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sábado, 25 de maio de 2013

Sócrates no banco dos réus (ou as várias versões de Sócrates).

O passado jurídico sempre traz à baila a reflexão sobre as relações entre direito, história e filosofia. As narrativas sobre o julgamento de Sócrates é menos que realmente do que teria acontecido e, muitas vezes, o narrador sofreu influências não só do meio social em que viveu mas sobretudo do relativismo epistemológico.

 
Pois o leitor com os olhos de hoje ousa fazer a leitura do mundo antigo e não está livre de sua época conforme já advertiu Adam Schaff. A filosofia da história permite questionamentos e persegue o passado enquanto a ação se perdeu no tempo.

 
E o historiador envolto em seu estilo próprio transita por entre diversas interpretações, seguindo a narrativa os caminhos da imaginação.

 
Entender o outro, a alteridade e a objetividade dos fatos que são desafios até hoje enfrentados. Percebemos que o tempo presenta inventa o passado, justificando-se. E na miragem helênica identificamos contradições no julgamento de Sócrates (que antes de ser condenado pelos homens de seu tempo, fora condenado pela sua própria crença em sua consciência).

 
Ao enfocar a biografia de Sócrates mergulhamos em contradições. Como homem, Sócrates fora reverenciado como um não conformista e que se rebelara contra a sociedade aberta, sendo admirador de sociedades fechadas. Como ateniense[1] desprezava a democracia e elogiava Esparta.

 
Sócrates fora filho do escultor Sofroniscos e da parteira Fenereta, era cidadão diligente, combateu na guerra, tendo salvado a vida Alcibíades. Casou-se com Xantipa[2] a quem se apontava uma reputação de rabugenta e mal humorada e, por contra, das intempéries da esposa, passava muitas horas na rua. Proseava, perguntava e desconcertava.

 
O método dialético[3] de Sócrates era a maiêutica ou “parto de ideias” onde o interlocutor descobre a verdade, parindo o conhecimento. Uma das características pessoais era o fato de ser irreverente tendo suscitado ódios e invejas que culminaram na acusação de impiedade.

 
A morte de Sócrates por ter sido condenado a ingerir cicuta[4] é um traço definidor na história da filosofia, provocando inúmeras reações eloquentes.

 
Sócrates vivia descalço e sem camisa, destituído de bens e de categoria social, retratando um professor inconformado cujo principal problema resumia-se em delimitar o próprio objeto ensinado.

 
A própria didática da maiêutica[5] nos remete não só ao autoconhecimento mas sobretudo a construção da aprendizagem instigada por perguntas e respostas sucessivas.

 
Del Vecchio aduziu: “Discutia Sócrates de modo peculiar, multiplicando as perguntas e a elas dando respostas de maravilhosa e contundente simplicidade. Ao contrário dos sofistas, que tudo afirmavam saber, declarava ele nada saber. Molestava-os com a sua ironia, e confundia-os, interrogando-os (ironia-pergunta, interrogação) sobre questões aparentemente simples, mas no fundo, muito difíceis. Deste modo, constrangia-os, indiretamente, a darem-lhe razão.” (DEL VECCHIO, Giorgio, in Lições de Filosofia do Direito).

 
Sócrates fora acusado[6] por Meleto, Aniton e Lícon de não reconhecer os deuses da cidade, e introduzir novas divindades e de corromper a juventude. Ação intentada contra Sócrates era um graphai, asebeias, ação de impiedade.

 
Qualquer manifestação de dúvida ou indiferença a respeito da religião da cidade era considerada atentado à unidade da comunidade sendo passível de uma ação pública.

 
Incumbiu-se Sócrates da própria defesa[7], e finda esta Anito e Lícon se apresentaram para ajudar Meleto cujos argumentos, Sócrates refutou. O quorum do tribunal que julgou Sócrates foi em quinhentos e um juízes, onde duzentos e oitenta votaram pela condenação enquanto somente duzentos e vinte e um votaram pela absolvição.

 
Mas existem pelo menos três versões de Sócrates, se é que existiu um Sócrates histórico. A versão de Aristófanes, a de Xenofonte e a de Platão.

 
Para Aristófanes, Sócrates era uma pessoa cômica, um pensador distante da realidade. Sendo amante da vida que enfrentou com temperança, pagou Sócrates com a vida o preço de sua fama. E, pela eternidade prosseguiu a glória embora maculada por Aristófanes que bem o retratou, em sua pela “As nuvens”.

 
O comediante também criticou os sofistas, tomando Sócrates por um deles. E suscitou uma questão ainda recorrente: tem o orador o dever dizer a verdade?
 

Aristófanes[8] zombou de Sócrates quando narrou: “Quando Sócrates observava a lua para estudar o curso e as evoluções dela, no momento em que ele olhava de boca aberta para o céu, do alto do teto uma lagartixa noturna, dessas pintadas, defecou na boca dele.” (In Aristófanes, As nuvens).

 
Em outra narrativa, Sócrates é visto pendurado numa cesta, observando os ares e contemplando o sol. E justificara estar pendurado pela necessidade de elevar seu espírito e elevar seu pensamento sutil com o ar igualmente sutil. “Se eu tivesse ficado na terra para observar de baixo as regiões superiores, jamais teria descoberto coisa alguma, pois a terra atrai inevitavelmente para si mesma a seiva do pensamento. É exatamente isso que acontece com o agrião.” (Aristófanes, As nuvens).

 
Tais diálogos denunciam Sócrates como pedante e alienado e ainda narra sobre um incêndio na cada do filósofo (ocasião em resmungara: “Ai! Infeliz de mim. Ou morrer miseravelmente assado”).
 
Metaforicamente o fogo na residência socrática sugere a miséria da filosofia e que deve ser queimada. O pensamento socrático incomoda e provoca. Conclui assim Aristófanes que o pensador é perigoso para a cidade.

 
A versão de Sócrates criada por Xenofonte o concebeu de forma mais simpática, tendo defendido seu mestre que sempre viveu à luz pública, relatou que de manhã saía a passeio e aos ginásios (...) mostrava-se na ágora à hora em que regurgitava de gente e passava o resto do dia nos locais de maior concorrência, o mais das vezes falava, podendo ouvi-lo quem quisesse. “Viram-no algum “ver-fazer” ou dizer algo contrário à moral, ou à religião.” (in Xenofonte, Memoráveis).

 
Xenofonte não poupou em defender Sócrates revelando-se estar admirado que os atenienses tivessem acreditado nas acusações contra Sócrates, justamente por nada ter praticado de ímpio e por ter adotado discurso e ser, reputado como o mais pio dos humanos.

 
A inocência de Sócrates é verdadeiramente o axioma[9] de Xenofonte. Axiomar um sistema é mostrar que suas inferências podem ser derivadas a partir de um pequeno, mas bem definido conjunto de sentenças. Na engenharia os axiomas são aceitos sem provas formais e suas escolhas são negociadas a partir do ponto de vista utilitário e econômico.

 
Passagem interessante narrada por Sócrates: “Quando seus amigos iam cear em sua casa e uns levavam pouco, outros muito, Sócrates mandava o criado pôr em comum num prato menor ou reparti-lo fraternalmente entre os convivas. Os que levavam mais teriam vergonha de não servir-se do que era posto em comum e em comum pôr também o próprio prato, sendo assim, constrangidos a fazê-lo”.

 
Segundo Xenofonte, o filósofo Sócrates[10] era compreendido por todos, o que configura antinomia com a descrição feita por Aristófanes para quem era incompreendido e afetado. As referências de Xenofonte invocam o sábio calmo, conduzindo seus interlocutores à compreensão da existência humana, calibrada pelo belo, justo e útil.

 
Procurava Sócrates em incutir nos discípulos as ideias sábias concernentes aos deuses. Esforçou-se muito Xenofonte pela defesa de Sócrates mostrando-o como temente aos deuses, patriota e amigo da juventude. Os textos de Xenofonte vislumbram a realização da justiça nos atos e palavras do filósofo e mestre que fora injustiçado pelas opiniões e pelos olhares de ciúme, cobiça e emulação. Em verdade, o que foi letal à vida de Sócrates não fora a ingestão de veneno e, sim, a inveja[11].

 
A maiêutica socrática funcionava a partir de dois momentos essenciais: um primeiro em que Sócrates levava os seus interlocutores a pôr em causa as suas concepções e teorias sobre um assunto; e um segundo momento em que conduzia os interlocutores a uma perspectiva sobre o tema.

 
Daí ser a maiêutica um autêntico parto de ideias. Sócrates procurou dar maior ênfase à procura do que se não sabe, do que transmitir o que julga saber, privilegiado a instigação permanente.

 
Nos diálogos de Platão há o relato que Sócrates tinha recebido ao exército em várias batalhas e, Estrabão contou que, após uma derrota ateniense em que Sócrates e Xenofonte haviam perdido seus cavalos.

 
Sócrates encontrou Xenofonte caído no chão, e carregou-o por vários estágios até que a batalha terminou. (Estrabão, Geografia, Livro IX, Capítulos 2 e 7).

 
Os paradoxos socráticos são posições éticas defendidas que vão contra (para) a opinião (doxia) comum. Os principais paradoxos são: 1) a virtude é conhecimento; 2) Ninguém faz o mal voluntariamente; 3)As virtudes constituem uma unidade; 4) É preferível sofrer uma injustiça a cometê-la. (Górgias) ou jamais se deve responder a injustiça pela injustiça, nem fazer mal a outrem, nem mesmo àquele que nos fez mal (Críton).


A respeito do segundo paradoxo acima citado confirmava Sócrates por atribuir o mal à ignorância, pois a sabedoria e a virtude são inseparáveis.

 
Sócrates fora notório cumpridor das leis, tendo sido o primeiro dos positivistas. No entanto, observou Xenofonte[12] que o filósofo deixou de acatar as ordens dos trinta tiranos, então como foram conhecidos os governantes de Atenas.

 
É que no juízo de Sócrates, o pai da maiêutica, tais ordens eram declaradamente ilegais. Continha um íntimo juízo de controle de legalidade (eram ordens avessas às leis, desta forma, quando lhe proibiram o palestrar com os jovens e, o encarregavam juntamente com outros cidadãos, de conduzir um homem que intentavam assassinar, só ele se recusou de obedecer, porque tais ordens eram ilegais).

 
Insistiu Xenofonte a apontar que Sócrates induziu à prática do bem. Tinha sempre presente no espírito os caminhos que conduzem à virtude e não se cansava de lembrá-los aos que frequentavam suas aulas peripatéticas.

 
Ao final, Xenofonte convoca aos leitores a compararem a grandeza do mestre em face de outros homens. Também redigiu apologia de Sócrates, tal qual Platão. Xenofonte captou realisticamente a adversidade de ânimos.
 
Os últimos dias de Sócrates foram narrados por Platão em quatro diálogos: Apologia, Fédon[13], Críton e Eutífero. A apologia de Sócrates o reputou caluniado. A defesa fora apresentada em estrita obediência à lei.

 
Demonstrou Sócrates plena consciência de sua missão e, confirmado pelo oráculo de Delfos como o mais sábio dos homens e, confessadamente admitia que sua sabedoria residisse na consciência de que nada sabia. Apesar de ter provocado inimizades acirradas e malignas o que gerou as principais calúnias que bem nutriram a ação de impiedade.
 
Sócrates segundo Platão (o pai da academia) apontou o seu destemor para com a morte que o aguardava: “Com efeito, temer a morte é o mesmo que supor-se sábio quem não o é, porque é supor que sabe o que não sabe. Ninguém sabe o que é morte, nem se, por ventura, será para o homem o maior dos bens; todos a temem como se coubessem ser ela o maior dos males. A ignorância mais condenável não é essa de supor saber o que não sabe”.

 
Xenofonte e Platão astutamente comprovaram que os atenienses seriam os maiores perdedores da condenação de Sócrates. Atenas se envenenou exibindo-se como intolerante, despótica e hábil na censura para qual a tradição ocidental insiste em fazer ouvidos moucos.

 
A historiografia do pensamento jurídico efetivou apressada apreensão do legado ático, escondendo deficiências estruturais e ampliando os modelos de otimização conjuntural. A construção da democracia ateniense é mais mítica do que fática e, Sócrates em seus derradeiros momentos, já envenenado preconizou que os derrotados com sua condenação.
 
Também apelou em sua defesa, para o legado deixado posto que o filósofo julgava-se vítima da incorreta aplicação das leis. Ao se defender, Sócrates apontou que o juiz não jurou favorecer a quem bem lhe pareça, mas deve julgar segundo as leis.

 
A defesa de Sócrates transcende como intransigente apologia da legalidade, cuja concepção tripartida seria preconizada vinte séculos depois na obra de Montesquieu. Em sua defesa, Sócrates sugeriu multa que o beneficiaria. Porém, a dura sentença condenatória se concretizou e ganhou a posteridade.

 
Platão nos narra as derradeiras mensagens do mestre: “Bem, é chegada a gira de partirmos, eu para a morte, vós para a vida. Quem segue melhor rumo, se eu, se vós, é segredo para todos, menos para a divindade.”
 

No diálogo intitulado Fédon[14], narrou Platão o sofrimento e agonia dos amigos de Sócrates ao presenciarem a ingestão de cicuta (“As lágrimas me jorraram em ondas”). Lembrou Sócrates que devia Asclépio um galo.
 

E, por fim, o mestre nos deixou a sua derradeira lição: “A morte libera-nos das dores e permite-nos o repouso eterno”, assim persistiu em seu legado.[15] A questão socrática não se esgota em sua historicidade; Ainda não se pacificou a questão de fundo do discurso de Homero: se a guerra de Tróia acontecera realmente.

 
Segundo o poeta Homero a guerra foi causada pelo rapto da princesa Helena de Troia (esposa do lendário rei Menelau), por Páris (filho de Príamo). Isso ocorreu quando o príncipe troiano foi a Esparta, em missão diplomática, e acabou apaixonando-se por Helena. Páris havia recebido de Afrodite a recompensa de ter a mulher mais bonita do mundo, que era Helena. O rapto deixou Menelau enfurecido, fazendo com que este organizasse um poderoso exército. O general Agamenon foi designado para comandar o ataque aos troianos. Através do mar Egeu, mais de mil navios foram enviados para Troia.

 
O épico “Ilíada” escrito por Homero descreve uma das mais famosas guerras da Antiguidade. Além do relato militar, o conflito chama a atenção pelas motivações do mesmo, as atitudes tomadas por seus mais importantes personagens e a sua incrível reviravolta. Por conta de sua rica e detalhista narrativa, muitos historiados duvidam de sua veracidade. Assim toda essa dúvida seria capaz de desmoronar a paixão de Páris, o rapto de Helena, o feito dos heróis participantes e a engenhosa construção do cavalo que determinou o fim do combate.

 
O arqueólogo Henrich Schilemann estudando vários textos de Homero para definir a possível localização de Troia. Realizaram escavações no monte Hissarlik, próximo ao famoso Estreito do Dardanelos, acabou descobrindo uma série de vasos, jarras e apetrechos em ouro e prata. Observando esse material, conclui que os artefatos faziam parte do Tesouro de Príamo, antigo rei troiano e pai de Páris. O que reforçou significativamente a sustentação da existência de Troia. As novas pesquisas revelaram a existência de noves Troias, sendo que as cinco primeiras construídas no início da Idade de Bronze.

 
Atualmente vários estudiosos acreditam que Troia funcionava como entreposto comercial que realizava a interligação entre as cidades gregas encontradas nos mares Negro e Egeu. Obviamente, estes deduziram que a dependência dos gregos em relação aos troianos fosse motivo para a ocorrência de pequenas divergências que desgastavam a relação política e comercial entre tais povos. Com isso, os gregos talvez realizassem essa invasão quando os troianos estivessem fragilizados por alguma contenda ou desastre natural que poderia ter instigado o desenvolvimento da guerra.

 
É verdade que a leitura do modelo conceitual e o fundamento da ideologia podem propiciar errônea apreensão dos fatos, podendo ser manipulados por inferências presentes.
 

Isidor Stone um polêmico jornalista norte-americano, afirmara que Sócrates fora inimigo da democracia pregava uma sociedade fechada, sob o molde espartano, e que a democracia ateniense o censurou e produziu uma caça às bruxas.
 

Sócrates de Xenofonte propõe reis dentro dos limites das leis enquanto que Sócrates de Platão não admitia nenhuma limitação ao rei-filósofo. Isidor Stone insiste na admiração de Sócrates por Esparta, na fixação da andreia (coragem) como virtude (areté). E, o jornalista observa que os acusadores de Sócrates e sua condenação comprovam conforme Stone que na Atenas não havia liberdade de expressão (e pasmem que teria sido a época áurea da democracia).

 
Platão ainda comenta que Sócrates ainda conversara com a mulher, Xantipa e o filho, antes do fim. E, seu fim, nos sugere sucessão de imagens e, ao proclamar defesa, a apologia pro vita sua, consubstancia reputação para a eternidade.

 
Críton, um de seus discípulos, sugeriu fuga já organizada, mas fora recusada por Sócrates. Patriota, Sócrates nunca deixara a cidade; e protestou por cumprir as leis, sem discuti-las, preconizando um positivismo e fetichismo legal dos séculos vindouros.

 
Mas um fato é inegável que Sócrates fizera muitos inimigos, e o contexto do fim da Guerra do Peloponeso, o império ateniense estava em ruínas, ensejando facções e problemas internos.

 
A crise dos velhos princípios gregos exigia um bode expiatório[16]. Embora dedicado ao Estado, à vida da pólis, as suspeitas caíam sobre Sócrates (que representava nova era espiritual) apesar da acusação de ateísmo, de corrupção da juventude.


Sócrates sacudiria a cidade da letargia e sua maiêutica retirada a pólis do sono dogmático, precisando o relativismo das crenças e das verdades. À luz do literal normativismo, os acusadores tinham razão. E com a morte de Sócrates, amigos e seguidores se dissiparam. Platão percorreu a Grécia, Egito, Itália só voltando quarenta anos depois para inaugurar sua academia.

 
As lágrimas, suspiros e a tristeza dos amigos e alunos de Sócrates compunham a trilha sonora da democracia ateniense que era doente, decadente e perversa.

 
A morte de Sócrates acenou que a democracia ateniense se não admitia críticas e, portanto, não era propriamente uma democracia. O que nos remete a tortuosa dúvida: podemos tolerar quem prega a destruição dos intolerantes? Matar um intolerante significa eliminar a intolerância?[17]
 

A versão de Sócrates oferecida por Platão não era democrata, tendo sido alvo eliminado pela democracia ateniense, portanto, o Sócrates histórico era mal visto e temido pelos poderosos e com sua execução se confirmou que não toleravam a liberdade de expressão.
 

A exemplo de Sócrates verificamos um tom pedagógico na obra de Platão, que é uma paideia que se revela em ser breve síntese que nos comunica a justiça, uma verdadeira descoberta do domínio da Ética. Desta forma em franca oposição à tese sofista de Trasímaco que defendeu a justiça como poder do mais forte. Platão não busca o eficaz, o útil, o convincente, mas apenas o verdadeiro.

 
O Direito e a justiça conforme Platão aprendeu com Sócrates efetivamente estão a serviço do homem e do bem comum. E, possui sentido transcendente, um valor perene que nossa alma deseja e que, por ter vindo do céu, jamais poderá esquecido.

 
De qualquer maneira, a morte de Sócrates, por envenenamento perfaz um traço recorrente na tradição ocidental confirmando que o pensamento crítico irrita, agride, gera desconfianças e, assim precisa ser extirpado e anulado. Desta forma, Sócrates se revela mártir e sua morte não representa o fim de qualquer simpatia ao legado ático. Confirmou que a democracia possui limitações e restrições sérias, assim como seu julgamento permite a desconfiança das desejáveis relações entre direito[18], história e verdade.

 
Embora, em geral, Sócrates se opusesse aos sofistas, mas num ponto é coincidente com Górgias o Protágoras posto que entendessem que a filosofia deveria se ocupar especialmente do homem. Toda a filosofia socrática efetivamente fora plenamente caracterizada pela certeza de que o homem é capaz de atingir a verdade. E, tal verdade não é de natureza física, mas sim de ordem metafísica (tais como a ideia do bem, as virtudes e os valores em geral).

 
Segundo a filosofia socrática, apesar das divergências sobre a moral, política e os costumes existem verdades universais à disposição daqueles que sincera e humildemente se dispuserem à descobri-las.
 
A humildade é o básico pressuposto para o acesso à verdade e o método correspondeu ao diálogo vivo. Sócrates respondia que o homem é a sua alma (sede da atividade racional, ética e do conhecimento) e, para acessá-la, usava o método da introspecção estimulada composto de três momentos: a ironia ou fase destrutiva (pars destruens).

 
Sócrates assumia o ataque induzindo o interlocutor à contradição. A humildade em reconhecer a própria ignorância era considerada como indispensável para se rumar em direção da verdade (e afirmava veemente: “só sei que nada sei”).

 
O segundo momento era a maiêutica (do grego maieúo, ou seja, partejar), pois uma vez removidos os obstáculos pela ironia, o interlocutor era auxiliado a descobrir as verdades que jazem na sua alma.
 

O diálogo socrático[19] não ensinava verdades prontas e, sim trazer a lume as concepções latentes no espírito humano e, que são inatas, daí ser o defensor do direito natural e da universalidade de certas verdades.
 

Enfim, revelava a maiêutica ser a arte de partejar os espíritos através dos diálogos induzidos pelo mestre ao discípulo. O derradeiro momento é o conceito que é quando a verdade emana na alma do sujeito. Conhecer é recordar daí afirmar: “conhece-te a ti mesmo” (e recorda-te das verdades que possuis).
 
Entendia a alma como princípio da racionalidade e fonte da moralidade e propunha a desvendar as relações com o corpo e a natureza (que na opinião era eminentemente espiritual, daí sua imortalidade).

 
Afinal é o pensamento socrático que mais marcou o nascimento da filosofia clássica tão bem desenvolvida por Platão e Aristóteles. O julgamento e morte de Sócrates marcaram seus discípulos, amigos e seguidores que provieram relatos, testemunhos sobre o episódio, onde o filósofo confronta o Estado.

 
A motivação das acusações a Sócrates foi marcadamente política, pois as críticas socráticas apontavam para o desvirtuamento da democracia ateniense. É verdade que a interpretação do legado de Sócrates até hoje encontra dificuldades, pois em vida nada escreveu[20] (bem como Jesus Cristo) e valorizava, sobretudo, o debate e o ensinamento oral.
 

Por outro lado, nos permitiu extenso conhecimento das teses socráticas, o registro de Platão[21] seu principal discípulo. Embora isso nos forneça a própria visão platônica dos ensinamentos de Sócrates. As outras duas fontes sobre a biografia de Sócrates é Xenofonte (que não fora propriamente discípulo) mas um companheiro de Sócrates ( quem o salvara da guerra).

 
Aristófanes, no entanto, traçou um perfil de Sócrates bem distinto de Platão[22] e Xenofonte, o mestre então fora satirizado e encarado como amoral, interesseiro e andrajoso. Aristófanes o enfocou apenas como o intelectual e constantemente ridicularizado em suas comédias.

 
A crítica de Sócrates aos sofistas consiste em manobra que o ensinamento dos sofistas limita-se a mera técnica ou habilidade argumentativa que visa convencer o que oponente diz, mas não leva ao verdadeiro conhecimento.
 
A consequência disso era que, devido à forte influência dos sofistas nas decisões da Assembleia que eram baseadas nas mais hábeis retóricas e dirigiam apenas à verdade consensual resultante da persuasão.

 
Enfim, quem valorizou a descoberta do homem pelo homem feita pelos sofistas, orientando-a para os valores universais, seguindo a real via de pensamento grego foi Sócrates.

 
Quanto à política fora valoroso soldado e rígido magistrado. Sócrates foi o fundador da ciência geral mediante a doutrina do conceito, sendo em particular também o fundador da moral que afirmava que a eticidade significava racionalidade.

 
Convém frisar que Sócrates apesar de sua enorme grandeza intelectual não elaborou um sistema filosófico acabado, apenas descobriu o método que fundou uma grande escola.

 
Na narrativa de Sócrates restou registrado o que seria o último discurso de Sócrates, in litteris: “Não foi por falta de discursos que fui condenado mas por falta de audácia e porque não quis que ouvísseis o que para vós teria sido agradável”.

 
(...) Sustentou, no entanto, uma certeza: “mais difícil que evitar a morte, é evitar o mal, porque este corre mais depressa que a morte. Quando a esta, apenas pode ser uma destas duas coisas

 
Ou aquele que morre é reduzido ao nada e não tem mais qualquer consciência, ou então, conforme ao que se diz: “a morte é uma mudança, uma transmigração da alma do lugar onde nos encontramos para outro lugar.”
 
A vida de um grande homem, principalmente quando pertenceu a uma época remota conforme. E, Taylor advertiu que jamais pode ser o mero registro de fatos indiscutíveis e a verdadeira tarefa do biógrafo consiste em interpretá-los, deve ir além dos eventos e mergulhar nos caracteres que estes revelam, utilizando-se a imaginação construtiva.

 
Duas figuras históricas passaram por bárbaros julgamentos e cruéis condenações foram Jesus e Sócrates. O primeiro padeceu sob Pôncio Pilatos, enquanto Sócrates padeceu sob a democracia ateniense, no ano de Laques (399 a.C.). Ambos nada escreveram e suas atividades e pensamentos vieram através de seus discípulos e seguidores que podem ter retratado seus mestres pela ótica da admiração e do afeto.

 
É fato que existem discrepâncias nos relatos e ora este aparecer caricaturado nas peças teatrais de Aristófanes, ora é visto como admiração e idolatraria por Platão que rebate o retrato pintado por Aristófanes, um mero poeta cômico.

 
Fato é que Sócrates noticiado por textos antigos nos aparece com rosto diversamente refletido por diferentes espelhos. O que nos intriga até hoje questionar: Onde estará a verdadeira face de Sócrates?

 
O mestre Sócrates viveu na Atenas na época de Péricles que não foi marcada pelo desenvolvimento da prosa literária. Fora marcada pela criação de grandes obras teatrais, particularmente tragédias.
 
Platão o tornaria a principal figura de seus diálogos enquanto que Xenofonte o exaltava em suas Memoráveis. Ésquines nas diversas obras que se perderam, cogitou do mestre de que fora amigo constante. Mas, todos estes o descreveram com mais de quarenta e cinco anos e preocupado em despertar o homem para o conhecimento de si mesmo.
 

Sócrates reagiu contra o relativismo sofístico e, tudo indica que fora alicerçado em pressupostos religiosos órfico-pitagóricos[23] que apenas concebe a sucessão de impressões sensíveis e fugazes e intransmissíveis, ou a criação de sinais convencionais que constituiriam a linguagem. Se as palavras tecem um terreno instável e uma opinião relativa e insegura, é porque, segundo ele, não estariam acompanhadas da consciência de seu significado.
 

Na verdade, Sócrates criou nova concepção de alma (psique) que passou a predominar na tradição ocidental. A importância de Sócrates para o Direito reside principalmente na sua justificação racional do nomos (lei) diferenciando-se dos sofistas quanto ao método.

 
A verdade socrática não se impõe externamente, mas brota de dentro através do diálogo e sua fé na virtude era extremada que compôs o intelectualismo ético, rigoroso (o que definiu a moral como o conhecimento do bem).
 

No que tange à filosofia política e a filosofia jurídica, Sócrates supera o relativismo e individualismo dos sofistas. E, se opunha a ideia de que o direito e a justiça sejam a expressão dos mais fortes. E, ainda acrescentou que era melhor sofrer uma injustiça do que a cometer. Mas se a cometeu, deverá expiá-la, aceitando a sanção.

 
A ética socrática visava o aperfeiçoamento do homem, sendo a missão da filosofia exatamente encontrar a perfeição na vida e na morte. E, defendeu a cidade e suas leis como necessárias e por atenderem às exigências da natureza humana.


Por essa razão, Sócrates placidamente submeteu-se à condenação e a morte por envenenamento ainda que tenha reconhecido a injustiça da qual fora vítima.
 
Para Flamarion Tavares Leite não se trata de concepção positivista que separa direito e justiça e ainda a distingue. Mas o fato de a noção de justiça bem como as demais virtudes incorporarem a sabedoria.
 

De fato, a justiça para Sócrates consiste no conhecimento e, portanto, na observância das verdadeiras leis que regem as relações entre os homens, seja pelas leis da cidade como das leis não escritas (fundadas na vontade reta da divindade e que se refletem na consciência).

 

Para a filosofia do direito a contribuição socrática é a convicção de que a obediência às leis tem fundamento do homem e não é arbitrário. Assim, Sócrates concebeu a verdade e o bem como algo idêntico e universal, abrindo caminho para a teoria dos conceitos[24] e para a metafísica[25] cuja grande síntese é fartamente encontrada na obra de Platão.
 
Assim como o julgamento de Sócrates que o colocou no banco dos réus, quem historicamente e realmente recebeu a fatal condenação fora a democracia ateniense. Assim como no escandaloso julgamento do “Mensalão”, onde quem fora julgado e condenado fora a democracia brasileira. Mas, a seriedade do Judiciário não só condenou com respeito ao devido processo legal como também expôs os culpados à devida execração pública.

 
Referências

MONDOLFO, Rodolfo. Sócrates. Trad. Lycurgo Gomes da Motta. 2.ed. São Paulo: Editora Mestre Jou.,1967.
Coleção Os Pensadores. História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental. 1.ed.,Platão, São Paulo: Abril Cultural, Editor: Victor Civita. 1973.
LEITE, Flamarion Tavares. Manual de Filosofia Geral e Jurídica. São Paulo: Editora Forense, Grupo GEN, 2011.
GODOY, Arnaldo Moraes. O Julgamento de Sócrates. Revista Sequência, n. 46, p.11-27. Julho de 2003.
DURANT, Will. História da Filosofia. A Vida e as Idéias dos Grandes Filósofos. São Paulo: Editora Nacional, 1.ed., 1926.
PADOVANI, Umberto e CASTAGNOLA, Luís. História da Filosofia. São Paulo: Edições Melhoramentos. 10a. ed. 1974.
JAEGER, Werner. Paideia - A Formação do Homem Grego. São Paulo: Martins Fontes. 3.ed., 1995.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. Tradução Alfredo Bosi. Maurice Cunio, Antonieta Scartabello, Carla Comi, Rodolfo Itari, Silvia Salvi. Tradução e revisão: Ivone Castilho Benedetti. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
DEL VECCHIO, Giorgio. Lições de Filosofia do Direito. Tradução de Antonio José Brandão. Revisão e prefácio de L. Cabral de Moncada. Atualizada por Anselmo de Castro. Coimbra: Armênio Amador, Editor, Suc, 1972.

[1] A Atenas contemporânea de Sócrates representava um importante centro de debates, sendo visitada por todos os grandes pensadores de então. Um desses grupos de pensadores itinerantes era os sofistas
(que negavam a realidade do mundo exterior, e tentavam arrancar a semelhança exterior dos casos, fora de sua conexão com os acontecimentos).
[2] Com quem teve três filhos. Podemos afirmar que Sócrates não teve certamente uma mulher ideal na quérula Xantipa. Mas igualmente ela não tece um marido ideal no filósofo, sempre tão ocupado com outros cuidados que não os domésticos. Xantipa ou Xântipe era a mulher de Sócrates e possivelmente mãe dos três filhos, Lamprocles, Sophroniscus e Menexenus. Seu nome significa cavalo loiro em grego. O pai Xântipe foi batizado com o nome de Lamprocles. Visto que era até mais bem estabelecido na aristocracia de Atenas do que o pai de Sócrates, o nome teria sido preferido na escolha para seu filho primogênito. Sócrates teve duas esposas, a primeira foi Xântipe ou Xantipa e a segunda fora Myrto.
[3] A dialética de Sócrates está ligada à descoberta da essência do homem como alma (psyché) e tendo o modo consciente a despojar a alma da ilusão do saber. Como sistema de ensino usava o diálogo em sintonia com a razão para conduzir o interlocutor ao encontro de sua alma, fundamentalmente de natureza ética e educativa.
[4] Cicuta é também chamada de abioto em Portugal. É um gênero de plantas apiáceas compreende quatro tipos muito venenosos, nativas das regiões temperadas do Hemisfério norte. Sua alta toxicidade se deve pela presença da substância cicutoxina. Além do seu uso para a ponta de flechas, este ficou conhecido como veneno de Sócrates, pois fora condenado ao um processo de autoenvenenamento por ter sido acusado de ateísmo e de corromper a juventude ateniense.
[5] Maiêutica é dar a luz intelectual, é um parto intelectual, da procura da verdade no interior do ser humano. Sócrates conduzia este parto em dois momentos. Primeiro, a duvidar de seu próprio conhecimento a respeito de certo assunto; no segundo, Sócrates os levava a conceber, de si mesmos, uma nova ideia, uma nova opinião sobre o assunto em questão. Por meio de questões simples, inseridas dentro de certo contexto, a maiêutica dá à luz ideias complexas. Portanto, a maiêutica baseia-se na a ideia de que o conhecimento é latente na mente de todo ser humano podendo ser encontrado pelas respostas a perguntas propostas de forma perspicaz. A auto-reflexão expressou-se no nosce te ipsum - conhece-te a ti mesmo. Coloca o homem na procura das verdades universais que são o caminho para a prática do bem e da virtude. Seu nome fora inspirado na profissão da mãe de Sócrates, que era parteira. E, o mestre esclareceu tal origem no famoso diálogo Teeteto. Vige certa divergência historiográfica sobre a utilização de tal método por Sócrates. Historiadores afirmam que a denominação e a associação de tal método decorrem da narração, não sendo mesmo fiel à vida de Sócrates narrada por Platão. Portanto, deveria chamar-se de instrumentação argumentativa de Sócrates.
[6] A acusação disse: "Sócrates comete crime, investigando indiscretamente as coisas terrenas e as celestes, e tornando mais forte a razão mais débil, e ensinando aos outros". Mas nada disso tem fundamento, pois não instruo e nem ganho dinheiro com isso. Talvez pudessem dizer de mim: "Enfim, Sócrates, o que é que você faz? De onde nasceram essas calúnias? Se suas ocupações não fossem tão diferentes das dos outros, não teria ganho tal fama e não teriam nascido acusações".
[7] Sócrates respondeu: - Acontece que Xenofonte, uma vez indo a Delfos, ousou interrogar o oráculo e perguntou-lhe se havia alguém mais sábio do que eu. Ora, a pitonisa respondeu que não havia ninguém mais sábio. Ao ouvir isso, pensei: "O que queria dizer o deus e qual é o sentido das suas palavras?”
Sei bem que não sou sábio, nem muito nem pouco. “E fiquei por muito tempo sem saber o verdadeiro sentido de suas palavras.” Então resolvi investigar a significação do seguinte modo: Fui a um daqueles detentores da sabedoria, com a intenção de refutar, por meio deles, o oráculo e, com tais provas, opor-lhe a minha resposta: "Este é mais sábio que eu, enquanto você disse que sou eu o mais sábio". Examinando esse homem - não importa o nome, mas era um dos políticos - e falando com ele, parecia ser um verdadeiro sábio para muitos e, principalmente, para si mesmo. Procurei demonstrar-lhe que ele parecia sábio sem o ser. Daí veio o ódio dele e de muitos dos presentes aqui contra mim. Então, pus-me a considerar comigo mesmo, que eu sou mais sábio do que esse homem, pois que, nenhum de nós sabe nada de belo e de bom, mas aquele homem acredita saber alguma coisa sem sabê-la, enquanto eu, como não sei nada, também estou certo de não saber.
[8] Aristófanes foi dramaturgo grego e é considerado o maior representante da Comédia Antiga. Sua biografia é pouco conhecida, e sua obra permite deduzir que teve requintada formação. Viveu o esplendor do Século de Péricles. Foi testemunha também do início do fim de Atenas. Vivenciou o início da Guerra de Peloponeso e que arruinou a hélade. Viu o papel nocivo dos demagogos na destruição econômica, militar e cultural de sua cidade-Estado. Teve dois filhos que também seguiram a carreira do pai. Escreveu quarenta peças, das quais apenas onze são conhecidas. Era conservador, e hostil às inovações sociais e políticas e aos deuses e homens responsáveis por estas. Seu alvo eram as personalidades influentes: políticos, poetas, filósofos e cientistas fossem velhos ou jovens, ricos ou pobres. Aristófanes não poupou em suas críticas nenhuma figura ilustre, nenhuma instituição e nem mesmo os deuses. Atacou, às vezes injuriosamente, as inovações artísticas, morais, políticas e sociais da Atenas de seu tempo, muito diferente da de Péricles. Preocupou-se, acima de tudo, em defender a paz e advertir a população, sobretudo a rural, dos abusos urbanos. Em "Lisístrata" ou "A Greve do Sexo" (411 a.C.), as mulheres fazem greve de sexo para forçar atenienses e espartanos a estabelecerem a paz. Em "As vespas" (422 a.C.), discute a importância da verdade e seus benefícios, revelando sua preocupação com a ética. Na peça "As nuvens" (423 a.C.), compara Sócrates aos sofistas, mestres da retórica, e acusa o filósofo grego de exercer uma influência nefasta sobre a sociedade. Na comédia "Os Acarnianos" ou "Acarnenses", representada no ano 425 a.C., ele ridiculariza os partidários da guerra com Esparta. Suas outras obras são Os cavaleiros (424 a.C.), A paz (421 a.C.), As aves (414 a.C.), As tesmoforiantes ou As mulheres que celebram as Tesmofórias (411 a.C.), As rãs (405 a.C.), As mulheres na assembleia ou Assembléia de mulheres (392 a.C.) e Pluto ou "Um Deus Chamado Dinheiro" (388 a.C.).
[9]Na lógica tradicional, axioma ou postulado é sentença ou proposição que não é provocada ou demonstrada e é considerada como óbvia ou como um consenso inicial necessário para a construção ou aceitação de uma teoria. É aceito como verdade e serve de ponto inicial para dedução e inferências de outras verdades. Em matemática, axioma é hipótese inicial da qual, outros enunciados são logicamente derivados. Não é uma verdade autoevidente, mas apenas expressão lógica formal em uma dedução visando obter resultados mais facilmente.
[10] Sócrates foi filósofo ateniense (469 a.C. – 399 a.C.) do período clássico da Grécia Antiga. Reconhecido como um dos fundadores da filosofia ocidental sendo até hoje figura enigmático e conhecido principalmente pelas narrativas de Platão e Xenofonte e pelas peças teatrais de Aristófanes. Defendem alguns que os diálogos de Platão seriam relato mais abrangente do filósofo e tem perdurado até os dias de hoje. O método socrático, ou seja, maiêutica é usado até hoje pela pedagogia, sendo utilizado para obter não responder específicas, mas compreensão clara e fundamental do tema discutido.
[11] Sócrates não aceitava pagamento, por isso tão pouco aceitou cargos públicos. Assim opôs-se aos sofistas, o conhecimento é possível e seu objeto primordial é a própria alma. Inspirou-se Sócrates no adágio do oráculo de Delfos: "conhece-te a ti mesmo", frase escrita no templo de Apolo.
[12] Xenofonte foi soldado, mercenário e discípulo de Sócrates. Era conhecido pelos seus escritos sobre a história do seu próprio tempo e pelos seus discursos de Sócrates. A maioria dos estudiosos situa seu nascimento em 430 a.C. ou um pouco depois. Era originário de família rica e influente em Atenas. Participou os embates finais da Guerra do Peloponeso incorporado nas fileiras da aristocrática cavalaria ateniense. Sua dissertação histórica foi “Anábase” onde analisou o caráter de um líder por um historiador. Tal tipo de análise tornou-se célebre até hoje como a “Teoria dos Grandes Homens”. Onde descrevera o caráter de Ciro, o Moço, dizendo que de todos os Persas que viveram depois de Ciro, o Grande, este era o mais que mais se parecia com um rei e o mais merecedor de um império. Xenofonte fora posteriormente exilado de Atenas, provavelmente pelo fato de ter lutado sob o comando do rei espartano Agesilau contra Atenas em Coroneia (ou por ter participado com Ciro). Seu filho Grilo comandou a cavalaria de Atenas. Diógenes Laércio disse que Xenofonte ficou conhecido como "musa da Ática" pela doçura de sua dicção.
[13] O julgamento de Sócrates foi relatado por seu discípulo, Platão, no livro Fédon, e apesar de ter sido realizado há mais de 2.400 anos, aborda essencialmente os fatos que o rodeiam, temas e questionamentos que até hoje procuramos compreender. O ponto de partida para tentar compreender tal julgamento está na defesa das acusações que foi feita pelo próprio Sócrates. Uma vez que não havia pessoa melhor para demonstrar a veracidade dos fatos, se não àquele que os praticou/vivenciou. Daí perceber a grandiosidade que esse julgamento tem não só para a história da Filosofia, como também para a história da humanidade. O saber, a missão e a morte.
[14] Fédon ou Fedão é obra filosófica de Platão que, através de diálogos, relatou os últimos ensinamentos de Sócrates, antes de tomar a cicuta a que fora condenado pelo Estado.
Na obra, Equécrates ao encontrar Fédon pergunta a este, quais foram as últimas palavras do mestre Sócrates e pede que os relate, com a maior exatidão possível. Assim fala sobre morte, a ideia, o destino da alma, entre outros assuntos. É um diálogo que não pertence à fase socrática de Platão, divisão usada por alguns filósofos. Assim, estaria apenas usando a imagem do mestre para divulgar seu próprio projeto filosófico.
Platão recebera influência forte da religião órfica, que acreditava na alma e na reencarnação. É seu primeiro postulado acerca da alma. A situação dramática é o encontro de Fédon de Élis, discípulo de Sócrates com o pitagórico Equécrates. E, assim narra não só o diálogo, mas a cena e as ações dos protagonistas. Ocorre na prisão onde Sócrates estava detido aguardando sua execução, em 399 a.C. O Fédon é o mais popular dos diálogos de Platão, o que mais lido, citado e comentado tem sido, e aquele cujo tema sofreu menos eclipses na inquietude, nos anelos e na estimativa das gerações.
[15] O admirável comportamento de Sócrates perante a morte foi expressão de plácida naturalidade e trouxe a mais bela lição moral que tem sido ouvida, quase sem interrupção, no decurso dos séculos. A mais impressionante atitude moral perante a morte foi de fato a lucidez com que o mestre discorreu até o último alento de vida, sem sofismas e nem subterfúgios.
[16] O bode expiatório era um animal que era apartado do rebanho e deixado só na natureza selvagem como parte das cerimônias hebraicas do Yom Kippur, o dia da expiação, a época do Templo de Jerusalém. Tal rito é descrito na Bíblia no livro do Levítico. No Torá, dois bodes eram levados, juntamente a um touro, ao lugar de sacrífico, como parte dos Korbanot do Templo de Jerusalém. No templo os sacerdotes sorteavam um dos bodes. Um era queimado em holocausto no altar de sacrífico com o touro. O segundo tornava-se o bode expiatório, pois o sacerdote punha suas mãos sobre a cabeça do animal e confessava os pecados do povo de Israel. Posteriormente, o bode era deixado ao relento na natureza selvagem, levando consigo os pecados de toda a gente, para ser reclamado pelo anjo caído Azazel. Na doutrina cristã, o bode expiatório no Levítico é interpretado como uma prefiguração simbólica do autossacrifício de Jesus, que chama a si os pecados da humanidade, tendo sido expulso da cidade por ordem dos sacerdotes. Tipologicamente então o bode expiatório é a representação da figura do Messias, que fora enviado ao deserto para ser tentado pelo Diabo. Noutra visão de tom muito popular, o cristianismo compreende que os dois bodes são símbolos de Cristo e Satanás, vez que a expiação propriamente dita se realiza com a morte do primeiro bode e como não existe expiação sem derramamento de sangue, não há expiação pela morte do segundo bode, que é apenas levado ao deserto e morre à míngua. Este representa Satanás (ou Azazel, seu braço direito, um demônio do Deserto) que é enviado ao abismo de mil anos, onde refletirá sobre a obra maléfica que realizou contra os seres humanos.
[17] Falácia é argumento logicamente inconsistente, sem fundamento, inválido ou falho na tentativa de provar eficazmente o que se alega. Os argumentos que se destinam à persuasão podem parecer convincentes para grande parte do público apesar de conterem falácias, mas não deixam de ser falsos por causa disso. Como exemplo de falácia temos o argumentum ad misericordiam consiste em ganhar a simpatia do adversário apresentando-se como uma pessoa digna de pena.
[18] Platão em sua obra “As leis aparece maior respeito pelos direitos do indivíduo, desde que não seja escravo: servus et res sunt idem (não há diferença entre escravo e uma coisa) A família e a propriedade são preservadas, enquanto que em “A República” o Estado está acima destas. Mesmo assim, se necessário for, a família e a propriedade poderiam ser desfeitas ou destituídas. Por essa razão, em “As Leis”, Platão aconselhou a divisão dos indivíduos por classes e vigilância sobre as famílias. Em verdade Platão fora crítica implacável tanto da monarquia quanto da democracia e propôs o modelo de Esparta, onde ao lado de dois reis, havia o Senado e os Éforos, magistrados supremos nas cidades dóricas da Grécia Antiga.
[19] A dialética é a arte do diálogo, a arte de debater. Também é uma maneira de filosofar e seu conceito. E seu conceito fora debatido por diversos filósofos como Sócrates, Platão, Aristóteles, Hegel, Marx e outros. É o poder de argumentação, mas poderá ser utilizada a palavra em sentido pejorativo com um uso exagerado de sutilezas.
[20] Nada deixou escrito Sócrates e as notícias de seus ensinamentos e pensamentos deveu-se à Platão e Xenofonte que possuíam feições intelectuais diferentes. Xenofonte foi autor de Anábase, em seus Ditos Memoráveis e deu preferência ao aspecto prático e moral da doutrina, sendo um homem mais de ação.
[21] Platão foi grande filósofo para pintar o mais nítido retrato de Sócrates e cabe-lhe a glória de ter sido grande historiador do pensamento socrático, mas nem sempre é fácil discernir o fundo de Sócrates das especulações acrescentadas por Platão.
[22] As obras de Platão foram trinta e seis diálogos, treze cartas e uma coleção de definições. A única construção racional de Sócrates é a gnosiologia que se encontrava num método da ciência dialógica.
[23] Orfismo deriva de Orfeu filho de Apolo com a musa Calíope (segundo alguns) foi o fundador do orfismo. Orfeu era poeta e músico e a sua religião. Representava uma catarse musical capaz de hipnotizar multidões.
Dentre as lendas relativas a Orfeu, a mais célebre refere-se à sua união com ninfa Eurídice. Quando esta morreu, o músico desceu aos infernos para buscá-la e, emocionando as divindades infernais com o seu canto, obteve consentimento de trazê-la de volta. Tinha, entretanto, que respeitar uma condição: não poderia olhá-la antes de atingirem a luz. Mas, Orfeu, no retorno do mundo infernal, não mais podendo resistir, voltou-se para olhar sua amada, e, então imediatamente, uma força arrebatou-lhe Eurídice, sendo condenado a viver sozinho na Terra. O pitagoricismo foi a religião do filósofo e matemático Pitágoras. A base do pitagoricismo sendo os números, era mais ou menos semelhante ao que vamos mostrar na sua essência filosófica: constituía a unidade perfeita e era a origem de tudo ou a grande Mônada (Deus), era a fecundidade, era a perpetuação do homem.
[24] Sócrates mostrou no conceito o verdadeiro objeto da ciência. E, Platão aprofundou-lhe a teoria e procurou determinar a relação o conceito e a realidade fazendo deste o problema crucial de sua filosofia.
[25] O sistema metafísico de Platão centraliza-se e culmina no mundo divino das ideias e, estas se contrapõem a matéria obscura e incriada. O divino platônico é representado pelo mundo das ideias e especialmente pela ideia do bem que está no vértice. A existência desse mundo ideal seria provada pela necessidade de estabelecer uma base ontológica, um objeto adequado ao conhecimento conceitual.