conduta importaria em enfraquecer a posição da parte, e ninguém mais se animaria às tentativas conciliatórias se pudessem, praticamente, importar em virtual reconhecimento de direitos alheios.

Os dados colhidos na fase conciliatória não podem influenciar o juiz sobre o conteúdo das provas, quando as afirmações que advenham das partes ainda devam ser confirmadas pelas provas.

A lei processual impõe ao juiz o dever de tentar a conciliação. Mas, as partes, todavia não estão obrigadas ao comparecimento pois não consta nenhuma sanção para os casos de inobservação da intimação. Mas, por outro lado, o Novo CPC impôs a todos os sujeitos do processo, o dever de colaboração e, ainda, a construção de contraditório participativo. Assim, em regra realizar-se-á a audiência de conciliação, e as demais hipóteses de sua não realização correspondem a honrosas exceções.

Cumpre notar que a pena de confissão no caso de a parte apesar de intimada para prestar depoimento pessoal, e que não se aplica no caso de chamamento apenas para a tentativa de conciliação.

É razoável a possibilidade de aparte, ser pessoa jurídica, fazendo-se presente na audiência para efeito de conciliação, por preposto, devidamente credenciado pelo órgão da pessoa jurídica. Mas, para a conciliação possa merecer a devida homologação, é naturalmente necessário que o preposto, ou o advogado disponha dos necessários poderes (poder de transigir). A ausência da parte, devidamente simplesmente recusa à conciliação. O juiz mandará consignar tal circunstância e prosseguirá a audiência.

A ausência do advogado da parte à audiência significa que está processualmente ausente. Todavia, a orientação dominante é no sentido de que a conciliação em audiência pode processualmente se realizar mesmo sem a presença de advogado.

Pontes de Miranda acentuou que os pressupostos para a conciliação são os que existem para os atos constitutivos das partes (capacidade de ser parte, capacidade processual e poder de representação legal). O que se há de exigir para a conciliação é que o sistema jurídico, no plano de Direito Privado (ou público) faz obrigatório para a existência e a validade dos negócios jurídicos, especialmente das transações.

Tema outrora polêmico, era saber se necessário que a parte fosse intimada pessoalmente para o comparecimento à audiência ou se admitiria que tal intimação fosse feita na pessoa de seu advogado, munido de poderes de transigir.

De alta relevância prática e doutrinária é a consequência da omissão das tentativas de conciliação, no plano da validade da audiência realizada e da sentença proferida não obstante dita omissão.

A disponibilidade da pretensão de direito material, notadamente direitos patrimoniais de caráter privado, torna defesa a aplicação de sanção de nulidade.  Obtida a conciliação, composta estará a lide e se extinguirá o processo. Assim, prosseguirá a audiência, sendo válidos todos os atos processuais até então praticados, pois evidenciada a impossibilidade da autocomposição do litígio e a necessidade de heterocomposição.

Prevalente é a orientação adotada pelo Superior Tribunal de Justiça: “Conciliação. Não se anula o processo para retornar à fase da conciliação, se já proferida a sentença e composta a lide pela manifestação judicial”. (REsp 207.785, 4ª Turma, Rel. min. Ruy Rosado de Aguar, ac. 19.08.1999, DJU 03.11.1999, p.118).

Pontes de Miranda ainda nos ensinou que “o procedimento conciliatório é pressuposto do procedimento contencioso, mas não da sentença de mérito”, concluiu que se o juiz determinar o comparecimento das partes e tentar conciliá-las, daí não resulta nulidade da sentença: o pressuposto é do procedimento contencioso, nas espécies que alei aponta, porém não de sentença. Trata-se como mencionou a legislação germânica de 1924 de acomodação voluntária da disputa jurídica.

Registrou Alfredo Buzaid que por influência do Direito Romano e com sua evolução o direito europeu construiu duas soluções bem similares: a da audiência preliminar e do despacho saneador.

A primeira solução surgirá na Itália em 1834 a prima udienza ou audiência preparatória transplantou-se para a Zivilprozessordnung alemã (ZPO) e para o Código de Processo Civil austríaco, onde o juiz resolve toda a questão que não seja de mérito. Mas apesar de conter matéria puramente processual poderá conduzir à uma resolução de mérito seja quando ocorre acordo ou renúncia.

Também conheceram a prima udienza os escoceses em 1868 e, depois, os ingleses (1883) que criaram a summons for directions que dividia o processo britânico em dois: a primeira fase de atividades preparatórias e a segunda fase destinada à decisão do mérito da causa.

Nos EUA deu-se a simplificação do processo, verificando os juízes que num exame preliminar poderiam solucionar amigavelmente, grande número de feitos, antes do julgamento da questão principal, ou pelo menos, conseguiria elucidar boa parte das questões.

As audiências pré-trial (que labora um julgamento preparatório) que rapidamente se difundiu nos EUA. Todas essas experiências servem para buscar uma simplificação tornando o processo num hábil instrumento para a bora administração da justiça.

Anotou Galeno Lacerda que apenas quatro a cinco por cento das ações propostas perante os tribunais ingleses chegam à audiência de julgamento, a maioria se resolve na fase preliminar, na audiência de summons for directions.

Outra vantagem trazida pela Lei 10.44/2002 foi o saneamento[11] oral, sem eliminar o despacho saneador, o que serve para imprimir maior celeridade ao processo e uma rápida prestação jurisdicional.

A audiência preliminar segundo Cândido Dinamarco seria palco da conciliação e da organização do processo, concentrando-se, num único momento, a conciliação e saneamento, dando oportunidade aos advogados das partes de expor suas razões sobre as questões e provas diretamente ao juiz. Também a instrução se dimensiona ao necessário para o deslinde da controvérsia.

De regra, os direitos dos entes públicos (tais como União, Estados, municípios e autarquias) são considerados como direitos indisponíveis, portanto, entende-se ser dispensável a conciliação. Mas seria um equívoco identificar a natureza do direito material dos entes públicos[12] com a possibilidade de transação.

Apesar de que, de regra, esses direitos sejam intransigíveis posto que os procuradores não dispõem de poder de disposição, sem estarem expressamente autorizados. Até que a Lei Orgânica da Advocacia Geral da União dispõe a atribuição do Advogado-Geral da União: “VI – desistir, transigir e firmar compromisso nas ações de interesse da União nos termos da legislação vigente”.

De sorte que a possibilidade de transação dependerá muitas vezes, da posição do ente público no processo, seja autor ou réu, bem como da índole da controvérsia até antes da natureza do direito.

Frise-se que a conciliação nem sempre depende da natureza do direito, estando antes relacionada ao grau de interesse que o ente público tenha na demanda. Embora indisponíveis os direitos e educação dos filhos e, etc., nada impede a transação sobre estes; da mesma forma, os direitos provenientes de acidente do trabalho são indisponíveis, dado o seu caráter alimentar, o que não impede a transação das partes.

Sergio Bermudes ressalta que a conciliação pode recair também sobre direitos indisponíveis, como os alimentos quando as partes podem acordar quanto ao valor da prestação; o investigado pode reconhecer, espontaneamente, a paternidade no curso do processo de investigação. E, conclui: “Enquanto não corrigido o defeito da lei, pode ele ser reparado, quando aos direitos indisponíveis suscetíveis de composição, mediante a aplicação do art. 125, IV.

Apesar disso, reafirma Dinamarco que é corretíssima a exclusão da conciliação da audiência preliminar relativamente às causas que versem sobre direitos indisponíveis.

Quando a demanda não comportar, ainda que em tese, a transação, à qual se destina precipuamente a audiência prévia, é evidente a desnecessidade de sua designação, para os demais fins a que alude, podendo tais questões ser resolvidas por simples despacho, fora dela.

Mas a audiência prévia ou de conciliação serviu para imprimir maior agilidade ao processo, com economia de atividade processual, e não transformar em orais a prática de atos processuais, que podem ser, de imediato e normalmente praticados por escrito. Mas, Dinamarco acreditava que a audiência preliminar se realizaria no procedimento ordinário brasileiro, sempre, a não ser quando extinto o feito antes dela.

Havendo circunstâncias da causa que evidenciam ser improvável a conciliação, o juiz poderá, desde logo, sanear o processo e ordenar a produção da prova. Assim o saneamento será de rigor se houver alguma irregularidade a ser corrigida, ou houver necessidade de deferimento de prova, a ser produzida na audiência, pois, do contrário, deverá proceder ao julgamento antecipado da lide.

A sistemática da reforma do CPC/73 foi no sentido de aproveitar ao máximo a audiência prévia, mesmo quando não se tenha o êxito da conciliação, para preparar o feito para os atos finais, fixando os pontos controvertidos, decidindo as questões processuais pendentes, determinando as provas a serem produzidas e, designando a audiência de instrução e julgamento.

O prazo para realização da audiência prévia no CPC/73 era meramente programático ou prazo impróprio, e sendo ultrapassado, não gera mais que eventuais consequências de ordem correicional, quando injustificável o excesso.

O ponto de divergência ou ponto controvertido nada mais é do que questão de fato ou de direito que cumpre ao juiz resolver. Assim ensinava Carnelutti para quem toda afirmação contida nas razões (da pretensão ou da contestação), a respeito da qual surge uma dúvida, torna-se uma questão.

Em outras palavras, a questão é o ponto duvidoso, de fato ou de direito, e sua noção é correlata à noção de afirmação. Não há dúvida de que a expressão ponto controvertido traduz, o que realmente pretendeu traduzir, ou seja, ponto a respeito do qual instaurou-se uma controvérsia.

Registrou Galeno Lacerda que a audiência preparatória do direito alemão tinha, igualmente, por função principal, além da tentativa de conciliação, fixar o ponto litigioso para efeito da delimitação da prova e possível discussão da causa em uma só audiência perante o colégio.

O significado real de “fixar pontos controvertidos” é mais do resumir o que alegaram as partes, do que simples asserção do que afirmaram, compreende, a um só tempo, as questões de fato e as questões de direito. Na linguagem de Pontes de Miranda, é o momento de pôr, “os pontos nos iis”.

A crítica de Sergio Bermudes é injusta, de que o primeiro ponto da atividade do juiz é a decisão das questões processuais pendentes, vindo só depois os pontos controvertidos, sobre os quais devem recair a prova. Além de a prova não incidir apenas sobre os pontos controvertidos, poderá ir sobre a questão processual, como, por exemplo, o domicílio, para fins de determinação do foro, compreendem-se neles igualmente as questões de direito, que, no geral, não carecem de prova.

Dispõe os Códigos italiano[13] e português dispõem que o juiz regulando a discussão em audiência, determina os pontos sobre os quais esta deve desenvolver-se, assim o magistrado selecionará, dentre os fatos articulados, os que interessam à decisão da causa.

Evidentemente os advogados podem e devem influir na fixação dos pontos controvertidos, fazendo ver ao juiz, os eventuais equívocos que haja cometido, como por exemplo, incluindo pontos incontrovertidos e, não obtendo sucesso, devem recorrer da decisão, sob penda de preclusão.

Embora essa providência tenha também o propósito de depurar a discussão, restringindo-a ao que interessa realmente ao julgamento da causa, recomenda-se, todavia, cautela aos magistrados, evitando recursos que possam comprometer a celeridade do processo.

Registrem-se, por oportunas, as seguintes observações de Pedro Batista Martins comentando o art. 269 do CPC/39 que guarda correspondência com o art. 331, segundo parágrafo do CPC/73 (e que por sua vez, corresponde ao art. 357 do Novo CPC): “Não é do espírito da lei investir o juiz da autoridade soberana de ditar os rumos da discussão. Ele fixará o objeto da demanda e os pontos em que se manifestou a divergência. Mas o advogado que com semelhante orientação não se conformar, poderá advertir o juiz da inconveniência de adscrever-se a discussão dos pontos cujos exame lhe pareça de utilidade.

A formalidade foi instituída, antes, com a preocupação de aumentar os meios de controle do advogado, que poderá, através da orientação traçada pelo juiz, verificar se ele se acha cumpridamente informado das questões suscitadas no processo. Se o juiz recomendar à discussão teses que não interessem aos debates e omitir outras que aos advogados pareçam imprescindíveis, ou mesmo úteis, poderão eles chamar o juiz desalento à realidade, prevalecendo-se do ensejo para lhe dar os necessários esclarecimentos”.

O mesmo registro é igualmente realizado por Frederico Marques, nas suas Instituições de Direito Processual Civil. Para evitar recursos, deve o juiz oportunizar às partes a indicação dos pontos que entendam merecer discussão.

O objeto da demanda é caracterizado pelo pedido e causa de pedir com referência à defesa que se lhes contrapôs; na fixação dos pontos controvertidos ou de divergência, deve o juiz pôr em relevo o contraditório, as afirmações de uma parte que não coincidem com os da outra.  Traduzindo, o objeto da demanda é determinado em função do pedido que demarca a res iudicanda, enquanto os pontos de divergências se condensam na controvérsia sobre questões de fato e de direito constitutivas do objeto lógico da decisão.

No sentido de propor a simplificação, a tentativa de conciliação no limiar do processo de conhecimento, antes da integração definitiva da lide, com o que tornaria dispensável a constituição do advogado e desnecessária a apresentação da própria defesa.

No CPC/73 já existe a faculdade do juiz expressa no art. 125, inciso IV onde se lê que compete-lhe tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.

Assim a conciliação in limine litis fora prevista no procedimento sumário (que fora suprimido pelo Novo CPC) que previa que a apresentação da defesa apenas ocorreria quando não for obtida a conciliação. E, tal possibilidade se dava em razão da total concentração de atos processuais numa única audiência (que reúne a defesa, instrução e decisão), o que não ocorre no procedimento ordinário, composto de três fases distintas que devem ser cumpridas ao longo do trajeto procedimental.

Frise-se que as partes deverão comparecer ou seus procuradores habilitados a transigir pois nessa audiência tem lugar não só a tentativa de conciliação, mas, também diversos atos processuais tais como a fixação de pontos controvertidos, decisão de questões processuais pendentes, determinação das provas a serem produzidas, sujeitos aos efeitos da preclusão.

Cumpre assinalar que diante da fixação judicial dos pontos controvertidos, caberão aos advogados prover participação ativa na audiência, não apenas referente a tal fixação, mas igualmente na determinação dos meios de provas, a exigir muitas vezes esclarecimentos sobre a sua utilidade.

Em geral, na prática, os advogados realizam um protesto genérico por provas, tornando necessária sua especificação, devendo estarem presentes à audiência, sob pena de preclusão.

Como os princípios da economia e celeridade processuais aconselham que não se perca audiência, para se possa realizar algum ato processual, e caso as partes houverem comparecido à audiência prévia, apesar de ausentes seus advogados (tenham ou não sido regularmente intimados ou citados) nada impede que prossiga o juiz na tentativa de conciliação, por se tratar de ato que envolva exclusivamente as partes e o juiz.

Conclui-se que a participação das partes, na conciliação, exclui a de seus patronos e, vice-versa, a dos patronos habilitados a transigir exclui a das partes. Ressalve-se que a conciliação em tais condições não determina, por si só, a nulidade do ato, salvo, se ausente o patrono por defeito de comunicação processual e for comprovado o eventual prejuízo à parte. O que reafirma o princípio pas nullité sans grief.

Todavia, caso o juiz constate que a ausência dos advogados decorreu de falha ou defeito de intimação, pode tudo o mais, provendo então através de despacho saneador escrito, ou na própria audiência, intimando-se, depois, as partes, para ciência da decisão; em nova audiência, caso entenda proceder ao saneamento oral (intimando-se igualmente as partes).

No que tange as questões processuais pendentes, não há dúvida que alcança igualmente os pressupostos processuais, as condições da ação e toda questão de índole eminentemente processual ou procedimental, excluídas, naturalmente, as questões de mérito.

A decisão que fixar os pontos controvertidos é interlocutória, bem como a que deferir provas e designar a audiência de instrução e julgamento, ou que resolver as questões sem importar em sacrifício da relação processual. No entanto, será decisão terminativa, se resolvendo a questão processual, vier a extinguir o processo sem resolução do mérito.

Não se impõe a realização da audiência prévia de conciliação quando a questão de mérito for unicamente de direito ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência (inciso I) e quando ocorrer à revelia (inciso II), além do que expressa, que aquelas providências somente terão lugar, se necessário.

Enfim, só haverá a audiência prévia se, não sendo caso de julgamento antecipado da lide, for transigível o direito; do contrário, será desnecessária, a não ser que tenha o juiz fundados motivos para considerar possível a conciliação.

Evidentemente que os advogados não devem pretender a designação de audiência prévia, com intuito protelatório, nem os juízes designá-la quando for a hipótese comporte julgamento antecipado da lide.

Institui-se no Brasil, conforme nos informa Didier Jr, a política pública de tratamento adequado dos conflitos jurídicos, com evidente estímulo à solução por autocomposição conforme o teor da Resolução 125/2012 do Conselho Nacional de Justiça.

Enxerga-se na solução negocial processual não é apenas meio eficaz e econômico para a resolução dos litígios, sendo relevante instrumento de desenvolvimento da cidadania, em que os interessados passam a ser protagonistas da construção da decisão jurídica que regula as suas relações.

O CNJ tem atuado como relevante papel como gestor desta política pública, no âmbito do Poder Judiciário, reafirmando que o Estado promoverá sempre a possível a solução consensual dos conflitos. Até mesmo na seara do Poder Executivo, a solução autocompositiva é estimulada havendo a possibilidade de acordos de parcelamento de dívidas fiscais e de instauração de câmaras administrativas de conciliação revelam bem esta tendência.

Mediação e conciliação são formas de solução de conflito pelas quais um terceiro intervém em processo negocial, com a função de auxiliar as partes a chegar a solução da lide. Ao terceiro não caberá resolver o problema, conforme acontece na arbitragem. O mediador ou conciliador exerce um papel de catalisador da solução negocial do conflito.

Ambas são técnicas que costumam ser apresentadas como principais exemplos de solução alternativa de controvérsias, que corresponde a sigla ADR que em inglês significa alternative, dispute resolution.

É fato que a diferença entra as duas técnicas é sutil. A doutrina costuma considera-las como técnicas distintas para a obtenção de autocomposição.

O conciliador tem uma participação mais ativa no processo de negociação, podendo, inclusive, sugerir soluções para o litígio. O mediador exerce um papel um pouco diverso. Cabe a ele servir como veículo de comunicação entre os interessados, sendo facilitador do diálogo[14] entre os litigantes, auxiliando-os a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que possam identificar, por si mesmos, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

Na técnica de mediação, o mediador não propõe soluções aos interessados. É mais indicada nos casos onde exista uma relação anterior e permanente entre os interessados, como nos casos de conflitos societários e familiares. O êxito da mediação ocorre quando se consegue construir a solução negociada do conflito.

Os parágrafos segundo e terceiro do art. 165 do Novo CPC ratificam essa diferenciação. E, em ambos casos, veda-se a utilização, pelo terceiro, de qualquer tipo de constrangimento ou intimação para que as partes conciliem.

Cumpre ainda destacar os arts. 308, terceiro parágrafo, art. 303, inciso II, art. 329 e ainda o art. 334, quarto parágrafo do Novo CPC[15] quando se tem as hipóteses em que não será realizada a audiência de conciliação ou mediação (o que representa uma exceção).

A mediação e conciliação podem ocorrer também extrajudicialmente, mesmo quando já existente o processo judicial. Neste último caso, o mediador e conciliador são auxiliares da justiça.

E, tal qualificação é relevante, pois a estes devem ser aplicadas as regras relativas ao impedimento e suspeição (arts. 148, III, 170 e 173, II do Novo CPC). Tanto o mediador e o conciliador são vinculados à Administração Pública (vide arts. 167, 174 e 175 do Novo CPC). Sendo importante que se trate de atividade remunerada, até mesmo que exista aprimoramento no nível desses auxiliares da justiça. Mas, não impede que sejam feitas pro bono, como trabalho voluntário.

Os interessados podem escolher consensualmente, o mediador e conciliador e a câmara privada para a realização da autocomposição e pode recair em profissional que não esteja cadastrado perante o tribunal. Mas, nesse caso, será preciso providenciar este cadastro.

A relevância do cadastro pois tais auxiliares da justiça deverão passar por curso de capacitação, cujo o programa é definido pelo mesmo CNJ em conjunto com o Ministério da Justiça, além de se submeterem as reciclagens periódicas.

A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, do autorregramento da vontade, da normalização do conflito, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada (art. 166 do Novo CPC).

O princípio da autorregramento da vontade é corolário da liberdade. Assim tudo é projetado para que as partes definam a melhor solução para o seu problema jurídico. A respeito à vontade das partes é absolutamente fundamental, podendo ser considerado, aliás, o princípio mais importante no particular. O mediador e o conciliador, estão, por essa razão, proibidos de constranger os interessados ou litigantes à autocomposição.

Pode a vontade das partes direcionar-se no sentido de definir as regras procedimentais da mediação ou conciliação, e naturalmente, até mesmo, à extinção do procedimento negocial.

A confidencialidade abarca a todas informações produzidas ao longo do procedimento autocompositivo, cujo teor não poderá ser usado para fim diverso daquele previsto pela expressa deliberação das partes. Portanto, conclui-se que o mediador e conciliador têm o dever de sigilo profissional.

A oralidade e a informalidade orientam a mediação e conciliação. É recomendável que a negociação se realize em ambiente tranquilo, se possível sem atritos, barulhos, e num ambienta onde todos os aspectos coadunam para haver um diálogo franco e tranquilo o que reforça a prática da oralidade e informalidade.

Com razão, Didier Jr., faz crítica sensata ao aduzir que a autocomposição não pode ser encarada como remédio para todos os males, e nem deve ser vista como forma de diminuição de causas que tramitam no Judiciário ou técnica de aceleração de processos.

Em verdade, há valores subjacentes à política pública de dar tratamento adequado dos conflitos jurídicos, com incentivo à participação do indivíduo na elaboração da norma jurídica que regulará o seu caso e o respeito a sua liberdade, concretizado no direito ao autorregramento[16] e o acesso à justiça.

Adverte o notável jurista baiano que é ilícita a postura de alguns magistrados que constrangem as partes à realização de acordos judicial. Aliás, nada recomendável que o juiz da causa exerça as funções de mediador e conciliador. Principalmente quando há desequilíbrio de forças entre os litigantes o que é fator comum a levar as partes a pactuarem acordo lesivo ao seu interesse.

Há de se alertar que a tentativa de conciliação não é uma novidade no ordenamento jurídico brasileiro. Ao revés, já sofreu diferentes momentos, uns favoráveis, outros nem tanto, conforme se possa extrair das seguintes passagens em nosso direito positivo, a saber: art. 164 da Constituição Imperial de 1824 que obrigava a tentativa de conciliação; o art. 5º da Lei Imperial de 13.10.1827, que impunha ao Juiz de Paz a tentativa de conciliar as partes; as Ordenações Afonsinas e as Ordenações Filipinas (Livro III, Título XX,§ 1º) que previam a tentativa de conciliação; o Regulamento 737, que reservava capítulo acerca da tentativa de conciliação no tocante às causas comerciais; o Decreto 1.030, de 1980, Lei 1.138, de 1905, o Decreto 5.433, de 1905 e o Decreto 5.561, de 1905, que durante o Governo Republicano suprimiram as formas de conciliação até então existentes; os arts. 847 e 850 que na CLT garantiam dois momentos à tentativa de conciliação; a Lei 968 de 10.12.1949, que tratava da conciliação no procedimento de desquite litigioso; e, o Código de 1973.

Deve-se considerar os ensinamentos de Carnelutti, ao afirmar que exclusivamente por meio da vida em sociedade os homens podem atender grande parte das suas necessidades, e porquanto a guerra entre eles desagrega a sociedade, a composição dos conflitos se converte em interesse coletivo.

A audiência preliminar marcou uma das principais mudanças concebidas pela reforma do processo civil brasileiro e contribuiu decisivamente para a aceleração da prestação jurisdicional, seja pelo fim amigável do litígio, seja pela facilitação e organização do prosseguimento do processo.

Ademais a audiência apresenta diferentes e relevantes funções à adequada solução da lide, destacando-se: a) conciliação; b) saneamento do processo; c) a fixação de pontos controvertidos; d) a determinação das provas a serem produzidas.

A exposição de motivos da Lei 3.376 de 2000 merece ser destacada para se entender a real dimensão da tentativa de conciliação:  “Substitui-se a expressão “direitos disponíveis” pela expressão, bem mais abrangente, “direitos que admitam transação”. De outra parte, a expressão “ audiência de conciliação” apresenta-se imprópria, porquanto se cuida de ato processual complexo destinado à tentativa de conciliação, ao saneamento das questões processuais pendentes, à ordenação das provas e à designação, se necessária, da audiência de instrução e julgamento: daí a nova denominação alvitrada “audiência preliminar”. (...).

Além disso, o projeto acrescenta ao art. 331 um §3º, tornando explícito que se o direito em lide não admitir transação, poderá ser dispensada a própria audiência preliminar, lançando o juiz nos autos, desde logo, a decisão de saneamento e ordenação da prova (orientação preconizada por José Carlos Barbosa Moreira). Assim também se as circunstâncias da causa evidenciarem ser improvável a transação naquele momento processual. Por fim, permite-se que a parte possa fazer-se representar por procurador ou preposto com poderes para transigir, permissão útil, v.g., para as pessoas jurídicas de maior porte”.

Barbosa Moreira referiu-se que: “a introdução da audiência destinada primordialmente à tentativa de conciliação das partes é uma face de dois gumes. Pode, se vingar à tentativa, abreviar o feito de modo considerável. No caso contrário, porém, alonga o curso do processo, sem outros ganhos que o da fixação imediata dos pontos controvertidos, o da solução das questões processuais pendentes, o da determinação das provas a serem produzidas e o da designação, se necessário, da audiência de instrução julgamento. (In: Moreira, J.C. Barbosa. Reformas processuais, Jornais Síntese, n. 25, pp.1-6, março 1996c).

É verdade que o CPC/73 elegeu o vocábulo “transação”, mas, sem dúvida, esta não repele o propósito de se enfrentar o tema da audiência relacionado ao instituto da conciliação. O emprego do termo “transação” evidentemente segue versando sobre o interesse conciliatório das partes.

A respeito das eventuais diferenças entre conciliação e transação, já elucidou Athos Gusmão Carneiro: “ A conciliação diverge da transação pelo seu caráter de ato praticado do curso do processo, mediante a iniciativa e com a intervenção do magistrado; por seu conteúdo substancial, nem sempre implicando recíprocas concessões; pelas consequências de ordem processual. Estas últimas, entretanto, podem ser comuns à transação avençada diretamente pelas partes fora do processo, e comunicadas ao juiz ora como causa de cessação do objeto do litígio, ora para obter a homologação e a executoriedade do acordo que estabeleça prestações a serem cumpridas. (In: CARNEIRO, Athos Gusmão. A conciliação no novo código de processo civil. Porto Alegre: AJURIS, 1974).

A procura da conciliação é fenômeno que há muito vem sendo destacado pela doutrina, conforme demonstram as palavras de Piero Calamandrei, aliás alegou que a ênfase à função conciliadora, multiplicando as intervenções fora e dentro do processo, não deve ser interpretada como indício de pouca confiança na Justiça nem como desvalorização da luta pelo direito, cuja utilidade social deve ser particularmente sentida em um ordenamento baseado no princípio da legalidade.  Se a função da conciliação fosse a de calar o sentido jurídico dos cidadãos, habituando-os a preferir às sentenças justas as soluções menos cansativas de cômoda renúncia, a mesma estaria em antítese com os fins da Justiça, e não poderia encontrar lugar novo Processo Civil, que trata de reforçar a autoridade do juiz no Estado.

Em outros países, a simpatia com que se enxerga a conciliação (outra manifestação da tendência, já observada, que queria transformar todo o Processo Civil em jurisdição voluntária) é baseada num sentimento de crescente ceticismo com a legalidade e com a Justiça judiciária, tanto que até se criou um termo irônico (decisionismus) para definir a ilusão daqueles que acreditam poder resolver todos os conflitos com uma decisão segundo o Direito; pode ocorrer, assim, que o prestígio que se dá à função conciliadora esteja de acordo com descrédito dado à legalidade, e indique um retorno à concepção da Justiça como mera pacificadora social”.

Já Francesco Carnelutti apontou: “Na realidade, contudo, as enormes dificuldades de uma boa organização do processo agravam seu custo, comprometem seu rendimento e contribuem para que a solução contratual predomine notavelmente no equilíbrio sobre a solução judicial.

Destarte, em vez da transação, pode ter lugar o reconhecimento jurídico do pedido, a renúncia ao direito ou, até mesmo, a desistência da ação. Sendo que, em tais casos, também há o fim do processo.

Apesar de a tentativa de conciliar se apresente como um dever do julgador, as partes não suportam qualquer espécie de penalidade pelo seu não-comparecimento à audiência preliminar. Ainda que haja a ausência dos advogados terá a mesma sorte, ou seja, nenhuma penalidade, ressalvada a ausência de oportunidade de apresentar manifestação sobre: de eventual saneamento do feito; da fixação de pontos controvertidos; as determinações das provas a serem produzidas.

E, sobre tais decisões, inclusive, julga-se desnecessária futura intimação, desde que procedida de forma correta a cientificação sobre a audiência preliminar.

Mas, há de se mudar a mentalidade vigente e tornar mais efetivos os princípios de oralidade e da concentração, tão almejados desde o Código Buzaid reformado, para que seja cumprido o ônus do comparecimento à audiência de conciliação.

A oitiva do Ministério Público deve ser verificada conforme o caso concreto. A fim de que se avaliada a possibilidade de ser obtida uma transação, sem prejuízo das exigências legais, como por exemplo, a autorização do representante legal de menor.

Mudou-se a orientação sobre a obrigatoriedade da audiência de conciliação, pois não dependerá apenas da vontade das partes e nem do arbítrio do julgador, trata-se de ato obrigatório, sob pena de nulidade, exceto as hipóteses que o Novo CPC prevê como cabíveis para a sua não realização.

Conveniente frisar que estando presentes os litigantes, desde que sejam maiores e capazes, pouco importa a presença de seus advogados, no que tange à tentativa de conciliação. É que, existindo o interesse na solução da lide, deverá o juiz incentivar e validar tal medida, embora seja obviamente conveniente o auxílio dos advogados.

Enfim, o processo pós-moderno, visto como instituição, não atende as lições de Maurice Hauriou ou dos administrativistas franceses do século XIX ou dos juristas das décadas do século XX, sequer pelas posições sociológicas de Guasp e Morel, mas pelo grau de autonomia jurídica como se desponta no discurso de nosso vigente texto constitucional, reafirmando-se como conquista histórica da cidadania fundamentada em princípios e institutos de inerência universalizante e ampliativa.

Não se pode admitir no âmbito do Estado Democrático de Direito, a hierarquia existente entre as instituições jurídicas ou a prevalência de uma sobre as outras no bojo constitucional, como se fossem caixas de ferramentas à escolha e a serviço do Estado absoluto e totalitário.

Nesse diapasão, se propõe a construção de uma teoria do processo à luz do Estado Democrático de Direito, onde a evolução não é só considerá-lo como procedimento em contraditório, mas como uma instituição jurídica, definida e constitucionalizada, ligada às condições de legitimação das decisões judiciais e alinhadas ao paradigma do Estado Constitucional.

Urge, então, a necessidade de redimensionarmos a Ciência do Processo e construirmos uma teoria avançada à luz do Estado Constitucional, onde a evolução do processo vai além de ser mero procedimento em contraditório, mas como uma instituição jurídica e constitucional ajustada a propiciar a pacificação social e a reafirmação da cidadania e da justiça.


Por derradeiro, cumpre registrar e enaltecer a participação importante e produtiva aos debates que permearam o tramitar do CPC de 2015 de Athos Gusmão Carneiro, notável doutrinador, professor  e processualista brasileiro que infelizmente faleceu antes que fosse finalmente sancionado, mas o que não impede, em reconhecer e render sinceras homenagens ao seu labor acadêmico sempre preocupado com o aperfeiçoamento do processo civil brasileiro a fim de atender de forma adequada e eficaz as garantias constitucionais do processo.

Referências:
CALAMANDREI, Piero. Eles, Os Juízes vistos por um advogado. São Paulo: Martins Fortes, 2002.
­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­___________________ . Instituições de Direito Processual Civil. Volumes 1, 2 e 3. São Paulo: Bookseller, 2003.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Audiência de Instrução e Julgamento e Audiências Preliminares. 13ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2007.
CARREIRA ALVIM, José Eduardo. Código de Processo Civil Reformado. 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. 2ª edição. Volumes I, II e III. São Paulo: Bookseller, 2000.
CRUZ E TUCCI, José Rogério. Piero Calamandrei: vida e obra - contribuição para o estudo do processo civil. São Paulo: Editora Migalhas, 2012.
DIDIER JR., Fredie. O Curso de Direito Processual Civil. V.1, 17ª edição. Salvador: Jus Podvm, 2015.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do Código de Processo Civil. 1. ed. São Paulo: Malheiros, 1995.
GALENO LACERDA. Despacho Saneador. Porto Alegre: Sergio Fabris, 1990.
LANES, Júlio César Goulart. Audiências: Conciliação, Saneamento, Prova e Julgamento. 1ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2009.
LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro. São Paulo: J. Bushatsky, 1976.
SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico. 5ª edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
SANDES, Luiz Calixto. A direção do processo e o papel do juiz no princípio Constitucional e Jurisdicional. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/15843-15844-1-PB.pdf Acesso em 03.06.2015.
SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico Conciso. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

Autoras
Gisele Leite
Denise Heuseler



[1] A direção do processo é feita em primeiro lugar pelo impulso procedimental, do qual a lei expressamente indica vide o art. 3º do Novo CPC. Não obstante seja das partes o interesse primário para a solução dos conflitos em que estão envolvidas, nem por isso, se pode desconsiderar que o processo é instrumento público de exercício de uma função pública, que é a jurisdição. Lembrando que o processo não é um negócio ou mesmo um jogo entre os litigantes mais uma instituição estatal voltado a pacificação social.

[2] A evolução das teorias da natureza jurídica do processo, desde a teoria contratualista, passando pela teoria da relação jurídica, atualmente instrumentalista ou relacionista/teleológica, teoria da situação jurídica, teoria do processo como instituição, teoria do processo como procedimento em contraditório ou fazzaliariana chegamos enfim,  a teoria  neoinstitucionalista e, ainda ao neoprocessualismo (a qual se filia o Novo CPC brasileiro), buscando relacionar os conceitos de processo, procedimento, provimento e jurisdição, aos princípios do contraditório, ampla defesa, devido processo legal e isonomia (princípios reconhecidos como fundamentais). É certo que se deve a Büllow que inspirado nos ensinamentos de Búlgaro expôs em 1868, em sua obra intitulada "Teoria dos pressupostos processuais", é considerada o marco inicial da construção da ciência processual e que abriu horizontes para o nascimento da autonomia do processo ante o conteúdo do direito material.
[3] A visão anacrônica sobre os sistemas jurídicos atuais não pode mais ser dicotomizada, colocando-se em lados opostos, aqueles que se encontram atrelados à família romano-germânica, da Civil Law e, de outro lado, aqueles ligados à tradição anglo-americana, da Common Law. Portanto, pode-se dizer que, no sistema italiano, a partir da Carta de 1947, há verdadeira aproximação do sistema da Common Law ao da Civil Law. O mesmo tem ocorrido no sistema judiciário alemão. De fato, a Lei Fundamental de Bonn, de 1949, é expressa em prever, em seu art. 94.2, o efeito vinculante das decisões do Tribunal Constitucional, salientado, ademais, que lei federal disporá sobre a organização e o procedimento, precisando os casos em que seus julgados terão eficácia de lei.
Assim sendo, mostra-se possível dizer que, também, no sistema alemão existe verdadeira aproximação do sistema codificado ao da Common Law.  Em Portugal, segundo José Joaquim Gomes Canotilho (1992, p. 1079/1082), de acordo com o art. 282º/1 da Constituição Portuguesa, as decisões do Tribunal Constitucional possuem força obrigatória geral, demonstrando: a) vinculação geral, ao submeterem o legislador, que não pode reeditar normas julgadas inconstitucionais ou neutralizar a decisão através de convalidação retroativa; b) força de lei, porque tais deliberações, em face do valor normativo que ostentam, espraiam seus efeitos perante as pessoas físicas e coletivas privadas.



[4] Aplica-se também o princípio da subsidiariedade, porém, infelizmente em sua maioria os juízes deixam de sanear o processo e, quando o fazem é exatamente na audiência que pode ser a de conciliação. Tanta a efetiva direção do processo pelo impulso oficial e saneamento constitui fator relevantíssimo para a celeridade da oferta de tutela jurisdicional, evitando tanto as atividades inúteis como os retrocessos indesejáveis.
[5] A garantia constitucional do contraditório igualmente endereça-se ao magistrado, como imperativo de função no processo e, não como mera faculdade. A doutrina mais moderna indica que o art. 16 do Noveau Côde Precédure Civile Français como a expressão da exigência de participar também endereçada ao juiz. O que corrobora o Código Civil Português, em sua atual redação, que estabelece que: "o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo em caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de fato, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre ela se manifestarem (vide art. 3ª, 3 do CPCP).

[6] O princípio do dispositivo resta mitigado e a experiência mostra que o julgador contemporâneo vem suprindo paulatinamente as deficiências probatórias do processo, não se desequilibra por isso, nem se torna parcial. Mas, isso não significa que o juiz deva assumir paternalmente a tutela da parte negligente. Desta forma, a garantia do contraditório lhe exige que saia da postura de indiferença, e percebendo a possível produção probatória que as partes não requereram, tome a iniciativa e manda que haja a dita produção. Também lhe exige para a efetividade da isonomia processual que diligencie que a parte que não pôde ou não soube diligenciar,

[7] Contudo, deve ser anotado que o segredo de justiça se refere aos atos do processo e não à sua própria existência, que sempre será pública. Neste sentido: ―(...). O CPC não explica a extensão do segredo, que afeta todos os atos praticados no processo, como acima ficou dito. Cumpre distinguir, porém, entre o sigilo sobre o conteúdo do processo, que a lei impõe, e o segredo quanto à existência mesma do processo, de que a lei não cogita; não impõe. (...).
[8] A questão relevante é se deve ser dada oportunidade para as partes originárias manifestarem-se quanto ao pedido. Entendendo o julgador, de plano, que o pedido deve ser indeferido, pensamos que tal providência mostra-se desnecessária, até porque não há nulidade sem prejuízo. Havendo possibilidade de ser acolhida a postulação, mostra-se, segundo minha opinião, indispensável a prévia oitiva das partes envolvidas sob pena de restar violado o princípio constitucional do contraditório.

[9] Enfim, o processo contemporâneo repudia a ideia de juiz-Pilatos que, em face da instrução probatória malfeita resigna-se a fazer a injustiça atribuindo à falha aos litigantes e sacrificando o acesso à justiça. O juiz exerce o poder-dever de direção do processo também mediante a atividade de saneamento que é por definição inquisitiva, e, portanto, independente de provocação das partes.

[10] De início, registra-se a posição de que nem todos os direitos relacionados às pessoas de direito público são necessariamente indisponíveis. Há uma série de demandas relacionadas a interesses defendidos pela União e seus entes vinculados que não têm natureza de bem indisponível, como, por exemplo, a questão patrimonial. Assim, se há controvérsia sobre a propriedade de um imóvel instaurada entre uma autarquia e a União, isso certamente não pode ser tratado como direito indisponível.
A Advocacia-Geral da União (AGU) editou, no dia 27 de novembro de 2007, três atos normativos internos, que norteiam as competências e os procedimentos para a solução de controvérsias jurídicas no âmbito da sua Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF). Trata-se do Ato Regimental nº 05, que dispõe sobre a competência, a estrutura e o funcionamento da Consultoria-Geral da União – à qual se vincula a CCAF; da Portaria nº 1.276, que designa equipe de membros da AGU para compor a CCAF; e da Portaria nº 1.281, que regulamenta o deslinde, em sede administrativa, de controvérsias de natureza jurídica entre órgãos e entidades da Administração Federal.  Esses três atos infralegais citados abeberam-se da competência da AGU prevista na Lei Complementar nº 73/1993 (art. 4º, I, X, XI, XIII e XVIII, e § 2º) [01], na Lei nº 9.028/1995 (art. 8º-C) [02] e na Medida Provisória nº 2.180-35/2001 (art. 11).

[11] Sanear significa depurar o processo de imperfeições, deixando-o bom para prosseguir sem questões técnicas a resolver. Outro dever do juiz contemporâneo é o de ter iniciativas probatórias em certos casos.  Posto que a visão tradicionalista do processo, com exagerado apego àquela ideia de um jogo em que ocorre a esgrima das partes com as armas que tiver, levava a crença de que o juiz ao tomar alguma iniciativa de prova, arriscar-se-ia temerariamente a perder a imparcialidade para julgar depois.
[12] Para Ellen Gracie, a maior dificuldade será empregar a mediação na administração pública. Pelo novo CPC, os entes públicos devem instalar câmaras de conciliação e arbitragem. Segundo a ministra aposentada, o problema é que a administração não costuma autorizar seus procuradores a transacionar direitos, nem mesmo para resolver a questão na esfera extrajudicial. “O x dessa questão é essa desconfiança com relação aos procuradores. Isso vai demandar uma mudança de mentalidade” (In: FRANCO, Cintia. A solução consensual de conflitos no novo Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/9012/A-solucao-consensual-de-conflitos-no-novo-Codigo-de-Processo-Civil Acesso em 03.06.2015).

[13] Depois do fim da segunda grande guerra mundial e da queda do fascismo, muitas vozes se erguera em prol de uma nova codificação processual italiana. Os advogados reuniram-se com o Conselho Nacional Forense, presidido por Piero Calamandrei, autor do Código de 1940. Após muitas discussões, veio a Lei 582, de 14 de julho de 1950, enfim, alterou o Código de Processo Civil.
Em resumo, a reforma de 1950 repristinou a citação para uma audiência fixa; suprimiu o regime das preclusões e os relativos poderes discricionários do juiz instrutor, admitindo a recorribilidade das suas decisões, bem como da sentença não definitiva; além de alterar o regime da apelação e a disciplina da iniciativa processual.

[14] Importante ressaltar que o juiz participa ativamente do contraditório também através do diálogo com as partes. E, a contemporânea tendência do processo afastou o irracional dogma que propunha que o juiz que venha expressar seus pensamentos e sentimentos sobre a causa estaria cometendo pré-julgamento, e, portanto, afastando-se do dever sagrado de imparcialidade. Não se perde a equidistância entre os litigantes quando se tenta conciliá-las, e nisto, o direito processual do trabalho tem avançado prudentemente.
[15] Art. 334 § 4º do NCPC, in litteris: “A audiência não será realizada:  I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual; II – quando não se admitir a autocomposição. (...) § 7º A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.  § 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado. (...) § 9º As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos”.
[16] Enfim, pretendemos sair da cultura de litigiosidade para ir em direção da cultura da pacificação e, por isso, andou bem o Novo CPC em prestigiar os meios alternativos de solução de controvérsias, como a conciliação, a mediação e a arbitragem.