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quinta-feira, 1 de agosto de 2024

A Peste

 


A Peste


Algumas palavras sobre palavra “peste”: ela deriva do latim pestis que, longe de designar originalmente uma doença específica, designa toda sorte de calamidade. Exatamente o mesmo se diz da palavra grega leimos, utilizada por Tucídides (430-426 d.C.) para descrever minuciosamente o “flagelo” que atingiu Atenas vinte e cinco anos mais cedo: uma epidemia catastrófica que sobreveio ao mesmo tempo que a guerra do Peloponeso e que os eruditos erroneamente chamaram de “Peste de Atenas”, quando, na realidade, tratava-se plausivelmente do tifo, vindo da Etiópia pela Síria e pela Ásia Menor.


Assim, esse acontecimento permitiu, da parte do grande historiador grego, uma descrição tão dramática quanto detalhada, da qual se lembrarão, bem mais tarde, os autores que quererão retratar a verdadeira peste. Os textos medievais, quanto a eles, utilizam, para designar a Peste Negra, as palavras genéricas mors, morbus, mortalitas ou seus equivalentes vernaculares (como mortalité, em francês). Entretanto, a partir de 1348, as palavras peste e pestilência tendam a tomar um sentido específico, designando apenas a peste verdadeira.



A peste negra foi a mais devastadora das pandemias de que se tem notícia. Aproximadamente um terço de toda população europeia morreu vitimada pela peste. Foi causada pela doença transmitida pelo bacilo Yersínia Pestis que desencadeou a proliferação patológica generalizada que ocorreu na segunda metade do século XIV.


Enfim, a referida peste integrou um conjunto sinistro de acontecimentos que propiciaram a crise da Baixa Idade Média, tais como as revoltas camponesas, a Guerra dos Cem anos e o declínio da cavalaria medieval. Ad comparandum, o número de óbitos por Covid-19 no mundo chegou a cerca de quinze milhões de pessoas, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde).


A peste negra tem sua origem no continente asiático, mais exatamente na China e, sua chegada ao Velho Continente está relacionada às caravanas de comércio que vinham da Ásia através do Mar Mediterrâneo e, aportavam nas cidades costeiras tais como Veneza e Gênova (na Itália).


A principal propagação deu-se por meio de ratos e, principalmente, pulgas infectados com o bacilo, que acabava sendo transmitido às pessoas quando essas eram picadas pelas pulgas, em cujo sistema digestivo a bactéria da peste multiplicava-se. E, num estágio mais avançado, a doença começou a se propagar por via aérea, por meio de espirros e gotículas. Contribuíam com a propagação de doença as precárias condições de higiene e habitação que as cidades e vilas medievais possuíam.


Ocorreu ainda a atribuição da causa da moléstia aos povos estrangeiros, notadamente aos judeus. Os judeus, por não serem da Europa e, desde a Idade Antiga, viveram em constante migração, passando por várias localidades do mundo até se instalarem nos domínios do continente europeu, acabaram por se tornarem o bode expiatório das multidões enfurecidas. E, milhares de judeus foram mortos durante a eclosão da peste.


Por mera ignorância, a população europeia encarou a epidemia como manifestação da ira divina pelos pecados cometidos. Assim, a doença levou ao fortalecimento das manifestações religiosas. Além disso, também gerou manifestações de antissemitismo, pois muitos consideravam os judeus responsáveis pelos surtos.


Na época, como a medicina não tinha satisfatório desenvolvimento científico, não se sabia as causas da peste e tampouco como tratá-la ou mesmo sanear as cidades e vilas. Foi a peste chamada de “negra” também conhecida como peste bubônica e, a morte era dolorosa e terrível, apesar de rápida, pois levava cerca de dois a cinco dias após a infecção.


A peste manifestava-se de duas maneiras:

a) peste bubônica: contraída pelo contato com as pulgas ou ratos infectados, caracterizava-se por gânglios que acumulavam sangue negro, principalmente nas axilas;

b) peste pneumônica: era contraída pelas vias respiratórias a partir do contato com outra pessoa infectada.


O último registro da doença na Europa havia sido no século VI, mas ela sempre esteve presente na Ásia Central e na África. A peste retornou para a Europa a partir de 1348 e, foi trazida por navios genoveses para vários portos do continente europeu. A colônia genovesa de Caffa, localizada na Crimeia, foi cercada pelos tártaros, que utilizaram os cadáveres infectados como arma. Os cadáveres eram lançados por cima das muralhas para dentro da cidade, o que fez com que a doença se disseminasse.


O historiador Jacques Le Goff afirma que “os homens e as mulheres contaminados pelo bacilo eram derrubados depois de uma curta incubação por um acesso que, depois de vinte e quatro a trinta e seis horas, levava na maioria das vezes à morte”. Outro historiador Hilário Franco Júnior também aponta que os grupos mais atacados pela doença eram coveiros, médicos e padres pelo contato constante que tinham com os infectados.


A obra intitulada "A Peste" de autoria de Albert Camus, cuja sinopse, in litteris: "Na manhã de um dia 16 de abril dos anos de 1940, o doutor Bernard Rieux sai do seu consultório e tropeça num rato morto. Este é o primeiro sinal de uma epidemia de peste que em breve toma conta de toda a cidade de Orão, na Argélia. Sujeita a quarentena, esta torna-se um território irrespirável e os seus habitantes são conduzidos até estados de sofrimento, de loucura, mas também de compaixão de proporções desmedidas".


Uma história arrebatadora sobre o horror, a sobrevivência e a resiliência do ser humano, “A Peste” é uma parábola de ressonância intemporal, um romance magistralmente construído, que, publicado originalmente em 1947, consagrou em definitivo Albert Camus como um dos autores fundamentais da literatura moderna.



Enfim, a história da peste integra a evolução dos conceitos de doença ao longo do tempo. Com a pandemia de Covid-19 houve uma vantagem pois o vírus foi logo identificado e, foi possível não só desenvolver vacinas bem como medidas de contenção, como o uso da máscara facial e quarentena. Mesmo depois dos enormes danos causados pela peste negra que ocorreu na Europa entre 1347 a 1353, os sobreviventes se dedicaram à árdua tarefa de reconstrução. De certo modo, a peste negra foi a mãe do Renascimento que viera depois.


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